Dyelle Menezes - Contas Abertas
O Brasil é conhecido por tolerar as chamadas “pequenas corrupções”, como passar no sinal vermelho ou falsificar carteirinha de estudante. Possivelmente contando com esse “jeitinho brasileiro”, os nadadores americanos tenham pensado em inventar a história sobre o roubo no Rio de Janeiro. Porém, o caso pode mostrar um caminho em que a mentira não seja aceita e sim punida no país.

Castello Branco afirma que a educação é fator relevante na formação do indivíduo, mas o Estado tem que estar presente exigindo o cumprimento de normas. “As pessoas reagem em função da educação e do receio da punição”, ressalta.
“No Brasil, por tudo o que certamente já ouviram, os nadadores sentiram-se à vontade para cometer irregularidades e mentir comunicando falso crime ao acusar a Polícia de roubá-los. Felizmente, o comportamento da Polícia e da Justiça foi exemplar, da apuração à punição. Ótimo que o Instituto Reação seja beneficiado com recursos para a formação de novas Rafaelas”, diz.
Mesmo antes de afirmarem que haviam mentido, a própria população americana exigia um pedido de desculpas, o que aconteceu na noite de ontem (18). Em nota oficial assinada pelo CEO Scott Blackmun, o Comitê Olímpico dos Estados Unidos pediu desculpas formais pela polêmica envolvendo os nadadores Ryan Lochte, Gunnar Bentz, Jack Conger e James Feigen.
“Em nome do Comitê Olímpico dos Estados Unidos, pedimos desculpas aos nossos anfitriões no Rio e aos brasileiros pelo problema causado durante o que deveria ser apenas a celebração da excelência – diz um trecho da carta do Comitê Olímpico americano, que não descartou punições aos atletas”, explicou.
Os dois nadadores que negaram a versão do assalto e receberam de volta os passaportes com a autorização de deixar o país chegaram à Miami hoje (19). No depoimento para a polícia brasileira, Jimmy Conger e Gunnar Bentz confirmaram terem inventado a história e detalharam a briga com a segurança de um posto de gasolina após um dos quatro esportistas envolvidos vandalizar o local.
Na noite de quarta-feira, Conger e Bentz foram retirados de um avião que partiria a Houston. A polícia encontrou contradições nos depoimentos dos atletas sobre o roubo, que teria ocorrido depois de uma noitada no Club France, na Gávea.
O mais conhecido do nadadores, Ryan Lochte, já havia voltado para casa. Outro nadador, no entanto, continua no Brasil. Jimmy Feigen espera ter liberado o passaporte, entregue à polícia após uma determinação judicial proibir os atletas de deixarem o país.
Indiciado por falsa comunicação de crime, assim como Lochte, Feigen firmou acordo com a Justiça brasileira de pagar R$ 35 mil, revertidos ao Instituto Reação. Em contrapartida, receberá o documento e terá o processo arquivado.
Entenda o caso
Conforme informações do site GloboEsporte.com, primeiramente, Ryan Lochte afirmou ter sido assaltado depois de uma festa na Casa da França, na Lagoa, Zona Sul do Rio, na madrugada do domingo. O atleta disse que estava num táxi com os outros três atletas dos Estados Unidos quando foi abordado por bandidos armados portando distintivos falsos. James Feigen, no entanto, contou à Polícia que o homem que rendeu o táxi estava em um veículo branco antigo.
Lochte prestou depoimento no domingo à noite na Delegacia de Atendimento ao Turista (Deat), no Leblon. O atleta repetiu a versão que Feigen havia contado à polícia e disse que estava bêbado e não lembra detalhes do assalto – só os dois prestaram depoimento.
Os agentes passaram a procurar o taxista que teria levado os nadadores da Lagoa à Vila Olímpica. A polícia teve acesso às imagens do posto de gasolina, onde eles pegaram o táxi, e buscou registros de câmeras de segurança que ficam no trajeto.
Imagens da chegada dos americanos à Vila Olímpica, feitas pelas câmeras de segurança no início da manhã do dia em que o roubo teria acontecido, ajudaram a alimentar dúvidas.
Divulgadas com exclusividade pelo Daily Mail, elas mostram Lochte, Bentz, Conger e Feigen muito calmos depois do acontecido, segundo análises. Em seguida, o apresentador Matt Lauer, da rede de televisão americana NBC, revelou uma conversa que teve por telefone com Lochte. Segundo o jornalista, o atleta contou uma versão diferente daquela que passou em depoimento aos policiais brasileiros, mudando dois detalhes
O âncora afirmou que Lochte foi firme ao confirmar que o roubo ocorreu, negando que ele e os outros três tivessem inventado a história para encobrir um erro de comportamento. Lauer disse que o nadador contou que o táxi foi abordado por criminosos num posto de gasolina, o que foi de encontro à versão original de que os quatro teriam sido vítimas de uma falsa blitz. Lochte teria dito também que um dos criminosos não encostou o cano de um revólver em sua cabeça, mais precisamente na testa, mas que teria apenas apontado em sua direção.
Com Lochte já de volta aos Estados Unidos, na quarta-feira os outros nadadores envolvidos no caso foram impedidos de embarcar para o país. Bentz e Conger se calaram ao serem levados à delegacia do aeroporto internacional Tom Jobim para prestar depoimento – os dois foram retirados do avião, momentos antes da decolagem, por policiais civis e agentes da Polícia Federal. Após quase quatro horas na delegacia, foram liberados no início da madrugada de quinta, por volta de 1h20, e se hospedaram num hotel próximo ao Galeão. Conforme as investigações prosseguiram, os atletas confirmaram que não houve roubo.
Aos 32 anos, Ryan Lochte é considerado um dos maiores atletas olímpicos de todos os tempos. Ele, no entanto, teve participação discreta na Rio 2016. Mas com o ouro do revezamento 4x200m livre – com Bentz e Conger na equipe –, alcançou sua 12ª medalha nos Jogos, tornando-se o segundo nadador com mais pódios na história. Feigen fez parte do time americano que disputou o revezamento 4x100m livre e também levou medalha de ouro.