A demissão do diretor do INPE esquentou o debate sobre o desmatamento da Amazônia. Predominou, infelizmente, o simplismo e a luta ideológica. O assunto merece discussão mais profunda.
Em primeiro lugar, e pouca gente sabe disso, existem duas “Amazônias”: uma “natural” e outra “legal”. Entender essa diferença é básico. A Amazônia “natural” é uma floresta tropical densa – o bioma Amazônia – que ocupa 6,9 milhões de km², espalhada por 9 países (Brasil, Bolívia, Peru, Colômbia, Equador, Venezuela, Guiana, Suriname e Guiana Francesa).
No Brasil, o bioma Amazônia cobre 4,2 milhões de km² (60,8% da sua extensão total). Representa 49,4% do território brasileiro. Conhecido por suas gigantescas árvores e seus igarapés, engloba distintos ecossistemas, incluindo florestas estacionais, campos e refúgios montanhosos. Por sua vez, a Amazônia “legal” expressa um conceito territorial, ou seja, uma região administrativa.
Definida politicamente desde 1966, engloba 9 estados brasileiros (Amazonas, Pará, Mato Grosso, Acre, Rondônia, Roraima, Amapá, parte do Tocantins e parte do Maranhão). Ocupa 5,2 milhões de km². Conforme se percebe, a Amazônia Legal é MAIOR que a área ocupada pela floresta do bioma Amazônia.
Este representa 80% daquela. Tal ocorre porque a Amazônia Legal incluiu parte de 2 outros biomas: a) um pedaço do Pantanal, existente no estado de Mato Grosso; b) várias áreas de Cerrado, encontrado desde o Mato Grosso até o Amapá.
Quando o governo, ou o INPE, divulga os dados sobre desmatamento na Amazônia, ele normalmente se refere ao território geográfico da Amazônia Legal.
Isso mascara o real problema ecológico, por não significar apenas supressão da floresta tropical densa. Grandes áreas planas do Mato Grosso, além dos planaltos de Tocantins, entre outros, pertencem à Amazônia Legal, mas, repita-se, são cobertas pelo bioma do Cerrado. E são estas áreas que têm sido mais intensivamente exploradas para a produção agropecuária. Rondonópolis é um bom exemplo disso.
Em segundo lugar, embora o desmatamento seja grave, os números indicam uma situação suportável. Somando-se toda a supressão florestal na Amazônia Legal, monitorada entre 1988 e 2017, resulta em uma área de 428,1 mil km². Em 30 anos, o desmatamento da Amazônia Legal, incluindo, portanto, a vegetação dos cerrados, atingiu 8,2% da área total. Não é um exagero.
Quanto ao bioma Amazônia, não se sabe ao certo quanto dele já foi desmatado. As informações existentes permitem afirmar que está próximo de 5%, ou seja, 95% da floresta tropical original – a Hileia – ainda estaria intocada. Considerando a tendência histórica de redução no desmatamento, é um mito supor que a Amazônia vai desaparecer ou entrar em colapso ambiental. Felizmente. Em terceiro lugar, é importante saber quem são os agentes responsáveis pelo desmatamento da Amazônia.
Em 2016 ocorreu um pico no desmatamento na região. As informações oficiais, com dados básicos coletados pelo INPE, apontam que aquela forte supressão florestal aconteceu: 1) em terras privadas (35,4%); 2) em assentamentos de reforma agrária (28,6%); 3) em terras devolutas (24%); 4) nas unidades de conservação (11,8%).
Percebe-se ser falso acreditar que somente os grandes fazendeiros desmatam a Amazônia. O lenho da floresta cede à motosserra dos pobres assentados de reforma agrária tanto quanto atende aos perversos madeireiros dentro de áreas que deveriam estar protegidas.
Em quarto lugar, há que se separar o desmatamento criminoso, ilegal, daquela supressão de vegetação autorizada pelo poder público, segundo as normas do Código Florestal. Quando se divulgam dados sobre desmatamento no país, mistura-se o joio com o trigo. Conclusão: é possível elaborar uma “teoria do desmatamento brasileiro”.
A equação central seria oferecida pelo Zoneamento Ecológico-Econômico de seus territórios florestados. Este determinaria as áreas de elevado potencial agronômico, férteis e planas, a serem exploradas. Separaria estas, assim, daquelas com baixo potencial, a serem preservadas.
Conhecendo-se a pressão da demanda, interna e externa, por gêneros agropecuários, e considerando-se a tecnologia utilizada, uma fórmula agroambiental determinaria a área ideal, na escala do tempo, a ser incorporada à fronteira agrícola do país. Seria nosso desmatamento inteligente: o ponto de equilíbrio entre a produção rural e a preservação ambiental.
Poder360