O mau começo de ano na Bolsa de Valores, com um tombo de 7,51% em janeiro,
pode ter sido prenúncio de mais dificuldades na economia brasileira, provocadas
em parte por eventos externos, mas produzidas principalmente pelo acúmulo de
erros da política econômica. Em seu quarto ano de governo a presidente Dilma
Rousseff colherá o resultado de equívocos plantados nos três anos anteriores e
também no mandato de seu antecessor, como os custos financeiros, administrativos
e políticos de uma caríssima Copa do Mundo, inoportuna, mal planejada e mal
preparada. O pior desempenho da Bovespa desde 1995, quando o índice caiu 10,77%,
é um bom marco inicial de um roteiro com muitos obstáculos e armadilhas.
Os principais problemas externos foram previstos com folga suficiente para um
governo sensato se prevenir. A redução gradual dos estímulos monetários
americanos foi anunciada no primeiro semestre do ano passado. As tensões nos
mercados surgiram logo em seguida, mas o Federal Reserve, o banco central dos
Estados Unidos, só começou a executar o programa no mês passado.
A acomodação da economia chinesa começou há mais de um ano. O crescimento
deve ainda manter-se em torno de 7,5%, um resultado notável, mas a desaceleração
tende a afetar os mercados de commodities e os países mais dependentes de
exportações de produtos básicos para a China. É esse, obviamente, o caso do
Brasil. Além do mais, há uma ampla perspectiva de desempenho mais fraco dos
emergentes.
A combinação de todos esses fatores já interfere na movimentação
internacional de capitais. Na última semana de janeiro US$ 6,3 bilhões foram
retirados de carteiras de renda variável de países emergentes, segundo relatório
do banco Morgan Stanley. Considerados os valores absolutos, a quarta maior
perda, US$ 610 milhões, foi a das carteiras de ações brasileiras. Os três
maiores perdedores, por esse critério, foram a Coreia, a China e a Rússia. Em
termos proporcionais, isto é, em relação ao volume investido, os mais atingidos
foram o México, o Chile e a Indonésia.
Na corrida inicial, os fundamentos econômicos e a confiabilidade de cada país
podem fazer pouca diferença. Não tem sentido, nesse caso, falar de justiça ou
injustiça. O mais importante para o aplicador, no momento de susto, é sacar o
dinheiro e transferi-lo para aplicações consideradas mais seguras. São
principalmente ativos em dólares. Mas os países mais preparados para absorver
choques tendem a se destacar, depois dos primeiros impactos, e a levar vantagem
na disputa pelos capitais.
O Brasil, neste momento, está em desvantagem pelos dois critérios, o preparo
para choques e a credibilidade necessária para o retorno ao mercado. Permanece o
risco de rebaixamento de sua nota por agências de avaliação de crédito.
Consultores e especialistas do setor financeiro em geral conhecem os
fundamentos econômicos do Brasil. Sabem o suficiente para distinguir a situação
brasileira da desastrosa posição de países como a Argentina e a Venezuela, mas
em outras comparações a imagem do Brasil é bem menos atraente.
A resistência brasileira a choques externos depende exclusivamente do volume
de reservas, US$ 375,76 bilhões em 30 de janeiro. A acumulação de moeda forte
foi um dos principais e raros acertos dos últimos anos. Os demais indicadores
denunciam vulnerabilidades.
O resultado fiscal do ano passado, o superávit primário de 1,9% do Produto
Interno Bruto (PIB), o menor em 11 anos, só foi alcançado com receitas
extraordinárias. A inflação continua bem acima da meta de 4,5%. O clássico
ajuste por meio da desvalorização cambial envolverá, portanto, riscos
consideráveis em relação ao nível geral de preços. A produção manufatureira
pouco avançou no ano passado e a indústria continua despreparada para a
competição internacional. O comércio exterior será novamente uma das áreas mais
vulneráveis. Se tiver algum realismo, a presidente Dilma Rousseff tentará criar
no mercado alguma expectativa de mudança. Se falhar, o mau desempenho da bolsa
será a consequência menos grave.