Coordenador do Observatório de Política Fiscal do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre), da Fundação Getúlio Vargas, o economista Manoel Pires defende a redução dos salários iniciais dos servidores e congelamento temporário dos reajustes para o topo das carreiras do funcionalismo público. Em entrevista ao Estadão/Broadcast, Pires, que foi secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, diz que o próximo presidente terá de enfrentar as reformas de pessoal e da Previdência para o País sair da crise fiscal. Ele calcula que o presidente eleito já começa o seu governo tendo que correr atrás de R$ 18 bilhões para garantir a “ração” mínima de despesas para a máquina administrativa não parar.
Há uma negação da crise fiscal no debate eleitoral?
O papel da campanha é trazer o debate sobre a direção que o País deve adotar e as alternativas. A maioria dos candidatos não se fechou para temas espinhosos. Não espero que se discuta detalhadamente esses temas neste primeiro momento, mas que se aponte uma direção. Fiquei feliz de não ver candidato fechando a porta para o debate da Previdência e mesmo alguns falando sobre a questão tributária de maneira mais aberta. É algo que não acontecia antes. A agenda fiscal está implícita de alguma forma no programa de cada um dos candidatos. O importante é não excluir nenhum tema para não haver acusação de estelionato.
Não há risco disso acontecer?
Acho que não. Até porque o que aconteceu nos últimos anos já colocou o debate fiscal na agenda. Ele é inevitável e já está acontecendo desde 2015. Há uma opinião pública favorável a discutir reforma da Previdência, a questão dos servidores.
Qual é a principal agenda de ajuste?
Temos regras de Previdência que precisam ser revisadas e precisamos fazer uma reforma de pessoal. O problema é que apostar só em gasto causa uma fadiga muito grande em determinados grupos da população muito organizados, como servidores e aposentados. Isso faz com que o ajuste seja muito demorado, e a economia fica sujeita a choques enquanto essa questão não é resolvida.
O que se pode fazer com a despesa de pessoal?
Os salários de entrada são muito elevados em algumas carreiras do setor público. É importante reduzir os salários de entrada, o que alongaria a carreira. Nos salários mais elevados, é importante evitar reajustes por algum tempo. Congelar os salários do topo das carreiras. Depois dessa fase de transição, os salários poderiam ser vinculados aos reajustes que ocorrem no setor privado com um redutor para estabelecer alguma convergência salarial, respeitando as diferenças existentes.
O teto de gastos vai resistir?
Ele começa a ser uma restrição efetiva em 2019. No Ibre, temos uma estimativa de que o governo precisa de R$ 120 bilhões de gastos discricionários (gastos não obrigatórios, como confecção de passaporte e conta de luz) para conseguir manter o seu funcionamento. É a ração mínima. O Orçamento para 2019 prevê apenas R$ 102 bilhões. Então, o governo que entrar já começa uma corrida para recompor R$ 18 bilhões do Orçamento. Acredito que será revisto.
O que fazer do lado da receita?
Há espaço para aumentar arrecadação elevando algum imposto. É preciso retomar a tributação de lucros e dividendos e ao mesmo tempo reduzir a tributação do IRPJ (Imposto de Renda Pessoa Jurídica). Também há espaço para aumentar o IRPF (Imposto de Renda Pessoa Física) e a tributação sobre herança, que ajuda Estados em crise, e reduzir benefícios tributários que podem ser revisados gradativamente.
Onde cortar renúncias fiscais?
Uma discussão é no Supersimples, que ficou muito abrangente e criou um incentivo que impede as empresas de crescerem. Os incentivos da Zona Franca também podem ser redimensionados. É preciso ver qual o equilíbrio de poder e qual a viabilidade política.
Adriana Fernandes, O Estado de S.Paulo