Ex-funcionários da Casa Branca descrevem ambiente infeliz, competitivo e obcecado com a perfeição no gabinete da primeira-dama americana
O Globo
Com agências internacionais

WASHINGTON — O presidente dos Estados Unidos é conhecido popularmente como “o líder do mundo livre”, mas trabalhar para a primeira-dama pode ser uma tarefa mais difícil. De acordo com um artigo publicado na segunda-feira na revista “The New Republic”, o gabinete de Michelle Obama, na ala leste da Casa Branca, é um “limitado, frustrante e até mesmo detestável local de trabalho, no qual a inveja e o descontentamento se multiplicam, enquanto os funcionários se digladiam pela divisão de responsabilidades e pela atenção da primeira-dama”.
De acordo com Reid Cherlin, ex-membro da equipe de comunicação da Casa Branca, a chegada de Michelle a Washington foi marcada pela cautela, com a primeira-dama evitando atrapalhar os planos do presidente.
- Não precisamos fazer nada - ela teria dito à sua equipe logo após a posse de Obama. - Portanto tudo o que fizermos deverá ser bem feito - concluiu.
O que a princípio parecia uma orientação para que erros da campanha eleitoral não fossem repetidos rapidamente se mostrou um sinal da rigidez e da obsessão com a perfeição que a primeira-dama impõe aos membros de sua equipe. “Não faça se não for perfeito” se tornou o mantra do gabinete da primeira-dama, que deixou claro para todos ao seu redor que seu tempo era muito valioso e que, para conseguir a atenção da chefe, os pedidos teriam que vir acompanhados de objetivos claros e metas concretas. Não demorou muito para que uma visita à sala da primeira-dama se tornasse a medida do sucesso dentro do gabinete.
— Todos estavam tentando atrair a atenção dela de alguma forma, e isso se tornou uma busca pelo reconhecimento de que você fazia parte dessa equipe, e que ela sabia quem você era — afirmou um ex-funcionário do gabinete. — Eles não queriam trabalhar para ela. Queriam ser seus amigos.
Uma primeira-dama detalhista e minuciosa
A dificuldade de acesso não era o único empecilho para os funcionários. Acostumada aos detalhes minuciosos do direito, a primeira-dama não compartilha o talento de seu marido para a improvisação e as decisões rápidas. A obsessão pela perfeição também não via distinções entre os erros da equipe. A escolha de uma saia errada numa segunda-feira poderia ter o mesmo peso e ser considerado um erro tão grande como revelar detalhes sem querer à imprensa, ou uma iniciativa política fracassada.
Todos os eventos planejados deveriam render uma cobertura positiva, e todos os ângulos imagináveis deveriam ser minuciosamente planejados e estudados. Funcionários de ambas as alas da Casa Branca reconhecem que os discursos da primeira-dama eram preparados com semanas de antecipação, algo raro no caótico ambiente político.
Kristina Schake, uma das ex-funcionárias de equipe de Michelle Obama, conseguiu destaque ao unir a primeira-dama a celebridades como forma de divulgar os programas como o Let’s Move, que combate a obesidade infantil, e conquistou a atenção de outros setores, recebendo uma oferta para uma vaga no gabinete de comunicação da Casa Branca. No entanto, a dúvida se Schake tinha a permissão da primeira-dama para discutir uma mudança de emprego foi suficiente para que a proposta fosse abandonada. No mundo corporativo, empregados podem analisar propostas e buscar promoções, mas no gabinete de Michelle Obama, isso representou uma violação de sua confiança. Schake deixou a Casa Branca em junho de 2013.
Poucos foram os que conseguiram fazer parte do círculo de intimidade de Michelle. Segundo Cherlin, a primeira-dama prefere se cercar de assistentes que conhece há bastante tempo e com que já tem uma forte ligação.
— Ela é o tipo de pessoa capaz de fazer com que você se sinta amado caso a conheça há bastante tempo — conta um ex-funcionário da Casa Branca. — Mas é muito difícil no início.