segunda-feira, 30 de novembro de 2015

"Vamos passar vergonha em Paris", por Leão Serva

Folha de São Paulo


O Brasil passará vergonha na conferência sobre a tragédia climática que começa hoje em Paris, a COP-21, com na goleada de 7 a 1 na Copa, um ano atrás. O vexame vai começar quando o mundo vir com clareza que são falsos os discursos do governo brasileiro sobre o desmatamento da Amazônia.

Seguirá tomando bolas nas costas quando os negociadores observarem em detalhe que os planos oficiais brasileiros, como o acenado pela presidente Dilma Rousseff, na Assembleia Geral em Nova York, são castelos de cartas improvisados por burocratas de Brasília, como a ministra Izabella Teixeira, sem capacidade de realização: todo o resto da sociedade, dos fiscais federais aos governos de Estado e a opinião pública estão de braços cruzados enquanto os desmatadores trabalham livremente e a presidente concentra energias para evitar um impeachment.

Três dias antes da abertura da conferência, na última sexta-feira, porque não foi possível esconder como no ano passado, a ministra do Meio Ambiente apresentou o relatório sobre o desmatamento, que mostra que ele cresceu 16% entre julho de 2014 e 2015 sobre igual período de 2013/14 . Vale lembrar que nos dois períodos anteriores também houve crescimento (que então a presidente Dilma disse ser apenas um acidente de percurso, prometendo que a curva iria ser revertida. Só que não!).

No ano passado, o Planalto praticou uma "pedalada" (em verdade, um estelionato eleitoral), quando o órgão responsável pelo relatório, o Inpe, negou à opinião pública os dados por que havia uma campanha em curso (e o resultado era ruim para a presidente que tentava se reeleger). Os números só saíram por força de uma ação do Instituto Socioambiental (ISA). Publicados, foram apresentados como um pequeno soluço em meio a uma queda consistente.

Também errado: o conjunto dos levantamentos mostra alta consistente desde uma efêmera queda no período final do governo Lula. A redução continuou inercialmente mas tão logo Dilma Rousseff assumiu, a pressão predatória cresceu e a tendência passou a ascendente.

Além do agronegócio, que agora invade o Amazonas (o novo campeão no ritmo da destruição florestal), a outra grande força de pressão vem do plano de construir dezenas de hidrelétricas faraônicas (e outras tantas menores), projeto tocado pessoalmente por Dilma Rousseff quando ministra, que cria vetores de desmatamento e ocupação incorrigíveis.

Em 1957, o filósofo alemão Gunther Anders escreveu que o fascínio pelo progresso nos faz cegos para o apocalipse. No caso do Brasil, essa cegueira já está nos matando de falta de água, sob um tsunami de lama tóxica e logo vai asfixiar com a fumaça da floresta em chamas.

Talvez a única nota positiva seja a mudança de tom da imprensa, como aFolha, diante da tragédia de Minas Gerais, da iminência da reunião de Paris, das confissões sobre propina de empreiteiras em Belo Monte, e dos sinais de degradação ambiental decorrente das obras de hidrelétricas.

Infelizmente é tarde: a goleada já começou há tempos e Paris vai marcar apenas a constatação do vexame pelas outras nações.