sábado, 16 de fevereiro de 2019

‘Vamos fazer ao menos uma venda de refinaria este ano’, diz presidente da Petrobras

Presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco Foto: AMANDA PEROBELLI / REUTERS

Presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco Foto: AMANDA PEROBELLI / REUTERS

Há dois meses à frente da Petrobras, Roberto Castello Branco elegeu a venda de parte das operações da companhia como prioridade. Um dos desafios é incentivar a concorrência no mercado de refino, aberto à iniciativa privada em 2001, mas no qual a estatal detém fatia de 98%. O executivo quer vender ao menos uma das refinarias este ano. O foco de sua gestão é o corte de custos. 

Os esforços devem se concentrar no pré-sal, com destaque para o megaleilão, que ainda depende de um ajuste de contas da Petrobras com o governo sobre o contrato da cessão onerosa (área cedida pela União com direito a explorar 5 bilhões de barris). 

Num horizonte de três anos, Castello Branco almeja recuperar o grau de investimento da companhia, o selo de qualidade dos investidores, perdido em 2015, na esteira do rebaixamento da nota do Brasil e da corrupção revelada pela Lava-Jato.

Qual é a prioridade do seu primeiro ano de gestão?
- É a melhoria no portfólio, com a venda de ativos. Outra coisa é reduzir o nível de alavancagem e a busca por uma dívida menor e mais longa. Já chegamos a um prazo de quase nove anos. Vamos trabalhar para superar os dez anos para minimizar o risco de financiamento. Para o médio prazo, vamos recuperar o investment grade (grau de investimento), pois tem impacto sobre o custo do capital. Isso é uma meta. 
E quando espera recuperar o grau de investimento?
- Talvez em três anos, mas o importante é trabalhar nessa direção. O rating da Petrobras está atrelado ao do Brasil. Existe uma relação entre os dois. O do país pode atuar para limitar o da Petrobras, e ao mesmo tempo o da empresa pode influenciar o do Brasil, dado o tamanho da companhia para a economia. Em 2005, a Vale conquistou o investment grade, e o Brasil só conseguiu em 2008. Esperamos que o Brasil vá melhorar, com o esforço das reformas, como a da Previdência. Se o Brasil persistir nessa direção, vai melhorar muito a percepção de risco.
A companhia vai manter o plano de investir US$ 84,1 bilhões entre 2019 e 2023?
- O investimento é o mesmo, com pequenas variações. Não pretendemos investir em petroquímica. O valor que estava orçado no Plano de Negócios é pequeno (de US$ 300 milhões). Vão acontecer leilões, mas os dispêndios não estão previstos no plano.
Então, não vai mais investir em petroquímica?
- Não temos interesse. É preciso fazer economia em tudo. Um dólar é sempre um dólar. Antes de gastar, é preciso ver o que aquele dólar vai me trazer de bom.
Mas não é importante ter negócios em todas as etapas da cadeia de petróleo?
- Eu costumo dizer que não quero ser John Malkovich. Cada empresa tem sua particularidade. Vejo as empresas de petróleo vendendo refinarias para traders.
Qual a sua meta em relação ao setor de refino, no qual tem 98% do mercado?
- Minha ideia é ficar com menos de 50% da capacidade do refino. Estamos estruturando como fazer, porque queremos criar um mercado competitivo. Não adianta transferir o poder do mercado da Petrobras para a iniciativa privada.
Quando começa a vender as refinarias?
- Vamos ter pelo menos uma venda de refinaria este ano. O projeto de venda vai ser diferente do que já foi anunciado. A empresa pode comprar a refinaria e alugar serviços (de infraestrutura).
Já chegou a um acordo com os chineses para construir uma refinaria no Comperj?
- Ainda não. Pessoalmente, ainda não estive com eles. Se eles quiserem fazer uma refinaria, ótimo. Vamos dar o maior apoio e incentivo. Se não quiserem, não somos nós que vamos construir. O momento é de vender refinaria.
A liberdade de preços é fundamental para atrair investidores no refino?
- Se não tem liberdade de preços, o investidor não tem segurança. Ele vai embora.
Depois da greve dos caminhoneiros em maio do ano passado, qual vai ser a política de preços para os combustíveis?
- Detesto falar em política de preços. Não existe isso para café e sanduíche. Existem preços. Quero tirar política de preços da frente. O preço tem de ser algo que resulte da relação entre fornecedor e cliente.
Qual é a estratégia para a BR?
- A ideia é fazer operações de mercado de capital. É aumentar a parcela em mãos de investidores privados. Pode até ser (vender) o controle, mas não está definido.
Vai cortar investimento em energia renovável?
- A gente vai reduzir. Pode ser tudo. Pode ser alguma coisa. Vamos segurar um pouco a empolgação e ser mais cautelosos. O objetivo é maximizar a produção de petróleo do pré-sal. Temos que ter em mente que a demanda por petróleo no futuro vai crescer mais lentamente. A médio prazo, a prioridade é o gás natural, que é pouco desenvolvido no Brasil.
Qual é o caminho para alcançar as metas?
- Vamos reduzir custos que não estavam previstos no plano. Ainda não temos uma meta de redução. Estamos desenhando um programa para incentivar nossos colaboradores a apresentarem propostas que levem a redução de custos e ganhos de eficiência. Esperamos que centenas de pessoas apresentem ideias que podem levar a pequenas reduções. Se efetivadas, o somatório dará um valor significativo.
Mas essa cultura já não estava implantada na empresa?
- Não, porque não tinham ocorrido iniciativas desse tipo. Havia ações de forma geral, envolvendo redução do número de empregados e terceirizados. Redução de custos não significa apenas demissão de pessoas.
A companhia vetou o nome de Carlos Victor Guerra para o cargo de gerente executivo de Inteligência e Segurança Corporativa. O que houve?
- Já explicamos. É engraçado. É só porque ele é amigo do presidente Jair Bolsonaro que surgiu toda essa celeuma. Todo mundo que é indicado aqui para um cargo sofre um processo de checagem. Então, ele fez e não passou porque não tinha experiência gerencial. Isso é uma comprovação de que a governança aqui é forte.
Isso não seria critério básico?
- Nas Forças Armadas, um tenente não pode pular direto para general. Aqui existe uma obrigação de que a pessoa tem que ter passado um período em cargo gerencial.
E na diretoria executiva há cargos abertos?
- Na área de Gás, já tem uma indicação. Pretendemos acabar com a diretoria de Estratégia. Talvez fiquem seis diretorias ou eu crie uma nova diretoria, que está sendo estudada.
Qual seria a nova diretoria?
- Seria a diretoria de Relações Institucionais, porque a Petrobras, como empresa regulada e estatal, tem muita relação com governos, Poder Legislativo, Judiciário e órgãos de controle. Temos pessoas que exercem essas funções, mas é fragmentado. Então, queremos ter uma linha de pensamento e centralização. Essa área também ficará responsável pelo relacionamento com comunidades, próximo a locais onde temos operações.
Como estão as negociações sobre a cessão onerosa?
- O importante é que o leilão (do excedente da cessão onerosa) seja realizado. E o que o governo nos der pelo contrato (da cessão onerosa), vamos devolver entrando no leilão. Sai de um bolso e entra no outro. Todas as opções estão na mesa. A meta é chegarmos a um acordo até o fim do mês.
A Petrobras pode receber menos de US$ 14 bilhões?
- Não sei.
Mas esse pagamento à Petrobras pode romper o teto de gastos do governo?
- É uma das questões em discussão: como evitar que o governo rompa o teto de gastos. Mas é importante a Petrobras participar do leilão. As empresas estrangeiras não têm experiência no pré-sal. Todas vêm aqui conversar. Somos a noiva do leilão. Todo mundo quer casar com a gente.
A empresa virou a página da corrupção? Por quanto tempo vai carregar essa conta?
- A venda de Pasadena simbolizou isso. (Vai carregar a conta) por um longo período. O principal já foi resolvido, mas sobram pendências.
O senhor sempre foi defensor da privatização da Petrobras. Agora, no comando da estatal, sua opinião mudou?
- Não mudou. Simplesmente, antes eu era só um economista. Hoje, sou executivo. E a determinação do presidente da República que foi eleito pelo povo é que eu tenho liberdade de ação, menos para privatizar a companhia.


Ramona Ordoñez, Bruno Rosa e Janaína Lage, O Globo