Preso na superintendência da Polícia Federal em Brasília, o senador Delcídio Amaral (PT-MS) segue um roteiro que já se tornou usual nos escândalos da era petista. Encrencado, o ex-líder do governo esperava obter a solidariedade dos amigos e companheiros. Ao sentir-se abandonado, ele ameaça contar segredos capazes de encrencar outras pessoas. O movimento tem o ritmo da chantagem, feita por alguém que espera obter proteção.
Delcídio irritou-se com o resultado da votação em que o plenário do Senado decidiu mantê-lo na prisão por 59 votos a 13, mais uma abstenção. Abespinhou-se também com comentário atribuído a Lula, segundo o qual ele teria se portado como um “imbecil” ao tentar comprar o silêncio do delator Nestor Cerveró. Essa observação, negada posteriormente por Lula, foi às manchetes nas pegadas da nota oficial em que o presidente do PT, Rui Falcão, escreveu que o partido “não se julga obrigado a qualquer gesto de solidariedade” com Delcídio.
Um amigo de Delcídio disse ao blog que ele tem razões para estar decepcionado. Contou que, nos últimos meses, o senador tornara-se interlocutor frequente de Lula. Conversavam amiúde, por telefone e pessoalmente. Nas palavras desse amigo, Delcídio “monitorava” os humores do pecuarista José Carlos Bumlai, o amigo de Lula que também foi preso nesta semana. Bumlai e Delcídio se conhecem do Mato Grosso do Sul.
Em depoimento a dois procuradores da República e um delegado federal, Delcídio disse ter tentado libertar o delator Nestor Cerveró por “razões humanitárias”. O interrogatório baseou-se no conteúdo de uma gravação feita por Bernardo Cerveró, em 4 de novembro, numa suíte de hotel em Brasília. Nela, ouvem-se as vozes de Bernardo, de Delcídio e do advogado Edson Ribeiro, que respondia pela defesa de Nestor Cerveró. A certa altura do interrogatório, perguntou-se a Delcídio sobre um trecho da conversa gravada em que ele diz que falou ou falaria com ministros do STF para obter, entre outras coisas, a liberdade de Cerveró.
Ouve-se Delcídio dizer na gravação: “Agora, […] eu acho que nós temos que centrar fogo no STF. Eu conversei com o Teori [Zavascki], conversei com o [Dias] Toffoli, pedi pro Toffoli conversar com o Gilmar [Mendes]. O Michel [Temer] conversou com o Gilmar também, porque o Michel tá muito preocupado com o [ex-diretor da Petrobras Jorge] Zelada, e eu vou conversar com o Gilmar também.”
Segundo notícia veiculada pela Globonews, os inquisidores pediram a Delcídio que falasse sobre a preocupação de Temer com Zelada, que está preso em Curitiba. O senador disse ter conhecimento de que Temer tem relação próxima com Zelada. Instado a qualificar a proximidade, Delcídio se absteve de responder. Temer preside o PMDB. Dos 18 senadores peemedebistas presentes à sessão em que o Senado avalizou a prisão de Delcídio, 16 votaram a favor da permanência do colega na cadeia —Edison Lobão (MA) se absteve e Renan Calheiros (AL), como presidente da Casa, não é dispensado de votar.
Ao farejar as segundas intenções de Delcídio, Temer apressou-se em responder. Por meio da assessoria, mandou dizer: “Em 2007, o senhor Jorge Zelada foi levado à Presidência do PMDB por estar sendo indicado para cargo na Petrobras. Nessa ocasião foi apresentado a Michel Temer. O presidente do PMDB não o indicou nem trabalhou pela sua manutenção no cargo. O presidente do PMDB nega qualquer proximidade com Jorge Zelada e repudia veementemente as declarações do senador Delcídio do Amaral.”