Manobra pode abrir estatais para dirigentes partidários. Eletrobrás perde R$ 1,6 bi, mas mantém benefícios. Rio dá R$ 128 bi dos royalties para aposentadorias. Gasto supera arrecadação em 14 Estados e no DF.
Essa pequena amostra das manchetes dos principais jornais do País nos últimos dias mostra o gigantismo do Estado no Brasil. Excesso de pessoal, gastos com aposentadorias, remuneração acima da capacidade de pagamento, falta de planejamento de despesas e ativos mal geridos explicam a crise por que passam todos os governos, federal, estaduais e municipais. Por isso, é urgente uma reforma do Estado em todos os níveis da administração pública.
O futuro ministro da Economia sempre colocou a privatização como prioridade. A criação de uma Secretaria de Privatização ratifica seu discurso. Boa iniciativa. A desestatização, que pode ser feita não só através da venda de empresas, mas também por meio de dissoluções e fusões, sofreu no governo Temer as consequências de uma governança mal definida.
Ainda assim, o excelente trabalho da Secretaria de Empresas Estatais (Sest) permitiu muitos avanços: temos 20 estatais a menos; estatutos foram modificados aprimorando a gestão e transparência; o número de pessoal diminuiu; e lucros reapareceram em algumas delas. Ainda falta muito. São 138 estatais no governo federal e mais de 400 no País todo.
A atuação do Estado na atividade econômica está muito bem delimitada pela Constituição Federal, que em seu art. 173 estabelece que apenas em casos de relevante interesse coletivo, definidos em lei, e imperativos à segurança nacional ela se justifica, além de, obviamente, dos monopólios constitucionais. Não há setores “estratégicos”. A decisão sobre o que deve ser privatizado também não depende dos resultados da gestão. Isso é um mito. Uma boa administração é obrigação do gestor público, nada mais que isso.
Apesar da crise que os Estados atravessam, os governadores ainda não falam em privatização. Mesmo o eleito em Minas Gerais, o mais liberal dentre eles, já avisou que venda da Cemig só no fim do governo, ou seja, em plena campanha pela reeleição. A ver. Há muitos ativos estaduais que podem ser alienados. São empresas de energia, saneamento ou bancos.
A conversa dos Estados com a União começou pelo pedido de mais uma renegociação da dívida e boa parte dos recursos arrecadados com o leilão da cessão onerosa. O Estado do Rio de Janeiro fez um acordo com o governo federal, se comprometendo, como contrapartida, com a venda da Cedae. Mas bastou uma leve sensação de alívio nas contas para que os políticos locais se esquecessem do compromisso. Fica como aprendizado para as inevitáveis negociações que vão ocorrer entre os secretários de Fazenda estaduais e o Tesouro.
Privatizar não é fácil. Demanda firmeza. No imaginário popular uma estatal é patrimônio público, ainda que péssimos serviços sejam prestados, é apenas um dos obstáculos. O pior mesmo é vencer a união de políticos, sindicalistas e fornecedores para sugar o máximo de uma empresa pública.
Mesmo com a Lei das Estatais, indicações políticas ainda são recorrentes. Vivi isso de perto como conselheira de administração da Eletrobrás. Foram cerca de 500 nomes indicados para muitos cargos desnecessários, que numa gestão privada já teriam sido eliminados. Mas as dificuldades das estatais de se protegerem do uso político são comuns a todas. Não é uma exclusividade da Eletrobrás.
Políticos não se conformam facilmente. Manobra recente do Congresso colocou um jabuti em um projeto de lei sobre outro tema revogando dispositivo da lei das estatais que veta nomes com vínculos partidários. Esse mesmo Congresso barrou o projeto que facilitava a venda de uma subsidiária da Eletrobrás, a Amazônia Distribuidora, a pior e mais endividada concessionária de distribuição do País. E mesmo sabendo disso, o senador Eduardo Braga (PSDB/AM) liderou o engavetamento do projeto. Para os usuários do serviço de seu Estado, nada; já para funcionários e fornecedores, tudo.
As declarações de Bolsonaro fazendo restrições à venda da Eletrobrás, Banco do Brasil, Caixa e Petrobrás são preocupantes. O governo federal tem de dar o exemplo e ajudar os Estados com sua expertise e recursos técnicos.
O Estado brasileiro está obeso. Pequenas dietas não adiantam mais. Chegou a um ponto em que só uma operação bariátrica resolve.
*ECONOMISTA E ADVOGADA
O Estado de São Paulo