Um país sério apoia a polícia e não apoia bandidos. Eu defendo minha arma. O bicho vai pegar. Quero voto em cédula de papel. Vote em Gil Diniz, carteiro reaça. Moderação na defesa da verdade é serviço prestado à mentira.
São dizeres estampados em cartazes, camisetas e placas na convenção estadual do PSL (Partido Social Liberal), na manhã deste domingo (5), em São Paulo. A última frase é uma citação de Olavo de Carvalho, filósofo de direita que apoia o deputado federal Jair Bolsonaro, candidato à Presidência pelo partido.
Com a presença do próprio Bolsonaro, o evento atraiu centenas de apoiadores, em que pese a manhã fria e nublada e a localização de difícil acesso pelo transporte público. Em um auditório lotado de bandeiras e balões verdes e amarelos no Clube Guapira, no bairro do Jaçanã, região periférica da zona norte da capital, o partido endossou a candidatura do paulista Major Olímpio ao Senado Federal e de Eduardo Bolsonaro, filho de Jair, a deputado federal por São Paulo.
Os apoiadores vieram, em sua maioria, da periferia de São Paulo e de cidades do interior do estado. Vestiam camisetas verde-amarelas ou estampadas com o rosto de Bolsonaro, à venda no local por até R$ 40. "Caro, mas vale a pena para mostrar o apoio", nas palavras de um comprador. Outro preço pago sob alguns protestos foi o do pão na chapa, por R$ 4 na lanchonete do clube. A fila para o café da manhã antes do evento chegava a dezenas de pessoas.
Dinheiro, inclusive, é um assunto recorrente entre os apoiadores, que relatam se virar com pouco para acompanhar os palanques do candidato pelo país. Um dos gritos de torcida mais repetidos foi "eu vim de graça", repudiando movimentos sociais de esquerda e sindicatos que, na versão dos bolsonaristas, pagam para militantes irem a seus eventos.
A grande maioria dos entusiastas do ex-coronel ouvidos pela reportagem já votou no PT em eleições passadas, mas se arrependeu. "Eu vim do Nordeste, e lá a gente nasce com a estrela do PT tatuada na testa", afirma Josenilton, baiano morador de Guarulhos, cidade na região metropolitana de São Paulo. "Depois, eu vi que a experiência dos petistas deu errado. Agora meu trabalho é convencer meus parentes da Bahia, que são ultradoentes, acham que a Dilma é uma coitada". Ele comemora que o irmão já foi convertido e curtiu a página do "Mito" no Facebook.
Eduardo Portugal, apoiador de Campinas (88 km da capital), diz que empresários, como ele, pagaram o preço da crise e agora têm que se aproximar de um candidato que queira mudar a situação e que não defenda a intervenção do Estado na economia. "Não me interessava muito por política antes, mas já votei no PT", confessa. Sua insatisfação é difusa, como a de outros eleitores ouvidos pela ÉPOCA. "Tem que mudar tudo que está aí" é o sentimento que une os grupos de militantes, com demandas das mais diversas. Outro ponto em comum é a simpatia que nutrem pela eloquência dos discursos do capitão da reserva.
Um militante de Sumaré (120 km de São Paulo) conta que já recebeu Bolsonaro no aeroporto em Campinas (SP) e ajudou a erguer um outdoor para o candidato em seu bairro, que depois foi incendiado. "É difícil mudar todo o sistema, lutar contra os bancos, a mídia, a política tradicional", afirma. "Mesmo conseguindo voto, depois ainda tem a urna eletrônica [cuja segurança é questionada pelo candidato] e o Supremo Tribunal Federal para tentar barrar o Bolsonaro."
Jair Bolsonaro chegou por volta das 10h, recebido com gritos fervorosos de "mito". Logo em seguida, uma criança vestida com farda de policial militar fez as honras ao candidato no palco. "Quero saudar o capitão Jair Bolsonaro, futuro presidente do Brasil", afirmou, com voz esganiçante. O menino depois entoou todo o hino nacional, para delírio dos presentes, que empunhavam seus celulares no alto para transmitir a cantoria em tempo real nas redes sociais.
Em seu discurso, Eduardo Bolsonaro disse que era preciso trabalhar para mudar o Estatuto do Desarmamento e para que as crianças pudessem continuar sonhando em ser policial militar. O tema da segurança pública foi o mais citado pelos candidatos do PSL e de longe o mais presente nas manifestações dos militantes que estavam lá. A plateia contava com policiais, militares e simpatizantes das corporações.
De acordo com Gustavo, voluntário de campanha de Jundiaí (47 km de São Paulo), os eleitores de Bolsonaro não querem a volta da ditadura no Brasil. "A democracia é soberana.
O que o povo quer é a volta da rigidez que tinha na ditadura, quando bandido ia para a cadeia", afirma.
O clima entre os eleitores é militarista e predominantemente masculino, apesar da presença de mulheres. Para Sonia Homrich, 69, o desinteresse das eleitoras por Bolsonaro pode ser fruto de "falta de inteligência e patriotismo". "Os maiores problemas do Brasil hoje são o globalismo e a corrupção, e o candidato representa a luta contra essas duas coisas", diz a professora, que mora no Alto da Lapa (zona oeste de São Paulo). "Então, de verdade, não faço a menor ideia de por que mais mulheres não o apoiam."
Em pesquisa Datafolha realizada em junho, na situação em que o ex-presidente Lula (PT) é considerado no páreo, Bolsonaro atinge 23% entre os homens, enquanto tem apenas 11% entre as mulheres, uma diferença notável na plateia do evento neste domingo.
A adolescente Maria Eduarda Teixeira Bueno, 17, de Itaquera (zona leste de São Paulo), especula: "Talvez tenha menos mulheres aqui porque a voz dos homens é mais forte na política". A garota faz parte do projeto Patrulha Mirim, da Polícia Militar, e fazia parte de um pequeno batalhão de vinte crianças, de farda e quepe marrom. Ela ainda não tirou título de eleitor, mas, se tivesse tirado, confessa que não votaria em Bolsonaro. "Acredito em igualdade entre homem e mulher", diz.
Outra apoiadora, questionada sobre o motivo do comparecimento menor das mulheres, negou que houvesse menos mulheres do que homens no evento, ficou irritada e não quis mais dar entrevista.
Uma das esperanças de Bolsonaro para atrair mais eleitoras era ter a advogada Janaína Paschoal como vice. Após a recusa de Janaína, porém, foi escolhido o general da reserva Hamilton Mourão (PRTB), presente na convenção estadual do PSL. O anúncio, antecipado no evento, veio para a frustração de um grupo de monarquistas de Taubaté (140 km de São Paulo), que, cobertos com bandeiras do Brasil imperial, pediam que o príncipe Luiz Philippe de Orléans e Bragança, tataraneto de Dom Pedro II, fosse indicado a vice de Bolsonaro.
"Viemos de carro, então só couberam três [monarquistas], mas tem umas trinta pessoas no nosso grupo", diz Márcio Daniel Guilhermino de Andrade, médico paulista vestido impecavelmente de terno cinza bem-ajustado, sapato social e barba feita. "O Bolsonaro é simpatizante da monarquia, apoiador, mas viemos para apoiar o Luiz Philippe." Enquanto falava com a reportagem, Márcio preparava uma transmissão ao vivo na página Império do Brasil, que tem 1,6 mil seguidores no Facebook. Apesar da caravana reduzida, eles não eram os únicos a ostentar o brasão do Império na convenção.
Também havia a cota de super-heróis entre os apoiadores. Militantes vestidos de Capitão América, Homem-Aranha, Mulher Maravilha e Batman circulavam pela plateia posando para fotos e entretendo as crianças, e receberam uma fila de fãs até uma hora depois de o evento acabar. Outro disputado aos tapas para aparecer em selfies foi o ator Alexandre Frota, cercado de seguranças. Frota e seus acompanhantes vestiam camisetas pretas com uma caveira verde e amarela, um ícone adotado pelo ator em redes sociais, onde agora se apresenta como "soldado de Bolsonaro".
Natáluia Portinari, Epoca