sábado, 9 de junho de 2018

"A sensatez e o radicalismo", editorial do Estadão

Na terça-feira passada foi lançado em Brasília o manifesto Por um Polo Democrático e Reformista, que defende a união do centro político como uma maneira de viabilizar eleitoralmente uma candidatura presidencial comprometida com as reformas de que o País tanto precisa. Elaborado por 30 políticos e intelectuais de vários partidos – PSDB, MDB, PSD, PPS, PV e PTB –, o conteúdo do documento foi antecipado pelo Estado no mês passado.
“O manifesto é um chamado à consciência sobre a gravidade do momento atual e sobre as consequências profundas e duradouras que terão nossas ações e inações”, disse o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, em mensagem lida durante o lançamento. Entre as medidas propostas, o documento lista a reforma da Previdência, com adoção de um sistema único para servidores e trabalhadores da iniciativa privada, e a tributária, sem aumento de impostos. Propõe ainda a recuperação do caráter educacional do programa Bolsa Família.
Diante da atual situação do País, trata-se de uma iniciativa de grande relevância. Há grandes desafios que o próximo governo terá de enfrentar, como, por exemplo, o déficit previdenciário e a crise fiscal, e é imprescindível que os partidos minimamente comprometidos com o interesse público congreguem esforços em torno de um candidato responsável, que esteja distante das promessas populistas e, ao mesmo tempo, conquiste o eleitorado. 
Apesar de sua importância, o lançamento do manifesto não foi especialmente concorrido. Por exemplo, nenhum pré-candidato presidencial compareceu ao evento. É, sem dúvida, uma pena, pois poucas vezes na história política do País a sensatez e o compromisso foram tão necessários como agora.
Nestes tempos esquisitos, o que parece brilhar é justamente a atitude oposta, de quem deseja aparecer no cenário político com propostas demagógicas e radicais. O radicalismo de alguns políticos esconde uma enorme contradição. Dizem-se muito decididos a enfrentar os problemas nacionais, mas na realidade ficam apenas na superfície, com propostas simplistas para problemas complexos.
É o que faz, por exemplo, o deputado federal Jair Bolsonaro (PSC-RJ). No seu périplo pelo País, o sr. Bolsonaro apresenta-se como o único pré-candidato ao Palácio do Planalto realmente decidido a combater as graves questões de segurança pública. Suas propostas para o tema, no entanto, resumem-se a um discurso de confronto e violência, com a promessa de armar a população.
Em tese, uma atuação nesses moldes deveria desacorçoar o eleitorado, pois evidencia um profundo desconhecimento do pré-candidato em relação ao tema. Ou, o que seria pior, que o conhece, mas prefere ignorar sua complexidade com o que estaria exposta deliberada intenção de engabelar o público.
É urgente que o poder público, em todas as esferas, atue com mais determinação no combate à violência urbana e rural. No entanto, esse trabalho de resgate da lei e da ordem vai muito além de munir o cidadão com armas. Apenas para citar alguns exemplos, um novo patamar de segurança pública envolve cuidado com as fronteiras, melhor coordenação entre a União e os Estados – que são os responsáveis diretos pela segurança pública –, políticas adequadas para os presídios, um Poder Judiciário mais diligente, com o encerramento dos processos em tempo razoável.
Quem deseja se qualificar para concorrer à Presidência da República tem o dever de abordar, sem simplismos, as questões nacionais. Suas propostas devem conter, ao menos, a descrição de políticas factíveis e que enfrentem as causas dos problemas.
De certa forma, a disjuntiva que o eleitor terá de enfrentar na urna no dia da eleição – entre competência e responsabilidade, de um lado, e populismo e radicalismo, de outro – é desde agora apresentada aos partidos e aos políticos. Ainda que a sensatez e a racionalidade pareçam brilhar tão pouco, em contraste com alguns radicalismos, o País necessita urgentemente dessas qualidades. E é isso o que uma candidatura comprometida com o interesse público, sabendo entusiasmar e cativar o cidadão, deve expressar.