sexta-feira, 31 de maio de 2024

Paulo Polzonoff: Janja está preocupada com a queda de popularidade de Lula

 

Primeira dama do PT, Janja: “Estou preocupada”.| Foto: Cláudio Kbene/PR


— Benhê!


— ...


— Benhê!


— ...


— Benhêêêêêêêêêêêê!!!!!— esbraveja Janja. Até que Lula, distraído que estava com o aspirador e uns delírios de grandeza, finalmente ouve. Ele se vira e a encontra numa poltrona Fauteuil aux Dragons que, no entanto, não pertence ao casal nem ao patrimônio da União. É de um amigo.


— O que foi, amor da minha vida? — pergunta ele todo meloso ao ver que a primeira-dama faz biquinho.


— É que eu tava aqui conversando com a Dani e... tô preocupada, mô.


— Mas por que isso agora? Tá tudo tão bem! Olhe ao seu redor. Você mora num palácio. Abra seu guarda-roupas. Você tem tudo e mais um pouco. Leia os jornais. Assista ao que dizem as tuas amigas. Nunca antes na história deste país um presidente e sua primeira-dama foram tão amados!


— Eu sei. Mas a imprensa é uma coisa e o povo é outra coisa — tenta Janja, num raro momento de bom senso. — Além disso.... — Janja hesita em revelar ao maridão que essa realidade da imprensa aí nem sempre é a realidade real. “Já sei!”, pensa ela e seus neurônios celebram a ideia genial. Ou seria janjeal? — Além disso, hoje eu vi uma fake news...


— Onde? Como? Quando? Chame já o Alexandre! Chame já o Bessias! Convoque o Noblat! Ligue pra Natuza! Vamos dar um jeito nesses fascistas de extrema-direita agora mesmo!


— Não, amor. Calma. Não é motivo pra tanto. Toma aqui seu remedinho pra pressão. —Lula toma o remédio e Janja continua: — Vi uma fake news que dizia que a sua popularidade tá em queda. Que tem mais gente desaprovando do que aprovando o seu governo. Que tem gente que acha que você é...


— Desembucha, Janja! Pode dizer sem medo. Eu já passei por muita coisa nesta vida. Já ouvi o Randolfe Rodrigues cantando Bee Gees. Já comi o pão que a Marilena Chauí amassou. Já tive aula de estatística com o Pochmann e de economia com o Galípolo. Já fiquei preso 580 dias naquela pocilga em Curitiba. Eu aguento, Janja.


— Já tem gente achando que você é pior do que o Bolsonaro. — Lula arregala os olhos como se fosse ter uma síncope. Mas, antes que ele possa entoar a velha ladainha de “nunca antes neste país”, “a zelite”, “picanha & cervejinha” e “graças a mim o pobre está andando de avião”, Janja emenda: — E eu tô preocupada, com medo de que isso respingue na minha imagem. Eu não quero entrar para a história como uma primeira-dama pior do que a Michele.


Lula se lembra da Michele, do sorriso da Michele, da voz da Michele, da elegância da Michele. Ele abre a boca para elogiar a ex-primeira-dama, mas se contém. Ufa! Essa foi por pouco mesmo.


— Mas e o resgate do cavalo?


— Não adianta nada eu resgatar um pangaré daqueles se você resolve cobrar imposto de quem compra brusinha na Shein! — ralha ela. E quem irá dizer que Janja não tem razão? Não há Viagra político capaz de levantar a popularidade de Lula. Se até o Jean Wyllys já pulou fora dessa canoa furada! Ops. Deixa eu colocar esse argumento na boca da Janja. Vamos ver o que o Lula responde: — Lula, até o Jean Wyllys já tá pulando fora e defendendo o voto na Tebet.


— Aquele... Aquele... Aquele... Aquele campeão do Big Brother! — diz Lula, quase matando meu editor do coração agora.


— Não adianta nada eu usar minhas melhores roupas e o Ricardo Stuckert focar no meu melhor ângulo e a gente sair por aí pegando criança ranhenta no colo se o seu governo tem um rombo fiscal pior do que o da pandemia. Se você veta a proibição das saidinhas. Se você... Ah, vamos falar o português claro, Lula. Se você só faz M!


— Não era o L?


— Engraçadinho. Não é hora de fazer piada, Lula. É a minha imagem que está em jogo aqui. A gente precisa fazer alguma coisa! — diz Janja, algumas oitavas acima do aceitável.


Ao sentir aquela estridência vocal a lhe ferir os tímpanos presidenciais, Lula tem um calafrio e, com ele, uma epifania. O velho barba abre o sorrisão malandro, aquele que até a recepcionista da Odebrecht conhece bem, e se deixa jogar no sofá novinho em folha. É, aquele de R$ 65 mil.


— Não se preocupe com isso, Janja. Não se preocupe com nada disso. Aliás, vem aqui do meu lado, vem.


— Como assim, homem?! Tá gagá?! Imagine se você perde a eleição! Imagine a vergonha! O que é que as minhas amigas vão dizer?! — pergunta e exclama em sequência Janja, um tiquinho descontrolada.


— Não se preocupe. Não tem o menor perigo de nada disso acontecer.


Janja fica ali pensando, subitamente admirada com o sorriso velho e autoritariamente arrogante de Lula. Foi por esse homem que ela se apaixonou quando ele ainda estava na cadeia, preso por corrupção e lavagem de dinheiro. Até que ela entende. Mesmo assim Lula faz questão de explicar bem explicadinho, como se Janja fosse uma socióloga de 57 anos.


— A gente tem a imprensa ao nosso lado. A gente tem o STF ao nosso lado. A gente tem o TSE ao nosso lado. Não há nenhum motivo pra você se preocupar, Janja. Só um milagre tira a gente do poder. Agora vem cá ler a Gazeta do Povo comigo, vem.


— O Popov já publicou a coluna de hoje? — pergunta Janja. — Adoro quando ele reproduz os nossos diálogos. Rio muito.


(O colunista agradece a preferência).


— Ele é bom, mas eu não entendo direito ironia. Prefiro as Frases da Semana. Aqui, ó — diz ele, entregando o celular a Janja. — Lê pra mim, Rô. Você sabe que tenho dificuldade...


Ela se senta ao lado dele, pega o celular, entra nas Frases da Semana e, de cara, dá uma risadinha. Mas, na hora de ler em voz alta, desiste, franze a testa e fica toda brabinha novamente.


— Tô chateada, Lula.


— O que foi desta vez?


— Você gosta mais do Hamas do que de mim... — começa Janja.


— Assim, do nada? Vish! — diz Lula. Ele sabe que está encrencado.



Paulo Polzonoff, Gazeta do Povo