quinta-feira, 3 de setembro de 2015

Delação é para entregar líderes - tipo Lula, Dilma, Renan? - e não personagens menores, diz ministra do STJ

Eduardo Bresciani - O Globo

Maria Thereza de Assis Moura fez palestra sobre tema em seminário sobre lavagem de dinheiro



Ministra do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Maria Thereza de Assis Moura - Divulgação


A ministra do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Maria Thereza de Assis Moura afirmou que o instrumento da delação premiada deve ser utilizado para buscar descobrir líderes de organizações criminosas e não para que chefes entreguem personagens menores. Ela fez uma palestra sobre o tema no Seminário Internacional de Combate à Lavagem de Dinheiro e ao Crime Organizado, realizado pelo STJ nesta quinta-feira.

– Há de se fazer uma advertência. A delação não pode ser banalizada. Como já disse o ministro Gilson Dipp, ela não foi feita para furto de galinha. Deve se valer dela para crimes graves – ressaltou a ministra.

– Ouvi dizer outro dia de uma pessoa ligada ao tráfico de entorpecentes que seria o chefe e queria fazer a delação do mula. O estilo da lei é que lideres sejam entregues pelas outras pessoas. Caso contrário, isso não deverá ser levado em consideração – complementou.
Maria Thereza fez um histórico sobre a possibilidade de benefícios para colaboradores e ressaltou que desde as Ordenações Filipinas, utilizadas nos primeiros séculos de existência do Brasil, já havia benefício para quem colaborasse. Ela observou que com a revogação da legislação citada em 1830 somente em 1990 voltou-se a prever na legislação nacional benefícios a delatores. Destacou que, inicialmente, se previa a utilização apenas para alguns crimes, como formação de quadrilha, crimes financeiros e os previstos na lei antidrogas. Com a lei de proteção à testemunha, em 1999, o Judiciário passou a entender que os benefícios poderiam ser estendidos a outros crimes. Prática que se consolidou com a lei de 2013, de organizações criminosas, que pela primeira vez estabeleceu regras claras para utilização desse instituto.


– A lei deixa claro que não pode a delação ser fruto de coação, seja física ou cívica, ou promessa de vantagens ilegais – afirmou.

Ela destacou que a questão de a necessidade de que a delação seja voluntária não impede que seja realizada por pessoas presas, desde que a prisão tenha sido justificada. Por isso, na visão dela, é preciso analisar cada caso.

A ministra ressaltou que cabe ao juiz que homologará cada delação verificar as particularidades de cada contrato. Ressaltou que na Lava-Jato o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Teori Zavascki, por exemplo, já declarou nulo um artigo que impedia o relator de recorrer de condenações. Maria Thereza observou ainda que o intuito da delação, bem como dos acordos de leniência, é dar benefícios para quem dá colaboração eficaz para uma investigação. A ministra apontou que o instituto foi utilizado poucas vezes no país e que haverá ainda muito para “aperfeiçoar”.

SECRETÁRIO DE JUSTIÇA VÊ AVANÇOS

A primeira palestra do dia no seminário foi do secretário nacional de Justiça, Beto Vasconcelos, do ministério da Justiça. Ele defendeu a Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro (Encla) e afirmou que houve avanços no enfrentamento do tema nos últimos anos.

– O estado brasileiro passa por fortalecimento institucional inequívoco – disse Vasconcelos.
Ele destacou medidas que aumentaram a transparência da administração pública, como o Portal da Transparência e a Lei de Acesso à Informação, o fortalecimento de instituições do Ministério Público e da Polícia Federal e diversas mudanças legislativas, como as leis de organização criminosa e anticorrupção, como ações nos últimos anos que fizeram o estado brasileiro avançar no combate à corrupção e à lavagem de dinheiro. Afirmou que o desafio é seguir criando novos instrumentos para melhorar os controles públicos e privados em consonância com a evolução tecnológica.

– Transparência, transparência, transparência. Nada mais eficaz que abrir o estado e permitir à sociedade o controle mútuo da sua atuação. Compliance, compliance e compliance. Permitir controles da integridade dos setores público e privado. Tecnologia, tecnologia e tecnologia. Não podemos ficar reféns de procedimentos do século passado. Temos de enfrentar desafios novos para acompanhar a modernização de procedimentos – afirmou o secretário.