Ninguém declarou ainda, talvez por pena, mas o principal derrotado com o avanço do impeachment é Lula. Se o Senado ratificar a decisão da Câmara, mandando a presidente para casa mais cedo, Dilma fará as malas, avisará aos netos que está voltando para Porto Alegre e emitirá um aviso aos repórteres: “Vocês não terão mais Dilma Rousseff para chutar.” Lula não pode se dar ao luxo de sair de cena. Terá de se reinventar sem descer do palco. E com a Lava Jato a lhe roçar os calcanhares de vidro.
Depois de passar à história como primeiro presidente a fazer a sucessora duas vezes, Lula reescreve o verbete da enciclopédia como o único mandatário que é desfeito pela própria criatura. Dilma ajudou bastante, mas é Lula o principal responsável pelo desastre. Primeiro porque o petrolão, espécie de mensalão hipertrofiado, foi urdido na gestão dele. Segundo porque o fiasco econômico que estilhaça a presidência de Dilma é decorrência natural do mito da supergerente, um conto do vigário de Lula em que a maioria dos brasileiros caiu.
A reivenção de Lula será um triste espetáculo. Já estava habituado a derrotas. Perdeu três eleições presidenciais. E sempre levantou, sacudiu o pó e seguiu adiante. Mas dessa vez é diferente. Lula caiu do alto de sua empáfia. Por enquanto, comporta-se como o sujeito que, tendo despencado de um edifício de dez andares, ao passar pelo quarto piso, exclama: “Até aqui tudo bem.”
Quando notar que o chão se aproxima com a velocidade de um raio, Lula iniciará a fase da negação. Repetirá em público o que diz em privado desde o início do segundo reinado de madame: 1) “Dilma não ouve o que eu digo”; 2) “Quando ouve não faz.” As frases são injustas e inúteis. São injustas porque Dilma nunca escondeu a devoção que dedica ao criador. São inúteis porque, depois que Dilma terceirizou sua gestão ao criador, qualquer criança de cinco anos sabe que Lula enxerga no espelho a imagem de um culpado.
Ele chegou a esta condição por seus próprios deméritos. Por dois mandatos, abasteceu sua base congressual de propinas. O mensalão secou antes que a cúpula do PT fosse para a cadeia. Mas havia um insuspeitado petrolão. Deflagrada sob Dilma, a Lava Jato emparedou os corruptos. E mandou para cadeia os corruptores. A jazida mixou. Deu-se, então, o previsível: a interrupção do fornecimento regular de propinas converteu aliados em traidores.
Há na Câmara 102 deputados filiados a partidos de oposição. O impedimento de madame foi aprovado por uma massa de impressionantes 367 votos. Nessa conta há 265 silvérios. Quer dizer: os governos financiaram o que agora chamam de “golpe''. Dilma foi picada pelas serpentes “golpistas” que os esquemas da era Lula engordaram. A mais venenosa chama-se Eduardo Cunha.