Protesto contra as regras impostas na pandemia de covid-19 pelo governador de Nova Iorque, Andrew Cuomo, do lado de fora da residência do governador, em Albany, Nova Iorque, Estados Unidos, 2/5/2020 | Foto: Shutterstock
A pandemia de covid-19 foi um ato de segregação em massa e separação definido por burocratas
Dois anos atrás, grandes cidades norte-americanas foram segregadas por situação vacinal. A obrigatoriedade do uso de máscara definia o que era seguro e o que não era. Avisos nos diziam para manter distância uns dos outros. Não podíamos nem nos encontrar durante as compras por causa do corredores de mão única nos supermercados. Não nos foi permitido visitar familiares nem ir a funerais. Casamentos estavam fora que questão. Houve até restrições de viagens.
E hoje o Departamento de Saúde e Serviços Humanos dos Estados Unidos (HHS) lançou um relatório soando o alarme sobre a pandemia de solidão.
“Ainda que as conexões sociais estivessem em declínio por décadas antes da pandemia de covid-19, o início da emergência pandêmica, com seus lockdowns e suas medidas de isolamento, foi um momento crucial durante o qual a questão das relações se tornou uma prioridade na percepção pública, aumentando a conscientização sobre essa questão de saúde pública crítica e corrente.
Muitos de nós sentimos uma solidão como nunca havíamos sentido antes. Adiamos ou cancelamos celebrações e momentos fundamentais da vida, como aniversários, formaturas e casamentos. A educação das crianças se tornou on-line — e elas perderam os muitos benefícios da interação com os amigos. Muitas pessoas perderam o emprego e a casa. Não pudemos visitar nossos filhos, irmãos, pais e avós. Muitos de nós perdemos entes queridos. Lidamos com sentimentos de ansiedade, medo, tristeza, luto, raiva e dor pela perda desses momentos, rituais, dessas celebrações e relações.”
Ah, muito obrigado, HHS! Como se essa agência não tivesse tido nada a ver com a causa e fosse apenas uma observadora inocente. Como se muitas pessoas não tivessem previsto exatamente isso.
Não vamos esquecer que o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) e o Instituto Nacional de Saúde (NHI) fazem parte do HHS. A agência foi a fonte de todas as determinações absurdas e coercitivas de fechamento de estabelecimentos, isolamento em casa e tudo o mais. Então a agência do governo que provocou a crise agora cita a crise como evidência de que é preciso fazer mais. Enquanto isso, ela age e fala como se esse fiasco todo fosse algo que simplesmente aconteceu, por alguma razão.
Seja como for, tudo isso vai de encontro a todas as liberdades que os norte-americanos não costumavam valorizar. Também criou um sistema de castas dos puros e dos impuros. Desde o início, fomos definidos entre essenciais e não essenciais, cirurgias essenciais e eletivas, a classe dos laptops e os trabalhadores de fato, e mais. Foi um ato de segregação em massa e separação definido por burocratas, a agência HHS entre eles.
Isso é extremamente contrário a todos os elementos do éthos da lei e da cultura norte-americanas. Ideais de igualdade, democracia e oportunidades iguais são um marco definidor do “Novo Mundo” versus o “Velho Mundo”. É por isso que estão tão profundamente inseridos na história e na cultura.
Os “pais fundadores” dos Estados Unidos falavam disso constantemente em seus escritos. A Declaração de Independência diz que “todos os homens são criados iguais”, o que é uma afirmação surpreendente para qualquer parâmetro histórico.
É por isso que a Constituição dos Estados Unidos proíbe títulos de nobreza. O artigo 1, seção 9, cláusula 8 afirma: “Nenhum título de nobreza será concedido pelos Estados Unidos; e nenhuma pessoa que mantenha um gabinete de lucros e rendimentos sob seu comando deve, sem o consentimento do Congresso, aceitar qualquer presente, emolumento, cargo público ou título de qualquer natureza de um rei, príncipe ou Estado estrangeiro”.
Eles desejavam acabar com as rigorosas demarcações sociais e políticas do passado. Na primeira posse de George Washington, o Senado propôs que ele vestisse um casaco feito de uma pele de animal cara. Washington recusou e optou por vestir um paletó de lã que todo mundo usava na época.
Também foi por isso que os Estados Unidos travaram uma guerra sangrenta para finalmente acabar com a escravidão, uma prática tolerada sob uma nuvem moral no século anterior. Foram o éthos e a ética que impulsionaram o movimento pelos direitos civis: “justiça e liberdade para todos”, diz o compromisso.
Essa firme convicção na mesma liberdade para todos, e privilégios para ninguém, define o país de formas que nem sempre entendemos.
Vamos considerar, por exemplo, as roupas formais masculinas nos Estados Unidos. Ser formal hoje em dia em geral significa os homens vestirem um “tuxedo”, ou seja, um smoking. É o traje-padrão e o mais formal que conhecemos. É assim desde 1880, quando, em um evento no parque Tuxedo, os novos ricos usavam gravata preta e um casaco formal.
O que ninguém sabe é que esse traje completo é uma homenagem às classes trabalhadoras. A gravata preta e o casaco formal no Velho Mundo dos países da Commonwealth eram as roupas dos criados e ajudantes, não da aristocracia. Para todos os que estavam sentados à mesa principal, o traje adequado era um fraque e uma gravata branca.
Em outras palavras, o objetivo do “tuxedo” não era ser sofisticado, mas o oposto. Era dizer que, nos Estados Unidos, todos são aristocratas. Todos são trabalhadores. Todos gozam de mobilidade social, e ninguém se destaca por ter o direito nato de se vestir de uma forma específica. Com base nisso, as pessoas são recompensadas apenas pelo mérito. Até mesmo aqueles que herdam dinheiro precisam provar seu valor.
É isso: a coisa mais formal nos Estados Unidos tem origem em ideais democráticos de igualdade, mobilidade social e oportunidade.
Foi como se tivesse havido uma invasão de ladrões de corpos, nunca tão bem simbolizada quanto por vacinas obrigatórias que as pessoas mais inteligentes sabiam não serem necessárias
O mesmo vale para a história da calça jeans, que se popularizou pelo mundo como um símbolo da liberdade casual. Na história norte-americana, o jeans era usado para fazer calças de trabalho resistentes, como usavam os trabalhadores, mineradores e funcionários de fazenda. Levi Strauss, cujo nome deu origem à marca, era um empresário norte-americano nascido na Alemanha. Mais uma vez, suas calças jeans começaram a ser usadas como um símbolo de solidariedade por todas as classes sociais.
Com todas as diferenças que temos entre nós, existe um acordo quase universal sobre o princípio central da mesma liberdade. E é exatamente por isso que o éthos da reação à pandemia foi tão estranho e insustentável, e que os passaportes de vacinação nunca serão uma política de sucesso nos Estados Unidos. E é por essa mesma razão que nunca haverá uma monarquia: isso trai tudo o que o país representa.
A crise cultural e a pandemia de solidão, sem contar a enorme onda de depressão e de abuso de substâncias, refletem o choque nacional diante do fato de que todos os seus valores fundamentais puderam ser deixados de lado com tanta facilidade em nome de um grande plano estapafúrdio que passava por cima de tudo em que o país acreditava e praticava, ainda que fosse imperfeito. Foi como se tivesse havido uma invasão de ladrões de corpos, nunca tão bem simbolizada quanto por vacinas obrigatórias que as pessoas mais inteligentes sabiam não serem necessárias, mesmo que fossem seguras e eficazes, o que não era o caso.
Dado o caminho dessa história, esse amor profundo por liberdade, igualdade e democracia, nunca haverá uma mudança de regime no país. Eles podem governar por um tempo, mas nunca com estabilidade de fato, ou de uma forma que substitua os valores tão profundamente entranhados nos Estados Unidos. É por isso que a classe dominante aos poucos está abrindo mão dos símbolos do lockdown, de Andrew Cuomo a Randi Weingarten, passando por Rochelle Walensky e Anthony Fauci, que enfrenta torrentes de escárnio toda vez que abre a boca.
A liberdade para todos é a essência do significado da vida norte-americana. Uma oligarquia da classe dominante como a que tentaram impor ao país e ao mundo é fundamentalmente inconsistente com tudo em que seu povo acredita sobre si mesmo e sobre seu lugar na ordem cívica. Vamos tratar de reconstruir e reforçar aquilo que é o cerne do que é o país.
Jeffrey A. Tucker é presidente e fundador do Instituto Brownstone. Ele também é colunista sênior de economia do Epoch Times, além de autor de dez livros, incluindo Liberty or Lockdown (2020), e de milhares de artigos em publicações acadêmicas e populares. Tucker trata de temas como economia, tecnologia, filosofia social e cultura
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