quinta-feira, 10 de janeiro de 2019

Será que o HDL, conhecido como o 'bom colesterol', é tão bom assim?

Para definir os níveis saudáveis de HDL e LDL é necessário observar o histórico familiar e outros problemas de saúde que o paciente tiver Foto: GRACIA LAM / NYT
Para definir os níveis saudáveis de HDL e LDL é necessário observar o histórico familiar e outros problemas de saúde que o paciente tiver Foto: GRACIA LAM / NYT

Eu costumava ficar toda feliz porque o nível do colesterol HDL, considerado "bom", era alto no meu sangue, consequência mais que provável da minha dedicação à atividade física diária. Afinal, o HDL, sigla (em inglês) para lipoproteína de alta densidade, age como um "limpador" arterial, removendo o colesterol dos vasos sanguíneos e preparando-o para a expulsão do organismo.

Um amplo estudo sobre a substância no soro sanguíneo há tempos a associa à proteção contra doenças coronárias e AVCs; portanto, o que poderia haver de ruim nessas grandes quantidades?
Hoje sei que como tantas outras coisas boas na vida pode haver, sim, excesso dessa proteína, ainda que extremamente útil – e as melhores evidências disponíveis mostram que a maioria de nós se veria melhor se tivesse como objetivo níveis moderados dela no sangue.
Uma série de estudos globais, grandes e pequenos, mostra que a relação dos níveis de HDL com as doenças cardíacas, e até com a mortalidade em geral, forma uma curva em forma de "U": escasso e em excesso, o lipídio sanguíneo está, em média, associado a um risco elevado de problemas coronários, câncer e morte prematura.
Embora os cardiologistas por enquanto só possam presumir o motivo por que os altos níveis da proteína possam incorrer em risco para a saúde, a descoberta reforça a importância de se concentrar menos no colesterol "bom" e se preocupar mais com o "ruim", ou seja, o nível de LDL, ou lipoproteína de baixa densidade, que ainda é excessivamente alto em pelo menos um terço dos americanos adultos.
Essas conclusões, entre outras, estão fazendo os médicos repensar o tratamento para pacientes que tenham alto risco de desenvolver um ataque cardíaco, AVC ou outro problema cardiovascular grave.
- O combate do colesterol alto não tem um formato único; é preciso adequá-lo a cada paciente - afirmou o reitor do American College of Cardiology, dr. C. Michael Valentine, sobre as novas diretrizes divulgadas por sua organização e pela American Heart Association, que enfatizam a importância do tratamento personalizado, e não apenas de receitas generalizadas baseadas somente nos testes dos exames de sangue.
- Desde que o guia foi lançado, em 2013, descobrimos ainda mais coisas sobre novas opções de tratamento e quem pode se beneficiar delas - explica o médico. Os especialistas também perceberam que, na maioria dos casos, não é necessário que os exames sejam feitos em jejum, o que não deixa de ser um alívio tanto para os pacientes como para seus médicos.
Quando o nível alto de colesterol é confirmado, a nova norma aconselha a não levar em conta apenas os fatores de risco tradicionais, como o fumo, a hipertensão e o nível de açúcar no sangue, na hora de decidir quem e como tratar.
Nem todo mundo que apresenta colesterol alto precisa tomar remédio para diminuir o volume dessa gordura nociva; de fato, a menos que os índices de LDL sejam estratosféricos ou a pessoa tenha uma doença cardíaca conhecida, o tratamento deve começar com uma mudança de estilo de vida, ou seja, uma dieta benéfica ao coração, exercícios físicos e, se necessário, emagrecimento. Somente se essas opções não conseguirem reduzir os níveis da substância é que se deve apelar para os medicamentos.
As organizações recomendam também que, além dos fatores de risco cardíaco tradicionais, devem ser levados em consideração o histórico familiar, a etnia e transtornos como síndrome metabólica, doenças renais crônicas, processos inflamatórios, menopausa precoce e até hipertensão relacionada à gravidez.
Se, ainda assim, o médico não tiver certeza dos pacientes aos quais indicar remédios para redução do colesterol, o novo guia sugere que se proceda à avaliação de cálcio nas artérias coronárias, obtida mediante um raio X especial que mede o volume do elemento na placa existente nos vasos que alimentam o coração.
Na verdade, ninguém deve esperar até chegar à meia-idade para se preocupar com o risco de doenças cardíacas. A nova diretriz alerta para o fato de que os males cardiovasculares se desenvolvem ao longo da vida; um alto nível de colesterol em qualquer idade tem um efeito acumulativo que aumenta gradualmente os riscos – e é por isso que sugere que é interessante fazer uma avaliação em crianças de até dois anos, se houver na família casos de doenças cardíacas ou de colesterol alto.
Em outros casos, os exames devem ser feitos entre os nove e os onze anos, e novamente entre os 17 e os 21. Embora não haja recomendações de medicamentos específicos para jovens que tenham colesterol alto, a adoção de um estilo de vida saudável desde a primeira infância pode reduzir os riscos de doenças coronárias e AVCs.

Quais são os níveis saudáveis de HDL e LDL?

 A resposta depende do histórico familiar e dos outros problemas de saúde que o paciente por acaso tiver.
O dr. Marc Allard-Ratick, da Faculdade de Medicina da Universidade Emory, em Atlanta, que estudou a relação entre o HDL e o risco de enfarte ou de morte por doença cardiovascular, me disse que o índice entre 40 e 60 mg/dl é "o ideal, pois se encontra no ponto mais baixo da curva em 'U', ou seja, quando há menor risco para a saúde".
- Um nível muito baixo de HDL, menos de 30 mg, por exemplo, é sinal de que a saúde da pessoa não vai bem; o mesmo se estiver acima de 70 mg, e aí é um risco a mais para quem já tem alguma doença cardíaca ou o risco de desenvolvê-la.
- A substância não funciona tão bem em pessoas que já não são saudáveis, que sofrem de alguma doença cardiovascular. Na verdade, é um marcador muito mais complexo que o LDL para esse tipo de mal, mas não sabemos quanto pode auxiliar ou prejudicar em longo prazo.
Por isso, até que se saiba mais sobre o funcionamento do HDL em níveis altos, tanto ele como outros especialistas recomendam uma postura do tipo "melhor prevenir que remediar", evitando elevar o nível da lipoproteína acima de 60 ou 70 mg à base de remédios, principalmente aqueles que já têm doenças cardiovasculares.
- No estudo que fizemos com 5.500 pacientes de alto risco, notamos uma associação positiva da mortalidade por todas as causas com níveis de HDL iguais ou superiores a 80 mg - revela Allard-Ratick.
Entretanto, o nível de LDL conta uma história bem diferente, pois essa é uma substância que facilita o depósito de placas nas paredes das artérias, obstrução que eventualmente pode levar a um enfarte ou AVC.
- Com o LDL, não há meio-termo; quanto mais alto, pior - informa Allard-Ratick.
A recomendação atual é a de que o nível do colesterol "ruim" fique abaixo de 100 mg/dl para as pessoas saudáveis, e abaixo de 70 mg para aquelas que sofrem de doenças cardíacas ou têm grandes chances de desenvolvê-las.
Jane E. Brody,  New York Times