Quando o já então ex-presidente Lula escolheu o ex-ministro Fernando Haddad para disputar a eleição na prefeitura de São Paulo pelo PT, em 2012, comentou que ele tinha “jeito de tucano”, e talvez a população da capital pudesse votar nele. Haddad foi eleito, mas não conseguiu se reeleger. Deu errado a transposição do petista para o figurino tucano, e, em 2016, o candidato do PSDB, João Doria, acabou vencendo no primeiro turno, fato inédito na disputa pela prefeitura paulistana. O jeito tucano não resistiu a um mandato.
A vitória imediata de Dória foi decidida nos últimos momentos, pelo voto útil dos que não queriam o PT na prefeitura, que descarregaram os votos no tucano. Lula na ocasião estava livre, leve e solto e não conseguiu transferir votos suficientes para seu escolhido, nem ele convenceu o eleitorado de que era um tucano travestido de petista.
Na eleição de 2010, Lula havia transferido para a desconhecida Dilma sua popularidade transformada em votos, mas é difícil encontrar líderes populares que, sem poder participar da campanha eleitoral presencialmente, tenham tido sucesso. O exemplo clássico é Peron, na Argentina que, do exílio em Madri, lançou para aseleições presidenciais de 1973 Héctor José Cámpora a presidente. Vencedor por larga margem de votos, o novo governo anistia Peron e renuncia, convocando novas eleições presidenciais, vencida por Peron, tendo como vice sua mulher Isabelita. Há no PT quem jogue com essa carta.
Um exemplo que já faz parte da história política brasileira ocorreu na Bahia, em 1982. O candidato oficial era Cleriston Andrade, que morreu em um acidente de helicóptero em outubro, poucos dias antes da eleição, e o governador Antonio Carlos Magalhães, cujo grupo político era hegemônico no Estado, tirou do bolso do colete para sucedê-lo João Durval Carneiro, ex-secretário estadual e várias vezes deputado federal.
A força política de ACM, juntamente com a tragédia levaram Durval Carneiro a ser eleito governador com 53% dos votos em poucos dias de campanha. Além do choque da morte do favorito, havia o fato de que Antônio Carlos Magalhães participou ativamente da campanha, e de Durval Carneiro ser um político conhecido no estado.
A campanha de Haddad tem um começo claudicante devido à estratégia, definida pelo próprio Lula, de só apontá-lo como sucessor no prazo legal mais longo possível, tentando até o final ser ele mesmo o candidato, o que parece impossível diante da Lei da Ficha Limpa que o torna inelegível.
Para se ter idéia da dificuldade do vice que virará candidato à presidência, no nordeste, onde Lula impera, ele não passa de um desconhecido, o eleitorado tem dificuldade de falar seu nome e já estabeleceu que se chama Andrade. A previsão do PT de que os votos de Lula no nordeste, onde chega a ter até 80% de preferência em alguns estados, se transformarão em votos no “Andrade” pode não ser um sucesso absoluto.
O voto em Lula, até o momento, está disperso entre vários candidatos, a maior parte indo para Marina da Rede e até mesmo para Jair Bolsonaro. Há quem garanta que os votos são para Lula, e não para o PT. E se o eleitor não encontrar o nome de Lula na urna eletrônica, poderá optar por outro candidato que na campanha se aproximar de suas necessidades, ou pelo voto branco ou nulo.
A estratégia de Lula de levar sua candidatura até o prazo fatal de 17 de setembro, quando a Lei Eleitoral permite a troca de nomes dos candidatos, está sendo boa para ele próprio, que sobe nas pesquisas, mas pode causar problemas para o PT. É certo que a presença de Lula na propaganda eleitoral que começa dia 31 de agosto será contestada pela maioria dos candidatos.
Haddad, de acordo com a tendência majoritária do Tribunal Superior Eleitoral não poderá usar fotos e filmes sobre Lula em sua campanha, além de não ser autorizado a usar a máscara de Lula como vem fazendo nos comícios e carreatas.
O ex-presidente está proibido pela Justiça de gravar programas e dar entrevistas, e pode ser impedido de participar da campanha mesmo com imagens anteriores à prisão. Seria uma propaganda enganosa de um candidato que não está sub-judice, mas impugnado pela legislação eleitoral.
O Globo