A presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Cármen Lúcia, marcou para o próximo dia 14 a retomada do julgamento da ação que discute se a Polícia Federal (PF) pode firmar acordos de delação premiada. A decisão foi tomada após o GLOBO questionar Cármen sobre a demora na conclusão do julgamento, iniciado em dezembro.
A indefinição atrasa um dos inquéritos que investiga o presidente Michel Temer. O marqueteiro Duda Mendonça se recusou a prestar depoimento na investigação enquanto o ministro Edson Fachin não decidir se homologará um acordo de delação firmado por ele com o PF. Fachin, por outro lado, está esperando a conclusão do julgamento para tomar uma decisão.
O julgamento começou no dia 13 de dezembro do ano passado. Até agora, sete dos 11 ministros votaram. Apenas Fachin é contra a polícia firmar acordos. E somente o ministro Marco Aurélio Mello é totalmente a favor, dependendo apenas da homologação do Judiciário. Os demais atestam a legalidade desse tipo de delação, mas impõem restrições, como, por exemplo, a necessidade da anuência do MP.
A ação em análise no STF foi proposta em 2016 pelo então procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Para ele, somente o MP pode receber delação. Janot pediu que os acordos já feitos com a polícia tivessem sua validade mantida, para não atrapalhar investigações. A atual procuradora-geral, Raquel Dodge, concorda.
Em petição enviada ao STF, Duda reconhece que o objeto do inquérito, o repasse de R$ 10 milhões da Odebrecht para o grupo de Temer, guarda relação direta com o conteúdo da delação que fez no início do ano passado com a Polícia Federal. Afirma ainda que gostaria de colaborar com a investigação. Mas argumenta que, por força de lei, não pode falar sobre o assunto até a decisão final do STF sobre a delação dele.
Duda foi o marqueteiro da campanha do presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaf, nas eleições para o governo de São Paulo em 2014. No acordo de delação que fez com a PF, o marqueteiro admite ter recebido R$ 6 milhões da Odebrecht pelos serviços prestados a Skaf.
As declarações do marqueteiro coincidem com o que disse em delação o ex-diretor de Relações Institucionais da empreiteira Cláudio Melo Filho. Melo afirma que os R$ 10 milhões pagos pela Odebrecht ao grupo de Temer foi dividido: R$ 6 milhões foram pagos a Duda em nome da campanha de Skaf, e os R$ 4 milhões restantes foram entregues em endereços designados pelo atual ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha.
O caso remonta ao jantar no Palácio do Jaburu em 2014, narrado em detalhes na delação da empreiteira, em que o então presidente da companhia, Marcelo Odebrecht, afirma ter recebido o pedido de “contribuição” ao partido do então vice-presidente e candidato à reeleição na chapa de Dilma Rousseff.
Além de Temer e Eliseu Padilha, é investigado no inquérito o ministro de Minas e Energia, Moreira Franco. Os três são apontados como beneficiários da propina por seis delatores da Odebrecht. De acordo com a procuradora, os delatores da Odebrecht apontaram, “em declarações e provas documentais”, que Temer, Padilha e Moreira teriam recebido recursos ilícitos da empreiteira “em contrapartida ao atendimento de interesse deste grupo pela Secretaria de Aviação Civil”.
As informações de Duda são consideradas relevantes porque poderiam ajudar a polícia a completar o rastreamento do destino final de parte dos recursos. O pagamento de Duda pela campanha de Skaf seria uma das pontas contempladas com o volume mais expressivo da suposta propina da Odebrecht. Quando o caso veio a público, Temer confirmou o jantar no Jaburu, mas disse que todas as doações da Odebrecht ao MDB foram devidamente declaradas à Justiça Eleitoral.
Jailton de Carvalho, O Globo