sexta-feira, 24 de agosto de 2018

Na política, silêncio não tem preço, por Vilma Gryzinski

O mundo dos acordos de confidencialidade nos EUA vai do sórdido aos contratos entre adultos em plenas condições de consentimento, mas conscientes de que nem os normais querem ser vistos de perto. São pais que aceitam dinheiro para livrar a cara de violadores de seus filhos (Michael Jackson, e um valor total estimado em 200 milhões de dólares a título de cala-boca a menores abusados); mulheres que concordam que tudo tem um preço, inclusive sua integridade sexual (pelo menos três das acusadoras de Harvey Weinstein); ex-cônjuges que aceitam acordos de divórcio sob a condição de que o que rolou durante o casamento fique em segredo. “Fulano gosta de sexo assim e assado” ou, pior ainda, “fulano não gosta de sexo nem assim nem assado” podem prejudicar carreiras empresariais e políticas. Ou, se as consequências se precipitarem, levar a um processo de impeachment contra Donald Trump.
Quando apareceram as primeiras notícias sobre casos extraconjugais de Trump com uma atriz pornô e uma modelo da Playboy, muitos trumpistas deram risada. “Quanto mais falarem sobre isso, mais a popularidade dele aumentará.” Mas as gatas no armário poderão sair muito mais caro do que o valor do pacote de sexo pago bem a posteriori se ficar comprovada denúncia de Michael Cohen, o advogado de porta de motel usado por Trump para fechar boquinhas cheias de preenchimento. Stormy Daniels, nome de guerra da atriz pornô voluntariamente disponível para um encontro sexual há mais de dez anos, levou seu cala-boca relativamente modesto, de 130 000 dólares, durante a campanha presidencial, o que configura doação não declarada. Uma espécie de Transa a Jato, para ficar numa comparação com as notórias operações brasileiras.
Joseph Kennedy, o milionário e lúbrico patriarca do clã americano, foi um mestre da distribuição de renda em troca de silêncio sobre aventuras sexuais, tanto dele quanto do filho. A dinamarquesa Inga Arvad foi beneficiada pelo método quando o velho Kennedy descobriu que o filho havia se enrolado com ela. Por dois motivos. Primeiro, estava realmente apaixonado pela loira linda, inteligente e com dois ex-­maridos, um anátema para sua futura carreira política. Segundo, ela havia entrado no radar do FBI por ter visitado a Alemanha nazista para uma reportagem durante a qual encantou Hitler, um fato público, e se envolveu com Heinrich Himmler, o criador das SS, uma suposição privada. Vários pesquisadores afirmam que, na sua convicção de que dinheiro comprava silêncio, Joseph Kennedy ofereceu 1 milhão de dólares à nora mais famosa para que continuasse engolindo a compulsão sexual do marido. Não existe fonte primária que confirme a resposta atribuída a Jacqueline Kennedy: “E pode aumentar para 20 milhões se ele trouxer para casa alguma doença contraída com suas vagabundas”. A frase é tão boa que deve ser mentira.
Muito antes de começar a pagar pelo impossível — o silêncio eterno — para não aborrecer Melania e, mais tarde, blindar-se politicamente, Trump tinha um truque para escapar das DSTs: mandava seu médico fazer uma checagem com as potenciais parceiras. Foi ele mesmo quem contou. Todos os democratas que gritaram “puritanismo” quando Bill Clinton foi ao impeachment devem estar salivando por antecipação.

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