O economista Paulo Guedes, assessor do presidenciável Jair Bolsonaro (PSL) e escolhido para ser seu ministro da Fazenda, caso eleito, disse ao GLOBO que procurou lideranças políticas, inclusive o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), para discutir sobre a ideia do chamado “voto programático de bancada”, que daria “superpoderes” a partidos. A informação foi revelada pelo colunista Ascânio Seleme. Pelo sistema, todos os votos de uma bancada seriam computados integralmente a favor de um projeto se mais da metade dos parlamentares daquele partido votarem a seu favor. Rodrigo Maia nega que tenha conversado sobre o assunto com Guedes.
Na entrevista abaixo, Paulo Guedes diz ainda que seu assessorado o desautorizou a ter conversas sobre políticas desde então, mas que ele voltou a mencionar o assunto em pelo menos duas reuniões com investidores, uma com brasileiros e outra com estrangeiros, por acreditar que, depois do segundo turno, a classe política voltará a apostar na ideia. Leia abaixo os principais trechos.
Como surgiu a ideia do “voto programático”?
Isso aconteceu há seis meses. Conversei com mais gente ainda. Assim que o Jair Bolsonaro me chamou para fazer o programa econômico, a primeira coisa em que eu pensei foi em governabilidade, como vamos aprovar um programa econômico. Estava convencido de que acabou a velha política na base de toma-lá-dá-cá. Essa é uma das razões por trás do sucesso da candidatura do Bolsonaro. Como eu poderia instrumentalizar uma reforma política que permitisse governabilidade em novas bases? Em vez da compra de votos mercenários no varejo, teria que ser a sustentação parlamentar com base em programas partidários.
Como funcionaria o sistema?
Quando comecei a buscar conversas com lideranças políticas para costurar uma aliança de centro-direita na política em torno de um projeto liberal na economia, o que o Rodrigo Maia me disse foi o seguinte: “Paulo, isso já existe. Isso se chama fechamento de questão com fidelidade partidária”. (Pode ser usado) toda vez que não é uma questão de foro íntimo. Se for questão orçamentárias, operacionais, você precisa, nessas ocasiões, recorrer, então, a esse tipo de coisa.
Mas hoje isso é uma decisão do partido...
Claro. Na época, falei que, quem sabe, uma reforma política, então, tem que ter só duas cláusulas. Uma cláusula de desempenho, essa atual cláusula de barreira, se fosse mais inclinada um pouquinho, podia limitar em só quatro a cinco partidos lá na frente. E a outra era sobre essa (do voto programático). Esse voto programático significa que os partidos teriam que trabalhar em torno de programas, e não em torno de acordos mercenários.
A reunião foi há seis meses, mas voltou à tona durante a reunião com investidores?
O que eu disse foi o seguinte: “Pessoal, pelas conversas que tive meses atrás, todo mundo acha que faz sentido essa aliança (de centro-direita)”. Aí eu manifestei meu otimismo na reunião, relatei esse caso e disse: “Acho que isso vai acontecer de novo logo depois que tiver o primeiro turno”. Agora, isso é uma percepção de um sujeito que está confessando que não entende nada de política.
Como o Bolsonaro viu a ideia do voto programático?
O Bolsonaro disse: “Não se preocupa com esse negócio de política, que você não entende disso”
Ele foi favorável?
Não, ele até brinca que convenceu o Paulo Guedes (de que não fazia sentido adotar o voto programático). Isso (a reunião há seis meses) foi muito antes do Jair Bolsonaro me convencer que eu não entendo nada de política.
É possível que seja aplicado em um eventual governo?
Isso não faz parte do cardápio dele. Ele deixou claro: “Não converse nada com ninguém sobre política”. Eu senti que essa aliança de centro-direita na política por um programa liberal na economia é uma ideia que tem muito apelo na classe política, porque o Brasil foi governado 30 anos pela centro-esquerda, que subiu impostos, aumentou o tamanho do Estado.
Como fica a relação após a polêmica do imposto sobre movimentações financeiras, como a CPMF?
Da mesma forma que é natural que ele fale assim: "Não é bem assim esse negócio de política, não, Paulo, o negócio é diferente". É natural também que, nesse negócio de economia…
E a questão de reforma tributária? O senhor disse que estava dividido entre duas propostas, a do Imposto sobre Valor Agregado (IVA) e o sobre movimentação financeira.
Quem vai decidir é o presidente. Não é a hora ainda.
Marcello Corrêa, O Globo