(Cristiano Mariz/VEJA)
Diante de dois fatos relevantes do noticiário nacional de 6 de novembro de 2018, para não esquecer, é inevitável reconhecer a atualidade do pensamento do ex-deputado Ulysses Guimarães, sobre o Político e a Sorte: De manhã, em Brasília, a comemoração dos 30 anos da Constituição de 1988, no Plenário da Câmara, com a presença do presidente eleito Jair Bolsonaro – ainda convalescente dos efeitos da facada que recebeu durante ato público de campanha, em Juiz de Fora (MG). À tarde, em Curitiba, a entrevista coletiva do juiz Sérgio Moro, homenageia a Imprensa e fala do futuro, ao deixar a magistratura, e sair do comando da Lava Jato, para assumir, com poderes inimagináveis, o Ministério da Justiça e da Segurança do governo à caminho.
Ulysses, senhor da Constituição dita cidadã, e campeão da resistência democrática em anos temerários da história do País, dizia: “a sorte faz parte da carreira do político vitorioso. Há político azarado”, – registrou o notável ex-presidente da Câmara dos Deputados, a quem, a bem da verdade, não se pode considerar exatamente um homem de sorte, (a deduzir, entre outros fatos, pela sua trágica morte, no desastre aéreo no qual desapareceu, sem que seu corpo tenha sido encontrado.“Ficou encantado no fundo do mar”, escreveu Luiz Fontana, ex-blogueiro e inspirado poeta de Marília (SP).
O audaz timoneiro da democracia dizia, sobre o destino do político azarado: “chove no dia de seu comício, dá defeito no microfone na hora em que vai falar, e o bêbado – o inevitável bêbado postado sempre à frente do palanque – arrasa seu discurso com apartes hilariantes. Tão desastrado que cai de costa e quebra o nariz. Napoleão, antes de entregar o bastão de marechal a um de seus generais, investigava se tinha sorte”. Na mosca!
Olha o exemplo da imagem improvável (para muitos, incluindo este jornalista) até bem pouco tempo: na Mesa solene da celebração dos 30 anos da Carta Magna de 88, Jair Messias Bolsonaro, capitão reformado do Exército, esquentado deputado por quase 28 anos circulando na Casa (para dizer o mínimo), volta a Brasília renascido, pela primeira depois de eleito presidente. É o centro das atenções, a face mais buscada pelas câmeras, a figura que mais desperta atenção e interesse – nos sinais de poder e nas palavras – dos presentes ao ato e dos milhões de telespectadores no País.
Sentado ao lado de Michel Temer, em ocaso de mando no Planalto, do chefe atual do Congresso, Eunício Oliveira – recusado pelas urnas na tentativa de reeleição, mas ainda aprontando antes de voltar para o Ceará – , do atual mandarim da Câmara, deputado reeleito Rodrigo Maia, e do onipresente ex-presidente José Sarney. Além da dama de ferro da Procuradoria Geral da República, Raquel Dodge, que faz advertências mal veladas, em sua fala, em defesa da Constituição, e do camaleônico chefe do Supremo Tribunal Federal, ministro Dias Toffoli, que aproveita a oportunidade para propor um novo pacto de elites no poder, a título de dar governabilidade ao mandatário recém eleito, legitimado nas urnas por quase 58 milhões de votos.
É Jair Bolsonaro quem arremata tudo em rápidas palavras, mas de máxima precisão, ao afirmar que na democracia não há outro norte além da Constituição. Sobre o outro fato relevante do dia 6, a exemplar coletiva à imprensa do juiz Sérgio Moro, fica adiado. Neste caso, porém – uma vez que o magistrado afirma que não fará política na poderosa pasta da Justiça, nem pretende disputar nenhum cargo eleitoral na vida, mesmo sendo, desde já, o mais visível nome à sucessão de Bolsonaro em 2022 – a sorte, pode ser atribuída à Nação ou, mais uma vez, ao político capitão Jair Bolsonaro. A conferir.
Vitor Hugo Soares é jornalista, editor do site blog Bahia em Pauta
Com Blog do Noblat, Veja