sexta-feira, 7 de abril de 2023

Ciro Nogueira: 'O governo não quer esclarecer o 8 de janeiro’

 

Ciro Nogueira | Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil


Ex-ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira comentou o retorno de Bolsonaro ao Brasil, criticou o arcabouço fiscal e falou da dificuldade de Lula em formar uma base sólida no Congresso


Nascido em berço político, o senador Ciro Nogueira (PP-PI), 54 anos, está presente no Parlamento brasileiro há quase 30. Formado em Direito, já foi membro da Câmara dos Deputados e ministro da Casa Civil, no governo do ex-presidente Jair Bolsonaro.

Em 2021, quando foi nomeado para a pasta, seu nome gerou burburinhos na imprensa. O motivo é simples: até meados de 2017 e 2018, o senador era um forte apoiador do presidente Lula — maior rival político de Bolsonaro. Na época, em entrevista a uma rede de TV local, Nogueira classificou o caráter de Bolsonaro como “fascista e preconceituoso”. Além disso, declarou que Lula foi o “melhor presidente” que o Brasil já teve.

Desde quando chegou a Brasília, em 1995, Nogueira apoiou todos os governos eleitos. Ele esteve na base de Fernando Henrique Cardoso, Lula, Dilma Rousseff e Michel Temer. Agora, contudo, o cenário parece que mudou.

Em entrevista a Oeste, o parlamentar disse que o governo Lula ainda tenta resgatá-lo para a base petista, mas que ele tem negado veementemente os convites. “Tenho um lado”, contou Nogueira. “Tenho orgulho de estar ao lado do Bolsonaro.”

O senador piauiense marcou presença na chegada do ex-presidente ao Brasil, na quinta-feira 30. Segundo Nogueira, ele não gostava de Bolsonaro antes, pois conhecia apenas o deputado Jair Bolsonaro. “Me apaixonei pelo presidente Bolsonaro”, afirmou. “Por tudo o que ele fez pelo país e tudo o que ele representa”.

Oeste, o parlamentar comentou o retorno do ex-presidente, criticou o arcabouço fiscal — apresentado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad —, falou sobre a dificuldade que Lula enfrenta ao tentar formar uma base sólida no Congresso, sobre a fidelidade a Bolsonaro e muito mais. Confira os principais trechos.

Ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira
Nogueira já foi membro da Câmara dos Deputados e ministro da Casa Civil, no governo do ex-presidente Jair Bolsonaro | Foto: Pedro França/Agência Senado

O ex-presidente Bolsonaro retornou ao Brasil depois de passar quase três meses nos EUA. Qual deve ser a principal missão dele?

Ele deve se assessorar bem e procurar subsídios para focar no que interessa ao país, principalmente com a questão econômica. Bolsonaro precisa comparar tudo o que fez com o que o atual governo está fazendo, apontar os erros e indicar os rumos certos. Esse é o papel de um grande líder, e estaremos ao lado dele para isso acontecer. Ele deve ainda dar prioridade para as eleições de 2024. Bolsonaro será o grande eleitor do próximo ano, assim como foi em 2022. No ano passado, ele ganhou as eleições em quatro das cinco regiões. Ninguém elegeu tantos candidatos como ele. O presidente Lula conseguiu forte apoio no Nordeste e, mesmo assim, não elegeu nenhum prefeito nas capitais dos Estados. O PT é o nono partido no Nordeste. Se Bolsonaro souber escolher devidamente os candidatos, a expectativa eleitoral dele em 2024 pode ser decisiva na maioria das prefeituras do Brasil. Trabalharei para que isso aconteça.

“Lula entregava ministérios ou estatais para os partidos em troca do apoio dos parlamentares. Agora ele está tentando fazer o mesmo, e não vai funcionar

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, divulgou na última semana o novo arcabouço fiscal do governo petista. Qual a avaliação do senhor?

O arcabouço se fixa na ideia de que a despesa vai acontecer de acordo com o aumento da receita. O problema é que só existem duas formas de arrecadar a receita: criando impostos — o que Haddad disse que não vai acontecer — e aumentando a inflação. Estou apavorado, pois esse governo está focado em aumento de inflação, de arrecadação e de despesa. Isso é o fim do mundo e não dará certo. Esse arcabouço vai prejudicar a população mais pobre.

A proposta de Haddad já foi apresentada aos líderes do Senado. A oposição vai tentar impedi-lo? 

Somos uma oposição diferente, pois discutimos, dialogamos e tentamos corrigir. Se fosse o Bolsonaro apresentando um arcabouço, o PT estaria ouvindo e disposto a discutir? Antes mesmo de a proposta ser apresentada, os parlamentares de esquerda já seriam contra. Agora temos uma boa oposição, composta de senadores como Tereza Cristina (Republicanos-MS), Rogério Marinho (PL-RN) etc. São pessoas que possuem uma experiência muito grande. Vamos discutir e apontar os erros.

Lula governa o país há 100 dias, mas ainda não conseguiu criar uma base sólida no Congresso, em especial na Câmara. Por quê?

Lula está tentando fazer uma base de governo igual a que ele tinha no passado. Mas o Bolsonaro mudou isso, e o Congresso não deve voltar a ser como era. Antes, Lula entregava ministérios ou estatais para os partidos. Mas aconteceram muitas confusões e escândalos, que causaram prejuízos enormes para o país. Lula está tentando fazer o mesmo agora, e não vai funcionar. Não adianta ele entregar um cargo para um deputado do Rio Grande do Sul se, quando esse parlamentar voltar para o seu Estado de avião, ele não vai conseguir desembarcar. Os eleitores não aceitam mais isso.

Nesta legislatura, a oposição está em maior número na Câmara. Contudo, algumas ações dos parlamentares de direita deixam o eleitor em dúvida. Isso prejudica a oposição?

As votações vão falar mais alto do que isso. Mas situações como a do deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG) são desnecessárias, como o fato de ele ter colocado uma peruca e subido na tribuna. Assim como foi desnecessário o deputado André Janones (Avante-MG) chamar o Nikolas de “chupetinha”. São coisas inacreditáveis. Isso precisa cessar, para dar espaço ao bom senso.

O presidente Lula tem demonstrado claros sinais de que pretende fazer um governo de vingança. Em que tudo isso pode acabar?

Lula deve rever esses posicionamentos. Temos um presidente e um ex-presidente que sempre tiveram declarações polêmicas e desnecessárias. Mas o Bolsonaro não derrubava a bolsa de valores e nem aumentava o dólar com suas falas. Então ele não prejudicava a vida das pessoas, como o Lula está fazendo. Temos uma economia dolarizada e ainda temos o “custo Lula”, de R$ 1 o dólar. O dólar poderia estar custando R$ 4,50, se não fossem essas declarações loucas, mas está custando R$ 5,50. É um contrassenso. Essa loucura que ele falou sobre o Moro… Imagina se o plano do PCC tivesse se concretizado? O país tinha explodido e tinham derrubado o Lula. Ele precisa ter mais paciência e parcimônia. É a palavra de um presidente da República. Lula parece viver em uma época sem redes sociais. Espero que o presidente aprenda.

“Tenho um lado”, contou Nogueira. “Tenho orgulho de estar ao lado do Bolsonaro.” | Foto: Divulgação/Progressistas

Qual a importância de uma CPI do MST no governo Lula?

O grande fator de desenvolvimento do país na balança comercial é o agronegócio. O MST possui acusações absurdas, inclusive, um de seus líderes, o Zé Rainha, está preso, por extorquir pessoas. Isso precisa ser esclarecido. Mas não precisamos perseguir ninguém para fazer isso. Nosso agro tem de ser protegido. Não existem motivos para invadir terras no Brasil, e o Bolsonaro provou isso. Temos uma quantidade de terras absurda, que nunca haverá agricultores suficientes para produzirem no tanto de terra que existe. Muita gente ganha dinheiro com essas invasões. Precisamos esclarecer.

O senhor acredita que o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), vai ler a CPMI do 8 de janeiro no prazo previsto, ao fim da primeira quinzena de abril? 

Existe um desespero e um pavor do governo contra essa CPMI. Eles não querem esclarecer o 8 de janeiro, pois estão trabalhando para retirar assinaturas e, praticamente, impedindo que o presidente do Senado convoque a sessão. Mas não tem jeito. O governo vai precisar aprovar medidas provisórias. Então, a sessão terá de ser convocada. Está sendo muito difícil fazer os parlamentares retirarem suas assinaturas. A CPMI vai esclarecer os fatos, mas sem perseguição. Foi criada uma narrativa para culpar o Bolsonaro pelos atos do 8 de janeiro.

Pacheco senadores CPI
Rodrigo Pacheco, presidente do Senado: | Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado

Até 2018, o senhor apoiava Lula e repudiava Jair Bolsonaro. O que mudou?

Conhecia apenas o deputado federal Jair Bolsonaro, mas me apaixonei pelo presidente Bolsonaro. Por tudo o que ele fez pelo país e tudo o que ele representa. Nas gestões Lula, meu partido recebia ministério de porteira fechada. Quando me tornei ministro da Casa Civil, só levei uma assessora comigo e minha chefe de gabinete. Mais ninguém. Era outra época. Não fui escolhido por ele por ser do PT, mas pela minha habilidade. Me apaixonei pelo governo Bolsonaro e, por isso, o apoio até hoje. Tenho orgulho de estar ao lado do Bolsonaro. Vamos tentar colocar este país no rumo, com as eleições municipais. Com a eleição presidencial, em 2026, com a volta de Bolsonaro, ou de Tarcísio de Freitas (governador de São Paulo), Romeu Zema (governador de Minas Gerais) ou Tereza Cristina à Presidência da República.

Atualmente, existe alguma chance de o senhor se alinhar à base do governo?

Zero. Eles ainda tentam me levar para a base, mas não vou.

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Rute Moraes, Revista Oeste