Apenas um brasileiro em um milhão é capaz de entender o emaranhado das falcatruas varejadas pela Lava Jato. Mas todo brasileiro que já entrou em pânico quando sobrou mês no fim do salário sabe o que é um recibo de aluguel. A simples suspeita de que Lula não consegue explicar o aluguel de um apartamento que utiliza em São Bernardo é inquietantemente perturbadora.
Quem cuidava disso era dona Marisa, disse o pajé do PT quando Sergio Moro o interrogou sobre o aluguel do imóvel. As evidências disponíveis no processo e Antonio Palocci informam que era a Odebrecht quem resolvida tudo, não a ex-primeira dama. A defesa de Lula levou aos autos um lote de recibos. Ufa! São falsos, declara a força-tarefa de Curitiba. Hummmm!
Tomado pelo hábito de nunca saber de nada do que se passa sob suas barbas, Lula parece guiar-se por uma filosofia própria. Está baseada na seguinte premissa: alguém que veio ao mundo para salvar o Brasil não pode se preocupar com coisas banais como, digamos, um recibo de aluguel.
Vem daí, talvez, o inconformismo do ex-soberano petista com seus investigadores. Lula enxerga os procuradores como seres insensíveis. É uma gente incapaz de notar que o dinheiro movimentado ao seu redor, venha de onde vier, é mais do que merecido. Ah, até o Palocci diz que roubaram nas sondas da Petrobras? Ora, gruda-se na testa do companheiro a tarja de “traidor”. E toca-se a procissão.
Noutros tempos, o político que roubava mas fazia costumava reclamar para si uma cota de imunidade. Estava entendido que sua obra justificava seus pecados, quando não eram uma decorrência natural deles. Mas a rapina sistemática do país foi levada às fronteiras do paroxismo. A reação tornou-se inevitável.
Colecionador de processos, Lula já foi denunciado nove vezes pela Procuradoria. Seis dessas denúncias viraram ações penais. Numa, o ex-presidemte foi condenado por Moro a nove anos e meio de cadeia. Com uma rotina penal tão inquietante, se Lula não tiver como explicar o pagamento de um aluguel, talvez seja o caso de pensar numa autodelação. Seria mais honesto do que continuar exigindo dos seus devotos que façam o papel de idiotas.