quarta-feira, 7 de outubro de 2015

"Quem quer ser um bilionário?", por Alexandre Schwartsman

Folha de São Paulo


Segundo dados do Banco Central, as perdas associadas às vendas de dólares no mercado futuro (swaps) atingiram quase R$ 110 bilhões nos 12 meses terminados em agosto e devem subir ainda mais quando os números de setembro forem contabilizados.

Como as perdas são adicionadas à conta de juros (assim como os ganhos seriam dela subtraídos), essa atingiu 8,5% do PIB no período; não fossem, portanto, os swaps, ela teria ficado em 6,5% do PIB.

O BC argumenta, porém, que há uma assimetria: as perdas com os swaps são contabilizadas, mas não os ganhos com as reservas. Como estas últimas se encontram ao redor de US$ 370 bilhões contra pouco mais de US$ 100 bilhões em swaps, os ganhos com reservas superam por larga margem as perdas e, no balanço final, haveria lucro, não prejuízo.

Do ponto de vista contábil, o BC pode até estar certo, mas não se encararmos a operação como se deve, isto é, da perspectiva econômica, focada na avaliação da política de intervenção do BC de 2013 para cá.

O que foi à época justificado como medida para moderar a volatilidade causada pelos sinais de uma possível alteração na política monetária americana sobreviveu em muito àquele fenômeno.

De meados de 2013 ao início de 2015, o BC vendeu US$ 114 bilhões no mercado futuro, numa tentativa clara (e frustrada) de impedir a depreciação do real face ao dólar, e assim tentar conter a inflação, como instrumento substituto para a política monetária.

Tivesse, portanto, o BC se abstido da intervenção (ou fizesse realmente uma política pontual, para moderar de fato a volatilidade), ele continuaria obtendo ganhos sobre as reservas (mesmo que não sejam diretamente contabilizados), mas não teria realizado o prejuízo com os swaps.

A análise da política adotada em 2013, venda sem limites de dólares futuros, sugere que esta causou a perda acima registrada. Ao BC caberia argumentar que talvez tenha evitado perdas em outras frentes econômicas (é duvidoso, porém, ao menos, intelectualmente plausível), mas jamais apontar para o ganho sobre as reservas como desculpa. Isso equivale a vender um terço de uma fazenda antes do preço dela subir e argumentar que o ganho dos dois terços restantes compensaria a perda...

Não se trata de uma discussão à toa. A desvalorização recente do real tem motivado novos pedidos de intervenção por parte do BC, usando agora as reservas internacionais, e não mais apenas por meio dos swaps.

Ocorre que o encarecimento do dólar não se dá no vácuo. Entre o final de agosto, pouco antes da divulgação desastrada do orçamento deficitário para 2016, e o final de setembro, o risco-país (o tanto a mais de juros que o devedor de má reputação tem que pagar relativamente ao melhor devedor) se encontrava na casa de 3% ao ano. De lá para cá subiu para 5% ao ano, níveis que havíamos visto pela última vez no terceiro trimestre de 2004 (à parte um breve período durante a crise internacional de 2008).

Esse, dentre os vários fatores que têm impulsionado a escalada do dólar, parece ser atualmente o principal, fenômeno reconhecido inclusive pelo BC.

Nesse contexto, a intervenção do BC será incapaz de evitar, exceto por breve período, a perda de valor da moeda, gerando novos prejuízos à frente. Parece que a lição de 2013-2014 ainda não foi aprendida.