quinta-feira, 5 de julho de 2018

'Chegamos a um formato que atende a todos os interesses', diz presidente da Embraer

O presidente da Embraer, Paulo Cesar de Souza e Silva, afirma que as negociações da fabricante com a Boeing para uma joint venture na aviação comercial foram complexas. "Chegamos a um formato que atende a todos os interesses", afirmou, em entrevista exclusiva antes da teleconferência com analistas e investidores, nesta manhã. Segundo o executivo, a Embraer será majoritária na outra joint venture que ambas estão prevendo para a área de defesa e segurança. Leia a seguir os principais trechos:
Embraer - Paulo Cesar de Souza e Silva
O presidente da Embraer, Paulo Cesar de Souza e Silva, afirmou ao Estado
que conversas para a venda de parte da fabricante brasileira de aviões para 
a Boeing estão próximas de serem concluídas Foto: Remo Casilli|Reuters

As negociações entre Boeing e Embraer foram oficialmente anunciadas em dezembro. Por que o anúncio do acerto demorou todo esse tempo?
Esse é um acordo bastante complexo. E, uma vez que o governo brasileiro é detentor de uma golden share (ação especial que dá poder de veto em algumas negociações), ele tinha uma opinião bastante forte de que a Embraer deveria garantir a independência do setor de defesa. Queria que esse setor fosse sustentável, e que a Embraer no Brasil continuasse a ter independência nessa área, tendo a gestão e o domínio completo da engenharia e do desenvolvimento de novos programas no futuro. Por isso, passamos a trabalhar em algumas alternativas, e aí é realmente mais complexo. Até que chegamos a um formato que entendemos atender a todas as partes: ao governo brasileiro, à Embraer, à Boeing, aos nossos acionistas.
Mas tinha algum ponto específico travando o acordo?
Não tinha um ponto específico. É que, à medida que você vai dividir uma empresa que tem uma aviação comercial, uma área de defesa e uma aviação executiva, quando você faz a separação, você automaticamente entra na necessidade de se ter acordos operacionais entre essas empresas. Existem fábricas, existe a engenharia, a cadeia de fornecedores. Então, era necessário que nós costurássemos os acordos operacionais. E esses acordos são complexos. Não são feitos de uma hora pra outra, são muitos detalhes. E isso é que realmente levou mais tempo.

O comunicado diz que será criada uma outra joint venture para a área de defesa, e essa era exatamente a área em que havia mais empecilhos por parte do governo. Como vai funcionar esse acordo, especificamente?
Esse é um ponto muito importante. Essa joint venture vai dar possibilidade de a Embraer S/A (a empresa que vai ficar com as áreas de defesa e de aviação executiva) ter um crescimento bastante forte. Essa joint venture vai ser criada com a Boeing, mas a Embraer será majoritária. Não sabemos ainda o porcentual, mas a Embraer será majoritária. Os resultados dessa nova empresa serão consolidados no balanço da Embraer S/A. A joint venture será destinada a explorar oportunidades no setor de defesa, especialmente a venda do  (cargueiro) KC-390, por meio da rede da Boeing. A Boeing tem uma área de defesa que representa aproximadamente um terço das suas receitas, ou cerca de US$ 28 bilhões, com muitos clientes. A joint venture dará a possibilidade de a Embraer ter acesso  a esses mercados, o que, sem a Boeing, seria extremamente difícil. Com a Boeing, nós temos uma possibilidade muito grande. A Boeing entende que o KC-390 é um avião muito eficiente, que pode ter um sucesso muito grande, que há uma demanda muito importante no mundo para esse avião. Então, para a Embraer S/A isso é ótimo, porque vai significar mais exportação, mais empregos e mais vendas.

É uma parceria só na área comercial ou também vai englobar desenvolvimento de produtos?
Comercial. Evidentemente que, dependendo do país, vai ser necessária uma certa customização do avião, e aí quem vai fazer a customização será a joint venture. Mas isso já é um detalhe que faz parte de uma discussão que ainda será feita para detalhar exatamente como a joint venture vai funcionar. Hoje, a decisão é que a joint venture vai existir e que o fundamento será esse que eu disse.
O governo teria condicionado a aprovação do acordo à manutenção dos empregos. Como ficou essa questão? Como foram as negociações?
Nós estamos em contato com o governo, através do grupo técnico, desde janeiro, com reuniões periódicas, até que chegamos a este formato. Agora nós vamos fazer as negociações finais dos documentos com a Boeing, e esse é um processo que vai levar talvez uns três ou quatro meses. Aí, uma vez que os documentos estiverem na sua forma final, nós vamos submetê-los à aprovação final do governo brasileiro, por conta da golden share. Esse é o processo normal. Em relação aos empregos, o que estamos antevendo aqui é um aumento das contratações, uma vez que a aviação comercial vai estar mais inserida na cadeia global da Boeing. Ou seja, Embraer e Boeing formam o grupo aeroespacial mais importante do  mundo, com uma possibilidade de oferecer às empresas aéreas jatos de 76 a 450 assentos. A Boeing tem um interesse muito grande nos nossos aviões, ela vê uma demanda bastante grande, e portanto, naturalmente, o que deve acontecer são vendas maiores, mais exportações e maior geração de empregos. 
Mas foi indicado nos contratos que os empregos seriam mantidos, assim como as fábricas?
Tudo ficará exatamente como é hoje, não muda nada.
A Embraer S/A continuará na Bolsa de Valores?
Exatamente. O que vamos fazer é a separação dos ativos de aviação comercial que estão na Embraer S/A hoje. Vamos pegar esses ativos, separar e colocar numa nova empresa. A Embraer S/A continua uma empresa de capital aberto, igual a hoje, listada nos Estados Unidos e aqui na B3, com os negócios de aviação executiva e defesa. E terá investimento de 20% na nova empresa de aviação comercial criada com a Boeing. Essa terá capital fechado.
E como fica a questão da marca Embraer na nova empresa?
Isso ainda não está definido. Vai ser na próxima fase das negociações.

Luciana Dyniewicz e Alexandre Calais, O Estado de S.Paulo