Foi à sombra de Lula que Fernando Haddad chegou ao fim de uma corrida de obstáculos até ser confirmado o candidato do PT à Presidência. E será, com a benção de Lula, que o ex-prefeito de São Paulo terá de convencer eleitores do ex-presidente ser, agora, merecedor desses votos. Será pouco tempo, apenas 26 dias, até o primeiro turno, no próximo dia 7. Enquanto isso, dependerá mais uma vez das articulações do padrinho político que o lançou como um dos postes que ajudariam a iluminar o país. Lula é quem fará a sua campanha, a despeito do discurso do PT de que Haddad percorrerá o caminho com as próprias pernas.
Não haverá para Haddad outra alternativa a não ser colar a sua imagem a de um cabo eleitoral preso por corrupção após uma derrota épica na tentativa da reeleição em São Paulo, quando sequer chegou ao segundo turno. A considerar o tanto que o paulistano desaprovou sua gestão - 48% consideraram seu governo ruim ou péssimo, outros 35% o classificaram como regular, os piores índices desde a administração de Celso Pitta, afilhado de Paulo Maluf —, caberá a Haddad transformar em realidade a transferência de votos de Lula que, em tese, está referendada nas pesquisas.
O último Datafolha informa que 30% dos brasileiros votariam no candidato indicado por Lula. Boa parte deles, numa rápida avaliação das intenções de voto, no Nordeste, reduto eleitoral do petista que acompanharam muito à distância a gestão de Haddad na capital paulistana. Paradoxalmente, 40% dos eleitores dizem que não votariam em Haddad se ele fosse escolhido pelo PT para substituir Lula na disputa pela sucessão de Michel Temer. Era esse um dos obstáculos para a formalização do nome de Haddad, aliás.
Ainda na condição de vice de um candidato que tentava reverter sua situação empurrando o processo eleitoral para o campo judicial, Haddad conseguiu fôlego. Justamente após um périplo pelo Nordeste, inclusive a Garanhuns, terra natal de Lula. No limite da margem de erro, está embolado em segundo lugar com Ciro Gomes (PDT), Marina Silva (Rede) e Geraldo Alckmin (PSDB). O ex-prefeito de São Paulo passou de 4% para 9% das intenções de voto. Bem distante ainda do eleitorado que garante seguir à risca a orientação do ex-presidente. É, mesmo assim, um cenário revigorante para um PT que chegou em frangalhos à largada da corrida sucessória e assistiu, nas internas, o ex-presidente sendo levado para a pequena cela em que, mesmo assim, deu as cartas nos últimos cinco meses.
Ao "Andrade", como um militante desavisado o chamou durante sua passagem por Pernambuco, caberá assumir um discurso mais popular, essa uma das críticas mais comuns à sua indicação como o candidato oficial do PT à Presidência. Reclamavam - e ainda há quem olhe torto - para seu perfil mais acadêmico. Haddad, orientado ou não pelo marketing, parece ter se esforçado. Madrugou nas portas de fábricas do ABC, numa tentativa de reviver cena liderada anos atrás por Lula. Na ocasião, trocou o "bom dia" por "firmeza?" ao recepcionar os funcionários de diversas montadoras na região durante todo o dia. De lá para cá, não voltou aos portões das montadoras.
Com pouco tempo de campanha, mais que atacar adversários, o PT terá pela frente o desafio de que tudo pode dar certo mesmo quando o partido vende a ideia de um homem no corpo de quem foi forjado anos luz da mesma trajetória política e social.
Flávio Freire, O Globo