Dólar fecha no maior nível em cinco meses, negociado a R$ 2,437; Bolsa teve queda de mais de 3%
- Nenhuma das 72 ações que integram o Ibovespa, principal índice do mercado, terminou em alta hoje
- Ações da Petrobras foram as mais afetadas e puxaram a baixa do Ibovespa
- Indústria da China e dos EUA mostrou crescimento mais fraco, o que trouxe de volta desconfiança do crescimento mundial
João Sorima Neto - O Globo
Com agências internacionais
O mau humor voltou a tomar conta do mercado financeiro global no primeiro dia útil de fevereiro, com a volta da aversão aos ativos de países emergentes. A Bolsa de Valores de São Paulo caiu mais de 3% e o dólar fechou negociado a R$ 2,437, renovando a máxima desde o dia 21 de agosto do ano passado, quando a moeda americana fechou a R$ 2,451. Um novo sinal de desaceleração na economia chinesa foi o gatilho para que os investidores vendessem ações e moedas dos mercados emergentes. Nos Estados Unidos, dados da atividade industrial também vieram abaixo do esperado, colocando em dúvida a velocidade de recuperação da maior economia do mundo.
No fim do pregão, o Ibovespa recuou 3,13% aos 46.133 pontos e volume negociado de R$ 6,7 bilhões. Nenhuma das 72 ações ações que integram o Ibovespa terminou em alta e o índice encerrou na menor pontuação desde o dia 12 de julho do ano passado, quando fechou aos 45.533 pontos.
Pela manhã, os investidores repercutiram o índice dos gerentes de compras (PMI, na sigla em inglês) da atividade industrial chinesa. O número recuou para 50,5 pontos em janeiro, depois de atingir 51 pontos em dezembro. É o menor nível em seis meses. Também recuou o PMI sobre a atividade do setor de serviços chinês, que ficou em 53,4 pontos em janeiro, ante 54,6 pontos em dezembro. Esses números confirmam as preocupações do mercado de que a segunda maior economia do planeta pode estar reduzindo sua expansão. Com a China e os Estados Unidos divulgando números mais fracos de atividade, o crescimento mundial foi colocado em xeque novamente, segundo analistas.
O nervosismo aumentou depois que o instituto de pesquisas Markit Economics confirmou que o índice dos gerentes de compras (PMI, na sigla em inglês) sobre a atividade industrial dos EUA caiu para 53,7 pontos em janeiro - menor nível desde outubro - de 55,0 pontos em dezembro. E o índice do Instituto de Gerência e Oferta (ISM, na sigla em inglês) mostrou a mesma tendência: o número caiu para 51,3 pontos em janeiro, ante os 56,5 pontos apurados em dezembro, segundo dados revisados. Analistas previam queda para 56 pontos, ante os 57 pontos de dezembro
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- Nesses momentos de mau humor do mercado, os investidores saem dos ativos de risco juntos, principalmente de emergentes, sem analisar todos os fundamentos da economia e das empresas, por exemplo. Se ele persiste por um período de três a seis meses, pode haver consequências para a economia real, já que as companhias tendem a paralisar ou adiar investimentos. Isso tem impacto direto no crescimento do PIB. Além disso, a alta do dólar pode levar o Banco Central a manter o aperto monetário por mais duas rodadas do que estava previsto - avalia Araujo.
Ele lembra, entretanto, que também pode haver consequências positivas, do ponto de vista da política fiscal.
- Esse nervosismo do mercado pode levar o governo a entregar uma meta de superávit primário melhor - algo como 3%. E também deixar de usar malabarismos contábeis para apresentar os números das contas públicas. Na minha avaliação, a pressão do mercado já fez uma pequena mudança no comportamento do governo, que deslanchou o programa de privatizações de estradas e aeroportos, por exemplo - diz Araujo.
O economista da Votorantim Corretora, Roberto Padovani, manteve a estimativa para o superávit primário do país em 1,5% do PIB, com baixo crescimento da economia e tendência de aumento dos gastos do governo.
Para Ivan Kraiser, diretor de renda variável da Legan Asset, o Brasil acaba sendo afetado com mais intensidade, devido a fragilidades internas, como a perspectiva de baixo crescimento econômico, além da situação fiscal. Além disso, na sexta, os fundos de investimento compraram ações para evitar prejuízos maiores no fechamento do mês de janeiro, e o Ibovespa terminou em alta, descolado dos mercados externos. Isso fez com que a queda do Ibovespa fosse maior potencializada do que em outras Bolsas.
- A Bolsa está ficando barata, com oportunidades para entrar. Mas o clima é complicado com o sentimento de aversão aos emergentes - diz Kraiser.
Ações da Vale e Petrobras têm forte queda
Impactadas diretamente pelas notícias da China, as ações da Vale e da Petrobras recuaram com força e puxaram o Ibovespa. As ações preferencias da Vale (sem direito a voto) caíram 3,0% a R$ 29,14, enquanto os papéis preferenciais da Petrobras perderam 5,78% a R$ 13,85, a terceira maior queda do Ibovespa. Os papéis ordinários da petrolífera (com direito a voto) perderam 4,86% a R$ 13,15.
- O estrangeiros estão saindo da Bolsa (quase R$ 1 bilhão saiu da Bovespa até o dia 30 de janeiro) e os papéis mais negociados como Petrobras e Vale acabam sentindo mais - diz Fernando Araujo, da FCL.
Em dia de perdas generalizadas, os papéis de bancos com maior peso no Ibovespa também tiveram desvalorizações expressivas. As ações preferenciais do Itaú Unibanco caíram 1,18% a R$ 29,90 e os papéis preferenciais do Bradesco recuaram 3,40% a R$ 25,28.
No caso do Itaú Unibanco, a Receita Federal confirmou a autuação do Itaú Unibanco em relação ao não recolhimento de tributos no processo de fusão entre Itaú e Unibanco. Segundo comunicado enviado pelo Itaú Unibanco à Comissão de Valores Mobiliários (CVM), a decisão da Delegacia da Receita Federal do Brasil de Julgamento não foi unânime e o banco irá recorrer ao Conselho Administrativo de Recursos Fiscais. O valor da multa é de R$ 18,7 bilhões.
As ações ordinárias (sem direito a voto) da Sabesp apresentaram a quinta maior queda do pregão, com desvalorização de 4,99% a R$ 21,15. A empresa anunciou um programa de descontos aos consumidores que economizaram água. O Sistema Cantareira atingiu o menor nível de sua história. Com os descontos, o valor da conta pode cair até 48%.
Dólar renova máxima desde agosto do ano passado
O dólar comercial começou o dia em queda, mas inverteu o sinal e passou a subir com o aumento da aversão aos ativos de países emergentes. A moeda americana se valorizou 1,03% sendo negociada a R$ 2,435 na compra e a R$ 2,437 na venda. Na máxima do dia, o dólar comercial atingiu R$ 2,439 (alta de 1,11%) e na mínima foi negociada a R$ 2,401 (queda de 0,45%).
No Brasil, os analistas elevaram sua previsão para o dólar este ano de R$ 2,45 para 2,47, segundo o boletim Focus divulgado pelo Banco Central.
- É mais do mesmo, com os dados mais fracos da indústria da China e dos EUA. Acredito que, em breve, teremos o dólar buscando picos de R$ 2,60. Temos um ano complicado pela frente no Brasil, com as eleições, e o governo também não atacou a parte fiscal. Não acredito que este ano o BC possa elevar muito os juros, justamente por causa das eleições - avalia Ítalo Abucater, especialista em câmbio da Icap Brasil.
Pela manhã, o dólar recuou frente às principais moedas de países emergentes, mas também inverteu o sinal. O peso mexicano caía 0,59% frente ao dólar, a lira turca perdia 0,48%, e o rand sul-africano se desvalorizava 1,05%.
Nesta segunda, o BC voltou a oferecer ao mercado, através de leilão, mais quatro mil contratos de swap cambial, operação que equivale a uma venda de dólares no mercado futuro. Os contratos terão vencimento em 1º de agosto e 1º de dezembro e totalizaram US$ 196,8 milhões. Mesmo assim, o dólar segue a tendência global de alta.
Juros futuros sobem com alta de dólar
No mercado de juros futuros, as taxas também subiram acompanhando o dólar. Os investidores temem uma rodada mais forte de aperto monetário pelo Banco Central depois que outros bancos centrais de países emergentes elevaram o juro para deter a alta dos preços e tentar evitar a fuga de investidores. O contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2017 encerrou com taxa de 13,07%, de 13% no ajuste de sexta-feira. E o DI com vencimento em janeiro de 2015 teve taxa de 11,73%, de 11,69% na sexta.
Números da economia americana vieram mais fracos
Além da preocupação com os emergentes, os investidores estão de olho nos números da economia americana, que vão determinar o ritmo de redução dos estímulos à economia pelo Federal Reserve (Fed, o banco central americano). O banco central americano já anunciou duas reduções de compras de ativos, de US$ 85 bilhões mensais para US$ 65 bilhões.
"As preocupações com os países emergentes deverão seguir nos radar dos mercados externos. Ao mesmo tempo, nos países desenvolvidos, a agenda de indicadores de atividade merece atenção, já que a consolidação da recuperação e a evolução da inflação serão decisivas para a política monetária nos EUA", avalia em relatório Octávio de Barros, economista do Bradesco.
As Bolsas da Europa recuaram forte. O índice Dax, da Bolsa de Frankfurt, teve queda de 1,29% enquanto o índice Cac, da Bolsa de Paris, teve baixa de 1,39%. Na Ásia, o índice Nikkei, da Bolsa de Tóquio, recuou quase 2% com o dado chinês.
Nos Estados Unidos, as Bolsas também têm um dia de perdas expressivas. No final da tarde, o S&P 500 caia 2,09%; o Dow Jones perdia 1,79% e o Nasdaq tinha baixa de 2,52%.