domingo, 14 de abril de 2024

Agro acelera emprego e alimenta “boom” imobiliário no interior do país

 

Parque Vaca Brava, em Goiânia: força do agronegócio estimula setor imobiliário e cidade tem a segunda maior valorização de imóveis residenciais.| Foto: Flávio José Pantera/Pixabay.


O interior do Brasil passa por um vigoroso crescimento econômico nos últimos anos. O movimento é liderado principalmente pelo agronegócio, que acelera a geração de empregos e vem alimentando um boom imobiliário em cidades do Centro-Oeste e de outras regiões, como o Triângulo Mineiro.

Segundo dados preliminares do Banco do Brasil, o PIB de Mato Grosso cresceu 10,6% no ano passado. Outros estados com forte atividade agrícola superaram o desempenho nacional. Enquanto a economia brasileira registrou expansão de 2,9% em 2023, Mato Grosso do Sul avançou 8,2%, Tocantins cresceu 11,1% e Goiás, 5,7%.

O PIB “atrás da porteira” teve um aumento de 15,1% no ano passado, a maior expansão para a atividade na série histórica do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), iniciada em 1996. O crescimento foi impulsionado pela safra recorde do ciclo 2022/3, que atingiu 319,8 milhões de toneladas, segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab).

Houve também um aumento na produção pecuária e de laticínios e no volume de abates. Os abates de bovinos aumentaram 11,7% em tonelagem no ano passado; os de suínos, 2,2% e os de frangos, 3,5%. “Esses fatores impulsionaram a demanda por insumos e agrosserviços”, destacam analistas do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada da Universidade de São Paulo (Cepea/Esalq-USP).

Apesar da queda nos últimos dois anos, devido à retração nos preços das commodities, o PIB do agronegócio – que reúne a atividade econômica dentro e fora da porteira – acumula aumento de 29,2% desde 2018. No mesmo período, o PIB brasileiro avançou menos de um terço disso: 8,7%.


Mercado de trabalho está aquecido nas regiões onde o agro é forte

Outros indicadores também retratam o bom momento do interior do Brasil. Desde a pandemia, a taxa de desemprego vem caindo fortemente no Centro-Oeste. Ela era de 9,5% no quarto trimestre de 2019, chegou a 12,9% no terceiro trimestre de 2020 e no fim do ano passado tinha caído para 5,8%. No mesmo período, a taxa brasileira era de 7,4%.

O mercado de trabalho da região vem crescendo mais que no restante do país. Dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Novo Caged) mostram que entre fevereiro de 2020 e 2024, o número de trabalhadores empregados com carteira assinada cresceu 20,5% no Centro-Oeste, chegando a 4,1 milhões de pessoas. No Brasil, o aumento foi menor, de 15,6%.

Segundo Carlos Ornellas, sócio da Exec, consultoria focada na seleção de altos executivos e conselheiros, uma das necessidades do interior do Brasil é a mão de obra especializada. “Novos investimentos estão chegando à região e será necessário mais gente”, diz.

A Suzano deve colocar em operação até junho uma fábrica de celulose em Ribas do Rio Pardo (MS) que recebeu R$ 22,2 bilhões em investimentos e empregará 3 mil pessoas. A chilena Arauco, que atua no mesmo segmento, recebeu em janeiro a licença para construir uma fábrica de celulose e uma termelétrica em Inocência (MS). Serão aplicados R$ 28 bilhões. A previsão é empregar 12 mil pessoas durante a construção. A previsão é de que a primeira fase esteja pronta em 2028 e a segunda, em 2032.

Segundo Ornellas, o Centro-oeste é a “bola da vez” na economia brasileira e tão cedo não deixarão de existir grandes investimentos em áreas diversas ligadas ao agronegócio e à energia. “Há uma carência de lideranças e as empresas estão estruturando pacotes de benefícios atrair talentos”, afirma.

O problema é mais complexo em regiões mais carentes de infraestrutura, como o norte de Mato Grosso e partes do norte de Goiás, onde há pouca disponibilidade de aeroportos de maior porte. “O Centro-Oeste é amplo e muitas regiões têm acesso complicado”, destaca Ornellas.


Dinheiro do agronegócio irriga mercado imobiliário das cidades

Um dos segmentos que mais se beneficia dos bom momento do agronegócio é o imobiliário. Cidades do interior do país têm registrado um "boom".

“O Centro-Oeste tem atraído populações de outras áreas do Brasil, em busca de oportunidades de emprego, muitas vezes vinculadas ao agronegócio e a setores correlatos. Isso aumenta a demanda por habitação, contribuindo para a elevação dos preços dos imóveis”, destaca o coordenador do índice FipeZap, Alison Oliveira.

A população da região cresceu a um ritmo mais de duas vezes superior ao do país entre os últimos dois censos, realizados pelo IBGE em 2010 e 2022. A taxa média anual de aumento da população foi de 1,24% ao ano na região, enquanto no país foi de 0,52%.

Nas capitais dos estados, o crescimento populacional também foi acima do nacional. “Isto também contribui para o aumento da demanda por moradia”, diz Oliveira.

Goiânia registrou, nos 12 meses encerrados em março, a segunda maior valorização no preço dos imóveis entre as capitais dos estados: 13,9%, de acordo com o FipeZap. À frente está Maceio (AL).

O crescimento foi puxado pelos imóveis com três e quatro quartos, que se valorizaram respectivamente 16,7% e 24,6% no período. A locação de imóveis também registrou forte valorização nos últimos 12 meses: 31%.

“Goiânia é um mercado muito bom e conta com uma vantagem: o baixo custo do metro quadrado”, diz Renato Tadeu Leal, sócio e diretor de operações da Séren Incorporadora, especializada em edifícios de alto padrão. O preço médio do metro quadrado para venda era de R$ 7.340 em março, equivalente ao de uma cidade como Fortaleza, aponta o FipeZap.

Outro fator favorável, segundo ele, é a localização estratégica de Goiânia, que faz com que atraia investimentos vindos do agronegócio. "Também é um importante polo no segmento de saúde", diz.

A construtora de Leal é um dos exemplos de empresas que estão aproveitando a bonança do agronegócio. Um dos prédios que ela ergueu teve o design de Hans Donner, que durante muito tempo foi o responsável pelas vinhetas da Rede Globo. O próximo lançamento vai ser de um edifício com o design elaborado pela Porsche Consulting, consultoria ligada à montadora alemã.

Outra parceria desenvolvida pela Séren foi com a multinacional norte-americana Carrier, que atua no segmento de climatização. O mais recente lançamento conta com uma unidade de tratamento de ar, similar à existente em aviões, que promove a desinfecção do ar.

A empresa está preparando dois lançamentos para este ano e outros dois em 2025. Também prepara a chegada em outro importante polo do agronegócio no interior do Brasil: Uberlândia, no Triângulo Mineiro. Em parceria com a Inconew, uma construtora local, e a Imobhub, de Uberaba (MG), vão construir duas torres na zona Sul da cidade, que ficarão ao lado do World Trade Center, um complexo de negócios.

Essas empresas estão otimistas e já começam a prospectar novos mercados no interior de São Paulo. A continuidade do cenário de queda nos juros tem sido um fator favorável para futuras expansões.

“Uberlândia tem crescido muito nos últimos anos e diversificado a sua economia além do agronegócio”, destaca o CEO da Inconew, Pedro Paulo Pina Ferreira.

Segundo o IBGE, a população da cidade teve um crescimento médio anual de 1,4% entre 2010 e 2022, quando atingiu 713,2 mil habitantes. É mais de duas vezes e meia o avanço da população do país.

O PIB de Uberlândia dobrou entre 2002 e 2021, segundo os últimos dados disponíveis para os municípios. Em contraste, o PIB brasileiro cresceu apenas metade desse índice no mesmo período.

No setor imobiliário, Campo Grande, capital de Mato Grosso do Sul, registrou uma forte valorização nos preços dos imóveis residenciais no ano passado. Com um aumento de 12,6%, a cidade teve uma das quatro maiores valorizações entre as cidades brasileiras. No entanto, essa tendência vem perdendo força nos últimos meses. Segundo o índice FipeZap, a valorização caiu para 7,9% nos 12 meses encerrados em março.



Vandre Kramer, Gazeta do Povo