domingo, 21 de abril de 2024

'Presidentes da Câmara e do Senado brasileiros são aliados dos censores', escreve J.R. Guzzo

 

O presidente do Senado Federal, senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG).| Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado


É um sinal trágico do fundo de poço para o qual o Brasil de hoje foi empurrado o puro e simples fato que se segue: foi preciso a Câmara de Deputados dos Estados Unidos denunciar a censura no Brasil, porque o Congresso brasileiro, na figura dos presidentes da Câmara e do Senado, não faz nada a respeito. É, realmente, superar os limites no esforço para passar vergonha, agora na frente do mundo inteiro.

Nenhum dos dois, até o momento, se importou a mínima em passar vergonha aqui dentro do Brasil. Foram capazes de não dizer uma única palavra, desde que assumiram seus cargos, diante das centenas de atos explícitos de censura cometidos pelo STF em geral e pelo ministro Alexandre de Moraes em particular. Para quê? Estão preocupadíssimos em colaborar com a “governabilidade”, é claro – ou seja, suas prioridades de 1 a 10 consistem em se dar bem. Resultou nisso aí.


Já que a Câmara e o Senado, em Brasília, são aliados dos censores, os brasileiros conseguiram aliados em Washington.


Os brasileiros sabem há muito tempo que o STF pratica censura nas redes sociais; a Câmara americana citou 88 casos, envolvendo 300 perfis, mas são literalmente centenas de violações flagrantes à liberdade de expressão determinada no artigo 5º da Constituição Federal. Mas não podem fazer nada porque a força bruta está do lado do STF. Foi preciso que uma das casas do Congresso americano, enfim informada dos fatos pelo controlador do X, o antigo Twitter, denunciasse o escândalo que a direção do Congresso brasileiro se recusa a denunciar.

A denúncia não vai obrigar os ministros a respeitarem as leis do seu próprio país, pois eles não estão nisso por acaso. A censura das redes, na verdade, é uma peça-chave do seu projeto pessoal de “democracia”, como dizem o tempo todo. Mas a defesa das liberdades e dos direitos civis no Brasil ganhou um novo apoio. Já que a Câmara e o Senado, em Brasília, são aliados dos censores, os brasileiros conseguiram aliados em Washington.

A vergonha, com certeza, não é dos deputados e senadores brasileiros como um todo. Muitos deles, com claro risco pessoal, integridade e coragem, denunciam publicamente a censura. Da mesma forma, a imprensa independente, onde a repressão não chegou até agora – salvo em alguns episódios – tem informado seu público sobre o que está acontecendo.

Mas a máquina do Estado, com o apoio da maior parte da mídia e de quem não aceita o ambiente de tumulto da internet, tem todas as vantagens a seu favor. Os censurados não são informados do que fizeram. Os advogados não têm acesso às decisões da censura. Não há processo legal. Não há recurso à instância superior – na verdade, à instância nenhuma. Como no AI-5 da ditadura militar, não é possível recorrer ao sistema judicial para se defender das determinações ilegais.

É realmente uma aberração, nessas condições, que as mesas diretoras da Câmara dos Deputados e do Senado Federal não defendam, nem mesmo, os próprios deputados e senadores que são censurados pelo STF. Na verdade, não defendem os parlamentares de nada – nem da prisão, nem da obrigação de depor na polícia, nem da invasão de seus gabinetes, nem da apreensão dos seus celulares e computadores. Se agem assim com os habitantes do seu mundo, por que iriam se preocupar com os direitos do cidadão que os sustenta? É sem dúvida um dos piores momentos na história do Congresso Nacional.


J.R. Guzzo, Gazeta do Povo