Dyelle Menezes

A entidade filantrópica recebeu recursos públicos, por meio do Fundo de Assistência Social do DF (FAS/DF), para atender crianças e adolescentes. A verba era repassada pela então Secretaria de Estado de Ação Social do DF (SEAS/DF).
De acordo com a equipe de auditoria do TCDF as notas fiscais apresentadas pela entidade possuíam diversas falhas. Entre os problemas estavam a emissão de notas fiscais sem autorização do GDF e sem conhecimento do responsável técnico pela escrita fiscal por parte da empresa, com dados cadastrais inexistentes ou iguais ao de outra empresa.
A notas fiscais também foram supostamente emitidas por mais de uma empresa que não coincidiam com os documentos fiscais originais. Além disso, empresas comunicaram à Secretaria de Fazenda que não emitiram as notas fiscais que foram utilizadas pela entidade para justificar os gastos realizados; outra afirmou que nunca cuidou da empresa em tela, ou seja, a própria empresa afirmou que as notas fiscais são falsas.
Ainda constam falhas como o fato das notas fiscais que não obedecerem à numeração sequencial, notas fiscais cujos sócios não foram localizados, com data retroativa, descrição de serviços genéricos e com a mesma grafia e notas fiscais nas quais o suposto objeto não faz parte do ramo de trabalho da empresa fornecedora, como, em um dos casos, em que trataria de material de papelaria, mas o ramo de atividade seria de fornecimento de tinta, cantoneira e vinho tinto.
Apesar das falhas apontadas pela equipe técnica, o TCDF defendeu a invocação de boa-fé da beneficiária e não considerou irregulares as contas. Para o relator, que teve o voto acompanhado pela maioria, não seria razoável exigir da beneficiária a verificação da validade dos documentos apresentados, tratando esses fatos como mera falha formal.
“Considerando os meios de checagem disponíveis à época e a ausência de conhecimento técnico e jurídico dos dirigentes, entendo que a aceitação das notas tidas posteriormente por inidôneas, não configuram tipicamente um erro de conduta praticado pelos dirigentes”, afirmou no voto o relator do processo, Manoel de Andrade.
De acordo com Andrade, o recebimento de boa-fé nas circunstâncias apresentadas, partira também do pressuposto da ausência de má-fé das empresas que apresentaram tais documentos que “retratavam a realidade dos serviços e mercadorias adquiridos”.
O conselheiro apontou ainda inexistirem evidências de que alguma das partes envolvidas tenha se favorecido pelas falhas incorridas. Outro ponto defendido por Andrade é que não há nos autos elementos que acarretem dúvidas acerca do cumprimento do objeto do convênio.
Para o secretário-geral do Contas Abertas, Gil Castello Branco, deveria vigorar a inversão do ônus da prova. “Os Tribunais de Contas não têm que provar que os recursos públicos foram mal aplicados ou desviados, mas o gestor e o beneficiário é quem devem comprovar que foram utilizados os recursos de maneira adequada e eficiente, principalmente, diante de tão graves indícios de irregularidades”, afirmou.
Outro caso
Outra decisão do Tribunal de Contas do DF também chama a atenção por contrapor a análise da equipe técnica. Os conselheiros do Tribunal isentaram da responsabilidade de ressarcir aos cofres públicos um servidor que utilizou certidão de tempo de serviço falsa. A autenticidade do documento foi recusada pelo INSS, que apontou não existir em seus arquivos menção a processo ou qualquer outra documentação relativa ao servidor.
Sem a certidão, não haveria como comprovar o tempo de serviço declarado, não sendo possível imaginar que o próprio servidor não soubesse onde trabalhou e quando. O interessado ingressou com pelo menos três ações judiciais e não obteve ganho em nenhuma delas.
Para Castello Branco, o que as decisões têm em comum é o estranho conceito de boa-fé adotado pelo TCDF e a chocante realidade que envolve os julgamentos dessas Cortes de Contas, que não são revistos por nenhum outro órgão ou instância, a não ser por eles mesmos.
Posição da Contas Abertas
O Contas Abertas espera que o MPC/DF provoque, ainda assim, a revisão desses julgados, perante o próprio TCDF ou na Justiça, para que não criem precedentes perigosos, em que documentos falsos sejam utilizados em processos que tramitam por uma Corte de Contas, sem qualquer consequência.