segunda-feira, 15 de agosto de 2016

Tragédia em Mariana: orçamento mostra que Brasil não aprendeu com o desastre


Dyelle Menezes - Contas Abertas
Ao que parece, o Brasil não aprendeu com o desastre de Mariana no ano passado, quando a falta de fiscalização em barragens causou o maior desastre natural do país. Agora, além de ter diminuído pela metade a verba para o setor em 2016, apenas um terço dos recursos autorizados em orçamento foram efetivamente utilizados.
06-dm-marianaAo todo, R$ 4,8 milhões foram aprovados no orçamento para fiscalização minerária em 2016. O montante representa 52% a menos de verbas para a ação em relação ao autorizado em 2015, que alcançou R$ 10 milhões. O orçamento ainda poderia ter sido incrementado por emendas parlamentares, porém, os deputados e senadores não realizaram emendas para a iniciativa.
Além da redução, o orçamento previsto praticamente não saiu do papel. Apenas 33% dos recursos autorizados foram utilizados até o dia 8 de agosto deste ano, o que representa cerca de R$ 1,6 milhão. Mesmo o valor empenhado não atingiu níveis elevados: somente R$ 2,7 milhões já foram reservados em orçamento para serem aplicados neste ano.
Os dados levantados pelo Contas Abertas englobam o orçamento previsto no Projeto de Lei Orçamentária Anual de 2016 para a ação “Outorga e Fiscalização Minerária”, que compõe o programa Geologia, Mineração e Transformação Mineral. O nome da iniciativa era “Fiscalização das Atividades Minerárias” em 2015. A alteração ocorreu porque partir deste ano iniciou-se um novo Plano Plurianual do governo federal.
A ação tem o objetivo de fiscalizar, em campo, os trabalhos apresentados durante o processo minerário para autorização da pesquisa e manutenção do direito de prioridade na exploração do patrimônio público e em todas as etapas dos trabalhos de lavra para conhecimento da exploração mineral, objetivando o bom aproveitamento dos recursos.
A fiscalização pode diminuir riscos de desastres como o de Mariana, em Minas Gerais. É objeto da fiscalização a lavra com aproveitamento racional da jazida, riscos de acidentes controlados, controle ambiental da lavra, com disposição de rejeitos e sistema de controle de efluentes da mina, descomissionamento do empreendimento, plano de fechamento de mina atualizado e obrigações previstas no Código de Mineração e na legislação complementar.
Também estão incluídas as fiscalizações em campo da lavra ilegal, a partir da identificação por técnicos da instituição, por denúncias ou por manifestação de órgãos públicos federais, estaduais ou municipais, e a de depósitos fossilíferos, para proteção do patrimônio científico e cultural, contra a extração ilegal.
Sem recursos, os problemas de fiscalização são claros. De acordo com o último Relatório de Segurança de Barragens da Agência Nacional de Águas (ANA), o Brasil deixou de fiscalizar 96% de suas barragens conhecidas entre outubro de 2014 e setembro de 2015. Os dados ainda mostram a falta de estrutura das 43 entidades fiscalizadoras da segurança, que não conseguem dar conta do trabalho nas cinco regiões.
O relatório evidencia que, no período analisado, houve aumento no número de barragens cadastradas. O montante chegou a um total de 17.259 barragens, 15% a mais que as 14.966 do relatório apresentado no ano passado. Desse total, somente 701 foram vistoriadas.
Os dados da ANA incluem quatro tipos de barragens existentes no Brasil: de contenção de resíduos industriais, de uso múltiplo da água, de contenção de rejeitos de mineração e para geração de energia hidrelétrica.
O relatório chega a afirmar que vem crescendo o número de barragens vistoriadas, “mostrando que está sendo dada cada vez mais importância à segurança das barragens por parte das entidades fiscalizadoras”. No entanto, o número de barragens vistoriadas em relação ao total ainda é pequeno, mostrando que muito trabalho deve ser realizado.
Além da falta de inspeção, o relatório também apontou carência de dados sobre as barragens. Das cadastradas, 79% não tinha informações de altura e 45% de volume. Ainda faltam informações sobre os riscos. “Das 17.259 barragens cadastradas, 2.368 foram classificadas por Categoria de Risco e 2.224 quanto ao Dano Potencial Associado, representando, respectivamente, 13% e 12% do total”, diz o relatório.
Mariana
Na tarde do dia 5 de novembro, o rompimento da barragem do Fundão, localizada na cidade histórica de Mariana (MG), foi responsável pelo lançamento no meio ambiente de 34 milhões de m³ de lama, resultantes da produção de minério de ferro pela mineradora Samarco – empresa controlada pela Vale e pela britânica BHP Billiton.
Seiscentos e sessenta e três quilômetros de rios e córregos foram atingidos;1.469 hectares de vegetação, comprometidos; 207 de 251 edificações acabaram soterradas apenas no distrito de Bento Rodrigues. Esses são apenas alguns números do impacto, ainda por ser calculado, do desastre, considerado a maior catástrofe ambiental da história do país.
A enxurrada de rejeitos rapidamente se espalhou pela região, deixou mais de 600 famílias desabrigadas e chegou até os córregos próximos. Em questão de horas, a lama chegou ao rio Doce, cuja bacia é a maior da região Sudeste do País — a área total de 82.646 quilômetros quadrados é equivalente a duas vezes o Estado do Rio de Janeiro.