A equipe comandada pelo diretor Marcelo Antunez — de blockbusters como “Qualquer gato vira-lata 2” e “Até que a sorte nos separe 3’’ (ambos de 2015) — ficará nove dias na capital paranaense. Entre as cenas previstas no cronograma de gravação está a interceptação de um caminhão, com viaturas das polícias Federal e Rodoviária Federal na estrada PR-510, tiros e outros elementos que dão o tom do filme: um thriller político com ação e entretenimento, mas que também quer humanizar o trabalho dos profissionais envolvidos na operação.
Apesar de ficcional, a obra vai retratar as fases e os principais acontecimentos da Lava-Jato. A soltura do ex-diretor da Petrobras, Paulo Roberto Costa, vivido pelo ator Roney Facchini, foi uma das cenas gravadas na sexta-feira. Ao encontrar a mulher, Marici, interpretada por Sandra Corveloni, ele a indaga sobre quem salvará sua reputação.
— Ele se sente injustiçado e acha que foi pego numa espécie de ‘‘azar’’. Na cabeça dele, agiu de forma ilícita porque é como funciona. Aquele pensamento de que todo mundo faz assim — diz o ator, que, no dia a dia, acompanha a Lava-Jato “minuciosamente”, o que facilitou sua caracterização.
Locais que fazem parte do cotidiano do juiz Sérgio Moro em Curitiba — como o prédio da Justiça Federal e da Universidade Federal do Paraná (UFPR), onde leciona — servirão de cenários para o filme, que também será gravado em São Paulo, Brasília e Rio de Janeiro.
O juiz, que ganhou o rótulo de herói nacional, entretanto, não é o protagonista. O ator que viverá Moro, segundo a produção, não está definido. Cotado a princípio, Rodrigo Lombardi teve de declinar do convite para participar de uma novela da autora Glória Perez.
— Como eu conto a investigação do ponto de vista dos investigadores, aprendi que a fase pré-processual tem pouco protagonismo do juiz. Depois é que ele passa a julgar as provas. Por isso, o papel do Moro tem peso menor. É um protagonismo mais diluído, a exemplo de “Spotlight” (vencedor do Oscar deste ano) — explica Antunez.
O Globo
Junto com os roteiristas Gustavo Lipsztein e Thomas Stavros, Antunez iniciou a pesquisa para desenvolver o argumento em dezembro do ano passado, logo depois de ser convidado pelo produtor Tomislav Blazic. Mas a história do filme remonta ao início de 2015, quando Blazic começou a negociar com a PF. Segundo o diretor, a instituição foi uma espécie de consultora:
— Foi um intensivo de quase um ano. Entrevistamos delegados, procuradores do Ministério Público, ex-conselheiros da Petrobras, engenheiros de refinaria, gente do mercado financeiro. Tudo para nos cercar de informações, que não necessariamente entraram no roteiro. Mas serviram para contar a história da forma mais responsável possível.
“JAPONÊS DA FEDERAL” NO CAFEZINHO
Além de Roney e Sandra, o elenco conta com nomes como João Baldasserini, Flávia Alessandra, Antonio Calloni, Bruce Gomlevsky, Adélio Lima e Ary Fontoura — a este último coube o papel do ex-presidente Lula. Os atores também passaram por esse laboratório na PF para entender o universo policial. O entrosamento entre equipe e agentes era visível no set: alguns delegados tiravam fotos e faziam vídeos dos bastidores da filmagem. Outros, como o agente Newton Ishii, o “japonês da Federal”, juntaram-se à equipe no cafezinho.
Na sexta, além dos curiosos, algumas poucas pessoas foram ao prédio da PF buscar atendimentos já agendados, mas encontraram os portões fechados, assim como no sábado. Segundo a PF, o expediente já seria interrompido nesses dois dias para manutenção elétrica e pintura. De acordo com a assessoria de imprensa do órgão, esses fechamentos são normais e atendimentos foram reagendados.
Ainda que o filme seja baseado em fatos da Lava-Jato, alguns personagens da ficção, segundo o diretor, são junções de várias pessoas. Bia, papel de Flávia Alessandra, por exemplo, é inspirada na delegada Erika Mialik Marena, “mas também em outras que estiveram na investigação”, frisa Antunez.
— O Ivan não é o Igor (Igor Romário de Paula, coordenador das investigações da Lava-Jato), mas uma mistura de vários delegados — diz o ator Antônio Calloni sobre seu personagem Ivan, um dos protagonistas e narrador da história.
Na trama, Júlio Cesar, fundamentalmente inspirado no delegado Márcio Anselmo, um dos principais nomes da operação, é o seu principal parceiro.
— Ele é culto, pesquisador da área e PHD, mas também é estourado, um personagem visceral e emocional. Quer colocar os culpados na cadeia — conta Gomlevsky, intérprete de Júlio Cesar.
Quase como um mantra, os atores, o diretor e o produtor fazem questão de enfatizar que o filme é “totalmente isento”.
— As pessoas estão mexidas com a Lava-Jato. Uns são a favor e outros contra. Não entramos nesse mérito. É um filme de entretenimento, que fala de um tema político. E ainda não estamos acostumados a falar sobre isso no cinema brasileiro — acredita Antunez.
Com um valor de produção de R$ 13,5 milhões, “Polícia Federal — A lei é para todos” foi financiado inteiramente com recursos de empresas privadas. De acordo com o produtor, Tomislav Blazic, inicialmente, o filme foi registrado junto à Agência Nacional do Cinema (Ancine) para se tentar algum tipo de captação de dinheiro público, por meio de leis de incentivo fiscal para o audiovisual ou editais.
— Mas resolvemos tirar (qualquer tentativa de financiamento) da Ancine em função do tema ser altamente sensível e de depois nos acusarem de usar recursos públicos. Aí mudamos a estratégia — conta Blazic.
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O tema do longa-metragem, o produtor afirma, foi um facilitador para conseguir a verba:
— Tivemos um pool de investidores e conseguimos fechar o valor.
A produção também se preocupou em verificar se as empresas patrocinadoras têm estabelecidas regras de compliance (disciplinas para cumprimento de normas legais e um dos principais mecanismos para evitar a corrupção).
Sobre a estreia do longa nas telas, Blazic acha que ainda é “pretensão” dizer que “Polícia Federal — A lei é para todos” será um blockbuster:
— A gente não faz filme para si, mas para os outros. Queremos ter público. Mas ninguém tem bola de cristal. É uma história interessante que eu acredito que o público vá querer ver.
Antonio Calloni ressalta o caráter de “faz de conta’’ na relação do ator com as produções:
— Tenho uma formação teatral, com muita literatura. Ouvi muito boa música, li muitos bons livros, vi muita boa pintura, mas você tem que esquecer isso e brincar de faz de conta. É como criança mesmo.