Informa em "El País" Fernando Reinares, catedrático de Ciência Política e Estudos de Segurança na Universidade Rei Juan Carlos:
Uma operação da polícia belga, em 15 de janeiro de 2015, desbaratou um complô terrorista muito semelhante ao executado dez meses depois em Paris.
"No curso dessa operação foram abatidos, em seu refúgio de Verviers, dois terroristas e detido um terceiro. Outros 13 foram apreendidos depois na Bélgica, dois na França e mais um na Grécia."
Continua: "Formavam parte de uma rede, dotada de rifles Kalashnikov e explosivos –como os utilizados em Paris–, na qual havia jihadistas retornados da Síria e do Iraque, sob as ordens do Estado Islâmico e coordenado de Atenas por Abdelhamid Abaaoud, que seria morto em Saint-Denis".
A pergunta seguinte indispensável é óbvia: como foi possível aos serviços de segurança europeus perder a pista de Abaaoud, a ponto de permitir que ele repetisse a operação de janeiro, desta vez com trágico sucesso?
Christophe Ena/Associated Press | ||
Polícia trabalha em local onde terrorista Abdelhamid Abaaoud foi morto, em Saint-Denis |
A resposta igualmente óbvia é a que está sendo dada pela mídia e até por autoridades:
"Se Abaaoud pôde circular desde a Síria para vir à Europa e à França, há falhas em nosso sistema europeu", diz, por exemplo, o ministro francês de Exteriores, Laurent Fabius.
A resposta óbvia é, no entanto, incompleta. O que está falhando não é tanto o trabalho interno de cada aparato policial, mas a coordenação entre os diferentes serviços de segurança e informação.
Também em "El País", Farhad Khosrokhavar, investigador na Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais de Paris, diz, por exemplo, que não há uma verdadeira polícia europeia, quando o problema [terrorismo] é transnacional.
Reforça Angeliki Dimitriadi, pesquisadora do Conselho Europeu de Relações Exteriores, em artigo para o New York Times:
"O que a Europa necessita neste momento não é mais vigilância mas, principalmente, melhor cooperação e troca de informações entre os Estados-membros de forma a salvaguardar a União Europeia".
Que essa cooperação é no mínimo falha, demonstra-o o fato de que quem deu a pista para localizar Abaaoud em Saint-Denis foram "fontes de países estrangeiros, notadamente do Marrocos", informa o "Monde".
Que os serviços de inteligência precisam se "transnacionalizar" fica, por sua vez, evidente pelos dados disponíveis a respeito do verdadeiro exército de militantes estrangeiros a serviço do Estado Islâmico.
De acordo com um relatório das Nações Unidas, mais de 25 mil pessoas, de mais de 100 países, se deslocaram para território ocupado pelo EI.
Como a Interpol só monitora 5.800 desses combatentes, "claramente há uma significativa brecha entre o número de terroristas estrangeiros que identificamos e o número que se estima que alcançaram zonas de conflito", diz o secretário-geral da Interpol, general Jurgen Stock.
Poderia ter acrescentado que há, pela lógica, um bom número de Abaaouds esperando nas sombras para atacar.