Talvez nem o Zico lembre. Em 1979, no Estádio Caio Martins, em Niterói, o craque do Flamengo marcou um gol, depois de, na corrida, fintar o goleiro com um drible de corpo, sem tocar na bola. O lance imediatamente recordou aos torcedores a imortal jogada de Pelé em cima do goleiro uruguaio Mazurkiewicz, na Copa de 1970. Ou seja, Zico teria feito o que Pelé tentou e não conseguiu. O adversário era o modestíssimo ADN, mas pouco importa: a mágica havia sido recuperada.
Isso é que é fascinante no futebol, um jogo de repetição que jamais se repete da mesma maneira. O objetivo puro e lógico é fazer com que a bola passe a linha de gol. O processo, no entanto, cria uma espécie de memória esportiva: chutes, passes e dribles atávicos. Crianças que, recém apresentadas a um campinho society, arriscam lançamentos à Jair Rosa Pinto, bicicletas à Leônidas, folhas secas à Didi, elásticos à Rivelino.
Quantos desses meninos e meninas não estão, agora, imitando Messi, num esforço de ficção científica para transmudar-se em pulga atômica? O argentino do Barcelona também teve seu momento "déjá vu": em 2007, ele recebeu passe de Xavi e arrancou pela direita em velocidade, com a bola colada no pé, deixando quatro adversários do Getafe para trás antes de tocar para as redes. A costura da jogada lembra demais o golaço de Maradona diante da Inglaterra. Detalhe: quando Maradona assombrou o mundo na Copa de 1986, Messi nem havia nascido.
Mas, se você se chama Messi, deve inventar, e não apenas fazer igual. Semana passada, em partida contra o Atlético de Madri, ele aplicou um dos dribles mais geniais da história. Dominou de cabeça, protegeu e matou a bola no chão e, meio de calcanhar, deu por baixo das pernas --um "caño", dizem os argentinos-- do pobre Filipe Luís.
Folha de São Paulo