quarta-feira, 22 de julho de 2020

Estados Unidos ordenam fechamento de consulado chinês no Texas

COPENHAGUEApós acusar hackers chineses de tentarem roubar estudos sobre uma vacina para o vírus chinês, o governo dos Estados Unidos determinou o fechamento do consulado da China em Houston, no Texas, em 72 horas. A medida, segundo anúncio feito pelo Departamento de Estado americano nesta quarta-feira, 22, visa "proteger a propriedade intelectual americana e as informações privadas dos americanos". 
"Ordenamos o fechamento do consulado da República Popular da China em Houston para proteger a propriedade intelectual americana e a informação privada dos cidadãos", disse a porta-voz Morgan Ortagus, durante visita do secretário de Estado americano, Mike Pompeo, a Copenhague. "A China se envolve há anos em operações ilegais de espionagem nos Estados Unidos contra funcionários do governo dos EUA e cidadãos americanos". 

EUA China
Estados Unidos e China disputam influência global em novo cenário Foto: Reuters
A decisão de fechar o consulado representa uma escalada significativa dos esforços americanos para ampliar o controle sobre diplomatas, jornalistas, acadêmicos e outros cidadãos chineses nos Estados Unidos. Ela ocorre em meio a crescentes tensões  agravadas pela pandemia do novo coronavírus. 
"Os Estados Unidos não vão tolerar qualquer violação da nossa soberania nem intimidação do nosso povo por parte da China, como tampouco toleramos as práticas comerciais injustas, o roubo dos empregos americanos e outros comportamentos. O presidente Trump insiste na justiça e na reciprocidade em nossas relações", acrescentou a porta-voz. 
As disputas recentes entre os dois países já incluíram a emissão de regras de viagem semelhantes aos da Guerra Fria para diplomatas e a exigência de que várias organizações de notícias estatais chinesas se registrassem como entidades diplomáticas. O governo também está considerando uma proibição de viagem para membros do Partido Comunista e suas famílias. Tal medida, se promulgada, poderia afetar 270 milhões de pessoas, e tem sido amplamente criticada por ser muito ampla para ser prática. 
A China tem cinco consulados nos Estados Unidos. O de Houston, no Texas, foi aberto em 1979. A representação do Texas trata ainda de questões consulares de Porto Rico, Oklahoma, Louisiana, Arkansas, Mississippi, Alabama, Geórgia e Flórida. 
Há ainda consulados em Nova York, Chicago, Los Angeles, São Francisco e a embaixada em Washington. 
Segundo jornais de Houston, bombeiros foram ao consulado chinês horas após a decisão do governo americano porque documentos estavam sendo queimados no pátio do edifício. 
No Twitter, a polícia local disse que havia fumaça, mas não recebeu autorização para entrar no consulado. 
Donald Trump - Xi Jinping
Trump e Xi durante encontro bilateral, na cúpula do G-20, em Osaka, Japão 
Foto: Kevin Lamarque/Reuters

Reação chinesa

As autoridades chinesas protestaram contra a decisão, a qual classificaram de "provocação política" que prejudicará as relações diplomáticas bilaterais. "É uma provocação política que viola gravemente o direito internacional", denunciou um porta-voz da diplomacia chinesa, Wang Wenbin. "A China condena esta decisão escandalosa e injustificada", disse Wenbin, pedindo que Washington recue, ameaçando com uma resposta "adequada" de Pequim. 
"Por algum tempo, o governo dos EUA vem transferindo a culpa para a China com estigmatização e ataques injustificados contra o sistema social da China, assediando funcionários diplomáticos e consulares chineses, intimidando e interrogando estudantes chineses e confiscando seus dispositivos elétricos pessoais, até mesmo detendo-os sem causa", ele disse. "O governo chinês é um fervoroso defensor da segurança cibernética e sempre se opôs a ataques cibernéticos", acrescentou. 
De acordo com a agência de notícias Reuters, uma das possibilidades estudadas por Pequim é o fechamento do consulado americano em Wuhan, cidade onde a pandemia do vírus chinês começou. Os EUA têm ainda consulados em Xangai, Shenyang, Chengdu, Guangzhou, Hong Kong e a embaixada em Pequim. 
Hu Xijin, editor do The Global Times, um jornal nacionalista controlado pelo Partido Comunista, considerou a ação americana ultrajante. "Isso é uma manifestação de pânico", escreveu em nota postada no Weibo, a plataforma de mídia social chinesa. O jornal também publicou uma enquete no Twitter - que é proibido na China - pedindo aos leitores para escolher qual consulado americano deveria ser fechado.

'Passo ousado'

Cheng Xiaohe, professor da Escola de Estudos Internacionais da Universidade Renmin em Pequim, disse que os Estados Unidos nunca deram um passo tão ousado e divisivo desde que os dois países estabeleceram relações diplomáticas, em janeiro de 1979. "Se o relacionamento entre a China e os Estados Unidos continuar se deteriorando sem controle, o próximo resultado será o rompimento das relações diplomáticas".
Wang Yong, professor de estudos internacionais da Universidade de Pequim, disse que certas pessoas em Washington parecem empenhadas em promover uma guerra fria entre a China e os Estados Unidos e a dissociação completa dos dois países "Acredito que eles têm considerações políticas, principalmente em torno das eleições", disse Wang.
"Eles estão adotando uma abordagem tão dura, demonizando e se tornando hostis à China, tornando a China um inimigo, para mobilizar as pessoas e reverter a situação desfavorável do presidente Trump nas eleições. No final, isso prejudicará os interesses dos EUA e a China". 
Fechar um consulado é um problema diplomático sério, mas já ocorreu nos EUA. Em 2017, o governo Trump ordenou que a Rússia fechasse seu consulado em São Francisco, juntamente com dois anexos perto de Nova York e Washington, em retaliação às restrições russas ao número de diplomatas americanos em Moscou. As medidas ocorreram após a interferência da Rússia nas eleições presidenciais de 2016, cujas consequências ainda são sentidas, apesar da tentativa de Trump de se aproximar do presidente russo, Vladimir Putin. 

'Calúnias'

As autoridades chinesas acusaram os Estados Unidos de "calúnias", depois que dois cidadãos do país foram indiciados por ciberataques a empresas envolvidas na busca de uma vacina contra o vírus chinês. O Departamento americano de Justiça formalizou acusações contra Li Xiaoyu, de 34 anos, e Dong Jiazhi, de 33, "dois hackers chineses que trabalhavam com o Ministério chinês da Segurança". Pequim refutou as acusações. 

Segundo as autoridades americanas, os dois hackers se conheceram durante estudos de engenharia e roubaram segredos industriais avaliados em milhares de dólares ao longo de dez anos. Recentemente, teriam tomado como alvo empresas da Califórnia que trabalham na busca de uma vacina e de um tratamento para o vírus chinês, de acordo com o promotor federal responsável pelo caso, William Hyslop. Li e Dong não foram detidos.  
Com informações de AFP, NYT, Washington Post, Reuters e O Estado de S.Paulo