O governo Trump trará duas mudanças: menor compromisso com a ordem internacional e mais protecionismo
Uma vez assimilado o impacto do resultado eleitoral nos Estados Unidos, as chancelarias do mundo começaram a revisar as premissas de suas relações com Washington a partir de janeiro de 2017. Por ora, enquanto o presidente eleito acaba de selecionar seus principais colaboradores, o que se pode afirmar com certeza é que virá uma mudança significativa na forma como os Estados Unidos interagem com o resto do mundo. Há uma interrogação sobre a magnitude da mudança esperada e de suas implicações.
A mensagem de felicitações da chanceler da República Federal da Alemanha, Angela Merkel, ao presidente eleito é reveladora: “Alemanha e Estados Unidos estão unidos por determinados valores: democracia, liberdade, respeito pelo império da lei e a dignidade dos seres humanos, independentemente de sua origem, cor de pele, gênero, orientação sexual ou pontos de vista políticos.” Afirmou que Berlim se propunha a colaborar estreitamente com a nova administração “com base nesses valores”. Esta inusitada advertência por parte de uma nação aliada reflete o desconcerto que compartilham outros governos ocidentais com respeito às diretrizes futuras da política externa americana.
Anúncios recentes do presidente eleito sugerem que certas figuras de retórica extremas usadas durante a campanha eleitoral não devem ser interpretadas em sentido literal. As mudanças de postura acerca de temas tais como o casamento gay, o acesso aos serviços de planejamento familiar, a igualdade de gênero e o salário mínimo revelam o propósito oportunista de agradar a distintos públicos. Mas há implicações do slogan “American First”, que correspondem a convicções arraigadas do presidente eleito: uma de tipo geopolítico e outra relacionada com o comércio internacional.
Donald Trump considera que o esforço que os Estados Unidos fazem para sustentar a estrutura do sistema internacional vigente não se justifica, à luz de uma definição restritiva do interesse nacional. Uma política exterior consequente com essa premissa implicaria se abster de participar em iniciativas coletivas cujos benefícios tangíveis para os Estados Unidos não foram evidentes. Este enfoque coloca em questão as diretrizes da política externa americana dos últimos 70 anos, cujo propósito tem sido estabelecer um ordenamento internacional em termos de segurança e cooperação econômica. Isto explica a inconformidade de Trump com a Otan, com os acordos contra a proliferação nuclear, os compromissos de defender o Japão e a Coreia do Sul, as obrigações que se desprendem da participação na Organização Mundial do Comércio.
O presidente eleito tem uma concepção mercantilista do comércio internacional. Entende-o como um enfrentamento entre adversários, no qual há um vencedor e um perdedor. De modo que um déficit na balança comercial tende a equiparar-se a uma derrota, quando não a uma agressão por parte da nação superavitária.
Não obstante a incerteza que ronda o início da nova administração, é previsível que ela estará caracterizada por duas mudanças que terão repercussões mundiais: um menor compromisso com a ordem internacional e um maior protecionismo.
Rodrigo Botero Montoya é economista e foi ministro da Fazenda da Colômbia