sexta-feira, 18 de janeiro de 2019

Morales se aproxima de Bolsonaro para não virar 'novo Maduro'

Presidente do Brasil, Jair Bolsonaro cumprimenta líder boliviano, Evo Morales, durante posse em Brasília Foto: NELSON ALMEIDA / AFP
Presidente do Brasil, Jair Bolsonaro cumprimenta líder boliviano, Evo Morales, durante posse em Brasília Foto: NELSON ALMEIDA / AFP

A relação com o Brasil tem peso estratégico e econômico para a Bolívia de Evo Morales e nessa relação o gás ocupa um lugar central. No final deste ano, vencerá um acordo selado em 1999 que estabelece preços e quantidades sobre a exportação de gás boliviano para o Brasil e a intenção da Petrobras seria reduzir ambos, explicou Francesco Zaratti, analista em temas energéticos e professor da Universidade Maior de San Andrés. Isso explica, em parte, a clara jogada de aproximação do chefe de Estado boliviano ao governo de Jair Bolsonaro (PSL).
As últimas ações diplomáticas de Morales mostram que o boliviano tenta acomodar a aliança com bolivarianos junto a uma boa relação com Bolsonaro, agora líder de seu principal sócio comercial. A Bolívia, afirmou Zaratti, "quer garantir uma negociação favorável e, também, dar um sinal ao mercado de que continuará vendendo gás para o Brasil, isso é fundamental para a futura captação de investimentos".
— A capacidade de produção caiu bastante nos últimos anos, a Bolívia precisa de investimentos. E se existir a sensação de que o mercado brasileiro será perdido o custo será altíssimo para o país — insistiu o analista.
Para permanecer no poder, Morales deve convencer os bolivianos de que conseguirá manter a estabilidade econômica. Isso seria inviável, segundo analistas, sem uma boa relação com o Brasil de Bolsonaro. O mercado brasileiro representa atualmente entre 20% e 30% das exportações de gás boliviano. No passado, esse percentual já atingiu 50%. A renovação do contrato de 99 gera preocupação no país e existe um forte temor de que o Brasil reduza drasticamente tanto a quantidade comprada como os preços pagados ao país vizinho.
— Hoje, a Petrobras compra em torno de 20 milhões de metros cúbicos diários. No melhor cenário, esse número cairá para 15 milhões — explicou o analista.
Ele acredita que "a Petrobras colocará sobre a mesa de negociação uma necessidade menor já que nos últimos anos ampliou sua capacidade interna de exploração de gás e outras fontes de energia". O contrato atualmente em vigência estabelece que a demanda diária do Brasil pode chegar a até 30 milhões de metros cúbicos por dia.
— No ano passado, nossas exportações de gás atingiram US$ 2 bilhões e o Brasil tem uma participação muito grande nisso — enfatizou Zaratii.
Morales enfrenta muitas pressões internas por parte de setores empresariais, que demandam bons vínculos com sócios comerciais como Brasil, Peru e Chile. As necessidades são variadas e incluem, ainda, o eterno drama de não contar com uma saída soberana ao mar. A derrota em 2018 na Corte Internacional de Haia, no litígio contra o Chile, foi um revés duro para o presidente. Os empresários bolivianos continuam com acesso ao porto chileno de Arica, sem custo algum, mas avaliam outras alternativas, entre elas o porto de Ilo, na fronteira com o Peru.
Também está a hidrovia do rio Paraná, que passa pelo Brasil, Paraguai e Argentina, mas não tem capacidade para grandes carregamentos e não resolve o problema da saída ao Pacífico.
Mais uma vez, o isolamento regional, opção adotada pelo venezuelano Nicolás Maduro, seria catastrófica para seu parceiro boliviano.

Janaína Figueiredo, O Globo