Está aberta a temporada de acirrada competição pela extração de informações das pesquisas de opinião. Contudo, diante da elevadíssima proporção de brancos, nulos e indecisos — sobretudo nos cenários que excluem Lula da corrida —, traçar cenários a partir dessas pesquisas de intenção de voto é tarefa ainda mais árdua do que extrair leite de pedra.
Até agora as pesquisas serviram para revelar três características do eleitorado brasileiro: primeiramente, ainda há muita gente que apoia Lula, seja por serem lulistas ferrenhos, seja porque a prisão do ex-presidente e a liberdade de políticos envolvidos em corrupção, mas que ainda gozam da imunidade a eles conferida por lei, lhes parecem gravemente injustas.
Esse, aliás, parece ter sido o motivo para que Lula tenha crescido em todas as pesquisas divulgadas na última semana. A segunda característica é que a capacidade que Lula tem para transferir votos para Fernando Haddad aparenta ser, por ora, limitada. Claro que tal leitura pode ser prematura a depender do desenrolar das próximas semanas. Não é difícil imaginar um segundo turno disputado entre Bolsonaro e Haddad, caso em que teremos um referendo sobre o PT com um leve odor de 1989 e um fortíssimo cheiro de que a governabilidade do país pós-eleições poderá ficar severamente comprometida.
Por fim, as pesquisas mostram que o eleitor brasileiro simplesmente ignorou os dois debates presidenciais televisionados até agora.
Tal constatação pouco espanta, visto que a fictícia Ursal foi a estrela do primeiro, e a intensa discussão entre Marina e Bolsonaro a marca do segundo — com marineiros e bolsonaristas defendendo as virtudes de seus respectivos candidatos. Surpresa fiquei com os tímidos comentários a respeito da combativa Marina, inexistente nas eleições de 2014. Soube ela enfrentar o capitão com firmeza jamais vista, o que a coloca em excelente posição para encará-lo em eventual segundo turno. O grande desafio de Marina é chegar ao segundo turno com a pouca exposição que terá na TV.
Sobre o tempo de TV: entusiastas de Alckmin acreditam que seus 18 minutos poderão impulsionar substancialmente sua candidatura, sobretudo se souber usá-los bem — sempre um desafio. Como escrevi na semana passada neste espaço, Alckmin, assim como outros presidenciáveis, ainda precisa mostrar que sabe conversar com o eleitorado de forma simples expondo temas complexos. Até agora, sua linguagem e o uso excessivo de dados e estatísticas tendem a alienar o eleitor médio brasileiro, que, afinal, quer ouvir propostas concretas sobre os problemas que enfrenta diariamente — a violência, o acesso à educação, o acesso à saúde, as chances de conseguir um emprego. A pesquisa do Datafolha revelou que Alckmin tem bom desempenho no segundo turno, desempenho esse que pode ser impulsionado pela migração de eleitores de Alvaro Dias e Henrique Meirelles para o candidato do PSDB. Contudo, para tanto é necessário que ele se estabeleça firmemente no território dos dois dígitos nas pesquisas, algo que até agora não conseguiu alcançar. A julgar pelo desinteresse dos eleitores nos debates revelado pelas pesquisas, é possível que o bônus televisivo de Alckmin esteja sendo um tanto exagerado por alguns analistas.
Retomando a extração de leite de pedra que intitula este artigo, estarão os mercados plenamente engajados nesse exercício daqui até pelo menos o final de setembro. Apesar da abundância de notícias mundo afora — a crise na Turquia, a crise migratória da Venezuela, a guerra comercial entre a China e os EUA, as chances de que os EUA decidam impor sobretaxas sobre automóveis, acirrando as tensões com aliados —, os mercados, como era de esperar, estão grudados nas pesquisas, todas as pesquisas.
Muitas instituições acompanham não apenas as divulgações dos grandes institutos como Ibope e Datafolha, mas encomendam pesquisas próprias, talhadas para atender a suas necessidades. O dólar e a bolsa permanecerão, portanto, reféns do imponderável. Afinal, com o número expressivo de brancos, nulos e indecisos em ampla evidência, haverá mais ruído do que sinal até a véspera das eleições.
O Globo