domingo, 3 de fevereiro de 2019

"Reformar para crescer mais", editorial do Estadão

O Brasil continuará correndo atrás de seus vizinhos em 2023, um ano depois de concluído o mandato do presidente Jair Bolsonaro, segundo as projeções do Fundo Monetário Internacional (FMI). Isso ocorrerá se o governo for incapaz de elevar a capacidade produtiva e o potencial de crescimento da economia brasileira, estimado em pouco mais de 2% ao ano. 
A reforma da Previdência será uma condição essencial, mas outros passos serão indispensáveis para tornar o País mais dinâmico. Esse recado foi passado muito claramente pelo diretor do Departamento do Hemisfério Ocidental do FMI, Alejandro Werner, ao apresentar, há poucos dias, as estimativas atualizadas para a região.
A economia brasileira deve crescer 2,5% neste ano e 2,2% no próximo, de acordo com as novas projeções. O País continuará mais lento que vários países da região. Os novos números estimados para o Chile são 3,4% em 2019 e 3,2% em 2020. Para a Colômbia, 3,3% e 3,6%. Para o Peru, 3,8% e 4,1%. Estes países crescem mais que o Brasil há vários anos e sempre estiveram na frente do Brasil desde o primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff.
Essa atualização dos cálculos é normalmente publicada em janeiro. Houve poucas mudanças em relação ao cenário divulgado em outubro, na reunião anual do Fundo. O quadro ficou mais sombrio para o conjunto, com a América Latina e o Caribe prejudicados pela piora das perspectivas globais. No caso do Brasil, a estimativa para 2019 foi elevada de 2,4% para 2,5%, enquanto a projeção para 2020 caiu 0,1 ponto de porcentagem.
O novo quadro atualiza os números deste ano e do próximo. No cenário divulgado em outubro, as estimativas se estendiam até 2023 e, de modo geral, as mudanças foram muito limitadas. No quadro de outubro, o Brasil de 2023, com crescimento de 2,2%, continuará perdendo a corrida para o Chile (3%), a Colômbia (3,5%), o Paraguai (4,1%), o Peru (4%) e o Uruguai (4%). Livre da crise, a Argentina também terá desempenho melhor que o do Brasil, avançando 3,2%.
As estimativas para 2019 e 2020, no caso do Brasil, contêm alguns pressupostos positivos e muito importantes. Os autores do quadro tomaram como hipótese um avanço significativo no ajuste das contas públicas. Isso inclui a aprovação da reforma da Previdência ou, como alternativa, medidas com potencial para garantir a preservação do teto de gastos.
"A reforma da Previdência, como já afirmamos no passado, é um dos elementos-chave para conduzir as finanças públicas brasileiras a um padrão sustentável", disse Werner. Sustentabilidade inclui a contenção da dívida pública, superior, pelo critério do FMI, a 80% do Produto Interno Bruto (PIB). Pelo critério brasileiro (sem os títulos do Tesouro detidos pelo Banco Central), a dívida correspondia em novembro a 77,3% do PIB.
É uma dívida muito alta, supera os padrões encontrados na maioria dos países emergentes e tem potencial para levar o País a uma crise de solvência pública. Para frear o endividamento crescente, o governo terá de conseguir superávit em suas contas primárias e criar uma folga para pagar pelo menos os juros vencidos. Isso dificilmente ocorrerá antes de 2023, segundo especialistas.
Werner chamou de bem-vinda a agenda de reformas do presidente Bolsonaro, citando-o nominalmente, mas enfatizou também a importância de outros itens da agenda, como a abertura da economia e o aumento da relação entre o investimento e o PIB, muito baixa há vários anos. A pauta do governo, acrescentou, é importante para criar contas públicas sustentáveis e também para elevar o potencial de crescimento econômico. 
Por enquanto, esse potencial está limitado a algo próximo de 2,2% ao ano, como indicam as estimativas do FMI e de outras instituições. O baixo potencial de geração de riquezas é também um entrave à criação de empregos e à difusão do bem-estar. Condição para corrigir esse quadro, o programa de ajustes e reformas é muito mais que um abstrato desafio contábil. É uma condição essencial para o enriquecimento do País.