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NOVA YORK — Um dos maiores dramaturgos da História do teatro americano, Neil Simon morreu neste domingo, aos 91 anos. O autor, cujo nome foi sinônimo de comédia da Broadway e de sucesso comercial, ajudou a redefinir o humor popular americano, com ênfase nas fricções da vida urbana e nos agonizantes conflitos de intimidade familiar.
Sua morte foi anunciada por seu assessor, Bill Evans.
No início da sua carreira, nos anos 1950, Simon escreveu comédias para grandes nomes da televisão. Mas foi como dramaturgo que ele conquistou sua fama, com uma longa série de peças que funcionavam como “máquinas de riso”, que mantiveram seu nome nas marquises da Broadway praticamente sem parar durante o final dos anos 60 e 70.
O sucesso começou com as peças “Barefoot in the park” (1963) e “The odd couple” (1965), e continuou com “Plaza suite” (1968), “O prisioneiro da Segunda Avenida” (1971) e “The sunshine boys” (1974). De 1965 a 1980, peças de teatro e musicais escritas por Simon realizaram mais de 9.000 apresentações, um recorde nem sequer remotamente tocado por qualquer outro dramaturgo da época — só em 1966, ele teve quatro shows na Broadway simultaneamente.
“Barefoot in the Park” era uma comédia inspirada nas experiências de Simon como morador do Greenwich Village, e foi a peça que alçou seu nome na Broadway e, depois, em Hollywood. A peça foi estrelada por Robert Redford e por Elizabeth Ashley, ficou quatro anos em cartaz e, depois, foi transformada num filme de sucesso. Com roteiro de Simon, e com Redford e Jane Fonda nos papéis principais, o longa foi lançado em 1967 e se tornou um hit, sendo acompanhado por outra adaptação cinematográfica para uma de suas peças, “The odd couple”.
Sua carreira como roteirista incluiu dezenas de títulos, entre adaptações de suas peças e criações originais, como “The out-of-towners”, “The goodbye girl” e “The heartbreak kid” — ao todo, Simon recebeu quatro indicações ao Oscar de melhor roteiro, mas acabou não conquistando nenhuma estatueta.
Já no campo dos musicais, Simon escreveu o libreto de três obras de sucesso na Broadway: “Little Me” (1962), com músicas de Cy Coleman e letras de Carolyn Leigh, que foi dirigido e coreografado por Bob Fosse; “Sweet Charity” (1966), que reuniu Simon e Fosse novamente, num musical baseado no longa “Noites de Cabiria” de Federico Fellini; além de “Promises, Promises”, baseado no filme “The apartment”, que trazia músicas de Burt Bacharach e letras de Hal David — “Promises, promises” foi o maior sucesso musical de Simon, com mais de 1.281 apresentações e com direito a uma remontagem, em 2010.
POPULARIDADE E CRÍTICA
Apesar de toda sua popularidade com o público, os grandes sucessos de Simon, em seus primeiros anos, raramente mereceram aclamação da crítica, e as remontagens de “The odd couple”, em 2005, e de “Barefoot in the park”, em 2006, pouco fizeram para refazer a visão geral de que o seu trabalho inicial era notável pela agilidade de suas linhas e por seus conceitos infalíveis. Na introdução de uma de suas coleções de peças, Simon citou o crítico Clive Barnes para refletir sobre sua relação com a crítica: “Neil Simon está destinado a permanecer rico, bem-sucedido e subestimado”.
Recentemente, em 2009, Simon expressou surpresa e consternação com a rápida saída de cartaz de uma aguardada remontagem, na Broadway, para a sua peça “Brighton beach memoirs” — a montagem saiu de cena após a primeira semana, debaixo de críticas mistas: “Estou estupefato”, disse ele à época. “Após todos esses anos, ainda não entendo como a Broadway funciona ou o que fazer com a nossa cultura”.
Foi um comentário pungente do homem que mais ou menos definiu o que é conquistar a Broadway por algumas décadas. Mas se os fracassos rápidos foram relativamente raros em sua carreira, Simon sempre lutou para ganhar respeito crítico. Embora tenha sido indicado para 17 Tony Awards, o dramaturgo ganhou apenas três: melhor dramaturgo por “The odd couple”, além do Tony de melhor peça para “Biloxi blues” e “Lost in Yonkers” — esta última, de 1991, foi seu último grande sucesso na Broadway.
“Eu sei como o público me vê, porque as pessoas estão sempre vindo até mim e dizendo: ‘Obrigado pelos bons momentos’”, disse Simon ao “The New York Times”, em 1991. “Mas todo o sucesso me humilhou de certa forma. Criticamente, o pensamento parece ser que, se você escrever muitos sucessos, eles não podem ser tão bons”.
Simon começou a conquistar mais respeito junto aos críticos nos anos 1980, com uma trilogia semi-autobiográfica composta pelos dramas cômicos “Brighton beach memoirs” (1983), “Biloxi blues” (1985) e “Broadway bound” (1986), que exploravam a mistura de amor, raiva e desespero que unia e afastava uma família judaica da classe trabalhadora.
“Simon finalmente começa a se examinar com honestidade, sem concessões”, escreveu Frank Rich sobre “Biloxi Blues” no The New York Times, “e o resultado é seu esforço mais persuasivamente sério até hoje — sem mencionar que é sua peça mais engraçada desde “a idade de ouro” da sua primeira década”.
SIMON E ALLEN
Simon e Woody Allen foram, provavelmente, igualmente importantes em moldar as correntes da comédia americana nos anos 1960 e 70, embora seus estilos, seus meios favoritos e a recepção crítica aos seus trabalhos tenham divergido radicalmente.
Simon era o populista cujas peças acessíveis e repletas de piadas sobre as ansiedades dos personagens no dia-a-dia podiam provocar gargalhadas nos cinemas de todo o país, bem como em casas da Broadway com 1.200 assentos. Allen era o queridinho do cinema urbano de arte e das classes críticas, alguém que criava a comédia a partir das minúcias de sua própria angústia.
Mas juntos eles ajudaram a tornar a comédia da neurose urbana — distintamente influenciada pelos judeus — algo genuinamente americano.
Olhando para a sua própria carreira, Simon escreveu certa vez sobre uma “alegria ainda estridente” em relação à escolha de embarcar em uma carreira de dramaturgo: “Para um homem que quer ser seu próprio mestre, não depender de mais ninguém, e fazer a vida se adequar à sua própria visão em vez de seguir os planos dos outros, a dramaturgia é a ocupação perfeita. Sentar-se numa sala sozinho, por seis, sete ou dez horas, dividindo o tempo com os personagens que você criou, é puro paraíso. E se não o céu é pelo menos uma fuga do inferno”, acrescentou o mestre do tempo cômico.
Casado desde 1999 com a atriz Elaine Joyce, Simon deixa a sua esposa, além de três filhas, três netos e um bisneto.
por Charles Isherwood, do ‘The New York Times’