Tenho uma preguiça imensa daqueles que ainda insistem na baboseira de que impeachment é golpe. Janio de Freitas, figura que se intitula "um dos mais importantes jornalistas do Brasil", é uma dessas pessoas. Em seu artigo da última quinta (4), ofereceu uma espécie de alívio intelectual e moral para aqueles que, na visão dele, não chamam o afastamento da presidente Dilma de "golpe" por pura covardia. Parece que ele não percebeu quem realmente precisa de uma narrativa mirabolante para aliviar o peso da própria canalhice.
Freitas já começa fazendo um paralelo do momento atual com o período da ditadura militar. É uma espécie de fetiche das esquerdas. Como boa parte da narrativa política dos petistas e afins se baseia numa suposta luta armada pela democracia -quando, na verdade, o objetivo dos guerrilheiros comunistas era substituir a ditadura militar por uma ditadura do proletariado–, os simpatizantes do petismo sempre tentam forçar, de qualquer maneira, uma comparação com o período. Nesses paralelos mirabolantes, os petistas são sempre vítimas, ainda que o poder estivesse em suas mãos durante mais de uma década.
Em outra tentativa de distorcer a realidade -parece que essa é a única saída que sobrou para defender o petismo–, Freitas cita uma entrevista do presidente Michel Temer, que afirmou à imprensa internacional que a questão do impeachment do Senado depende de uma avaliação política dos senadores. Para o jornalista, tal afirmação evidencia que o todo o processo é uma farsa.
Sim, para cassar um presidente da República é preciso haver embasamento jurídico. No caso de Dilma, ele existe, e já foi debatido exaustivamente. Mas é inegável que a natureza do julgamento é, em grande parte, política. É justamente por isso que a Constituição determina que ele ocorra no Congresso. Basta um simples exercício de lógica para chegar a esta conclusão: se meramente jurídico fosse, seria julgado pelos ministros do STF, e não por políticos.
Está mais do que claro que a narrativa do golpe foi criada para dar combustível à militância petista, que está cada vez menor e mais desmoralizada. É inconcebível que qualquer pessoa com um par de neurônios acredite em sua veracidade. A palavra "golpe", além de resgatar 1964, ano que praticamente se tornou o preferido dos petistas, também serve como válvula de escape para o militante, que já não tem meios de defender o PT racionalmente.
Como explicar todos os escândalos de corrupção? O que dizer sobre a fraude fiscal, que foi cometida para pagar ruralistas e grandes empresários? E sobre os milhões de desempregados, a inflação de dois dígitos, o aumento da desigualdade social e da miséria? Fácil. Simplesmente aponte o dedo para o rosto de seu opositor e chame-o de golpista. Se possível, cuspa nele.
Os petistas estão agindo como o Cavaleiro Negro do filme "Monty Python em Busca do Cálice Sagrado": suas narrativas já perderam os braços e as pernas, mas eles continuam triunfantes, gritando "golpe" sem parar, de peitos estufados.
Por fim, Freitas afirma que o impeachment "mantém o Brasil em regressão descomunal". Me pergunto o que ele viu de avanço nos governos petistas. Seria a implantação da ditadura da propina? As alianças com os velhos caciques e coronéis da política brasileira? Ou o discurso populista aliado a desvios de dinheiro público que beneficiaram uma elite política e econômica corrupta?
Não seja hipócrita, caro Janio. Quem realmente precisa de narrativas esdrúxulas para amenizar a própria culpa são os petistas e seus simpatizantes.