Lucianne Carneiro / Marcello Corrêa - O Globo
Período foi de altos e baixos para o setor. Em junho, recuo foi de 1,4%, o maior desde dezembro
indústria brasileira acumula uma perda de 6,5% de sua produção entre outubro de 2013 e junho, segundo dados divulgados pelo IBGE nesta sexta-feira. São nove meses de altos e baixos da atividade industrial, sendo os últimos quatro marcados por quedas seguidas, que levaram a indústria a encerrar junho em patamar 7,5% inferior ao maior já registrado, em junho de 2013. A atividade registrou ainda forte desaceleração na passagem entre o primeiro e o segundo trimestre, com queda de 2%. Em junho, a queda foi de 1,4% em relação ao mês anterior, na série com ajuste sazonal.— O setor industrial vem mostrando menor dinamismo, não só nos últimos quatro meses, mas desde outubro — explica o gerente de Coordenação de Indústria do IBGE, André Macedo.
Na comparação com igual período do ano passado, a indústria recuou 5,4% na comparação com igual período de 2013. No primeiro semestre, essa queda foi de 2,6%, também frente a igual período do ano passado.
O desempenho da indústria em junho, segundo Macedo, foi marcado por resultados negativos nas diferentes bases de comparação, frente a maio, a junho de 2013, e nos resultados acumulados no ano e em doze meses.
— O mês de junho foi caracterizado por perda de intensidade da atividade industrial, sob qualquer olhar que se faça sobre a pesquisa. Há um perfil disseminado de taxas negativas, com claro destaque de bens de capital e bens de consumo duráveis — diz.
COPA INTENSIFICA DIFICULDADES
A Copa do Mundo teve influência no mês de junho, diante do menor número de dias úteis por causa de feriados em função dos jogos, e também da redução de horas trabalhadas. Macedo esclarece, no entanto, que o campeonato apenas potencializou um desempenho que já vinha sendo registrado pela indústria:
— São quatro meses de resultado negativo, mas é claro que a magnitude da queda (-1,4%) tem relação com a Copa do Mundo, mas há influência de todos aqueles fatores que vem pontuando a indústria como baixo nível de confiança do empresariado, nível de estoques acima do usual, evolução menor da demanda doméstica, cenário adverso no exterior, entrada de produtos importados e maior restrição na concessão de crédito — afirma Macedo.

CONTRAÇÃO PODE SER REVERTIDA
Para o economista Aloísio Campelo, professor da Fundação Getulio Vargas (FGV), o chamado efeito calendário intensificou o resultado, mas uma queda para o mês já era esperada. Entre analistas do mercado financeiro, as previsões eram ainda mais pessimistas, de quedas de 2,25% frente a maio, e 7,65%, na comparação com junho do ano passado.
— O desempenho seria ruim de qualquer forma. Mas a intensidade tem um pouco de efeito calendário, sim — diz o especialista, acrescentando que a forte queda, que levou a base de comparação para baixo em junho, pode resultar em um número melhor no mês que vem. — O efeito de dias úteis pode gerar algum aumento de produção, mas bastante limitado. Acredito que o efeito líquido pode continuar no terreno negativo.
Em nota, o economista Octavio de Barros, diretor de pesquisas e estudos econômicos do Bradesco, destacou o desempenho fraco dos bens de capital — indicador do nível de investimento — que acumula perdas de 17,9% nos últimos quatro meses. Na comparação com junho de 2013, a queda foi de 21,1%. Apesar dos dados negativos, ele acredita em uma recuperação no proximo mês.
“De modo geral, esse resultado, além de confirmar o desempenho bastante moderado da indústria já antecipado por diversos indicadores setoriais, sugere retração dos investimentos no segundo trimestre. Para julho, por ora, considerando os antecedentes já conhecidos, esperamos que o desempenho da produção industrial fique entre estabilidade a uma leve alta de 0,5%”, afirmou.
A LCA, em comunicado, também espera uma influência positiva do efeito calendário, não só em julho, mas em todo o segundo semestre. No entanto, a consultoria não revisou a projeção para a produção industrial neste ano: continua a prever queda de 1,2%, em linha com a expectativa indicada no boletim Focus, do Banco Central, que compila cerca de 100 análises de economistas do mercado financeiro.
“O desempenho da indústria geral não será pior em decorrência do setor extrativo: esperamos crescimento relevante tanto da extração de minério de ferro como da produção de petróleo e gás natural. A maior quantidade de dias úteis no segundo semestre (inclusive cessados os efeitos negativos da Copa do Mundo sobre essa variável) também deverá ajudar a conter a queda de indústria no ano”, avaliou.
VEÍCULOS AUTOMOTORES EM FORTE QUEDA
O IBGE destacou o predomínio de taxas negativas na passagem entre maio e junho, que se viu nas quatro categorias de uso e em 18 dos 24 ramos da indústria pesquisados. O segmento de veículos automotores segue como umas das principais influências para o desempenho da indústria como um todo. Na comparação com maio, a queda do segmento foi de 12,1%, a mais intensa desde dezembro de 2013. Frente a junho do ano passado, o tombo foi de 36,3%. No período entre outubro e junho, a perda acumulada foi de 33,1%. A indústria de veículos automotores acumula recuo de 22,2% em quatro meses.
— O movimento de queda em veículos automotores passa das perdas de caminhões e ônibus, mas atinge de peças e outros insumos. Cerca de 80% dos produtos investigados no ramo de veículos automotores têm taxas negativas — diz.
Houve impacto também de equipamentos de informática, eletrônicos e ópticos, com um tombo de 29,6%, e de máquinas e equipamentos, de 9,4%.
BENS DURÁVEIS: PIOR QUEDA DA SÉRIE HISTÓRICA
Entre as categorias de uso, a indústria de bens de capital — que é um dos principais indicadores de investimento — registrou queda de 9,7%, a mais intensa desde dezembro de 2013. Já os bens de consumo duráveis caíram 24,9%, a maior da série histórica iniciada em 2002, ao lado de recuo de 7,9% de bens de consumo e de 1,3% em bens de consumo semiduráveis e não duráveis.
— A despeito das vendas de televisores, os outros duráveis puxados por automóveis tiveram um desempenho péssimo. Esses movimentos foram atenuados por um desempenho bom dos não duráveis. Alimentos e bebidas não sofreu muito com a Copa, pois é um setor que não sofre tanto com juros mais altos. São bens essenciais — destaca Campelo, da FGV.
Para ele, o setor deve continuar em terreno negativo, pelo menos até depois das eleições, quando a política econômica deve ficar mais clara, indepedentemente do resultado. O economista afirmou, ainda, que os pacotes de incentivo liberados recentemente pelo governo devem ter pouco efeito, enquanto a confiança não melhorar:
— Nesse momento, o efeito é limitado. O incentivo vai ter uma influência no momento em que a economia apontar para algum crescimento.
O economista Alexandre Espírito Santo, da Simplific Pavarini e professor do Ibmec, acrescenta que o modelo de consumo está esgotado e prevê um efeito apenas "marginal" das medidas de incentivo:
— O efeito é marginal, muito pequeno. Está na hora de mudar a orientação da política macroeconômica.