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Pedro Wongtschowski, novo presidente do Instituto de Estudos de Desenvolvimento Indutrial |
RAQUEL LANDIM - Folha de São Paulo
O engenheiro Pedro Wongtschowski, conselheiro e ex-presidente do conglomerado Ultra, que reúne empresas como Ultragaz, Ipiranga e Oxiteno, está preocupado com a falta de rumo do governo Dilma.
"Ainda temos três anos pela frente e tudo que vimos até agora é uma coleção de medidas de curto prazo", disse à Folha. "O governo está claramente a reboque dos acontecimentos."
Wongtschowski acaba de assumir a presidência do Instituto de Estudos de Desenvolvimento Industrial (Iedi), que reúne os maiores empresários do país. Ele diz que a crise da indústria é muito difícil, mas que o câmbio desvalorizado deve ajudar.
Para ele, o governo perdeu a mão nas desonerações tributárias do primeiro mandato de Dilma, que tentaram ajudar a indústria e ampliaram o rombo fiscal.
"Cada setor tem o direito de pleitear ajuda, mas cabe ao governo agir com cautela. Acredito que houve, sim, um certo exagero."
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Folha - O Brasil vive hoje duas crises: a econômica e a política. Qual é mais grave?
Pedro Wongtschowski - A crise econômica. Na medida em que houver algum sucesso no trabalho do ministro Joaquim Levy (Fazenda) e melhorar a perspectiva de longo prazo do país, a crise política também amaina.
Como o Levy pode ser bem sucedido num Congresso conflagrado?
Sou otimista. Acho que a racionalidade vai prevalecer e o Congresso vai se dar conta de que esse deficit fiscal enorme destrói o país, tira qualquer possibilidade de crescimento no médio prazo. Em algum momento, a classe política vai se dar conta da gravidade da situação. Infelizmente, isso ainda não ocorreu.
Sou otimista. Acho que a racionalidade vai prevalecer e o Congresso vai se dar conta de que esse deficit fiscal enorme destrói o país, tira qualquer possibilidade de crescimento no médio prazo. Em algum momento, a classe política vai se dar conta da gravidade da situação. Infelizmente, isso ainda não ocorreu.
Qual é a responsabilidade do Congresso e do Executivo na crise?
O poder Executivo não conseguiu formular uma política para o Brasil que gerasse uma onda de adesão e entusiasmo nacional. Eles deveriam propor uma plataforma de prazo mais longo, a partir de um consenso nacional mínimo, que permitisse gerar uma visão positiva e construtiva de futuro. Isso é uma tarefa do Executivo, mas não conseguiram fazer até agora.
O governo tem que estar adiante dos acontecimentos e está claramente a reboque, reagindo a situações de emergência. Isso não é papel do Executivo e não do Legislativo.
A presidente Dilma ainda tem condições de governar? Qual é a sua posição sobre o impeachment?
Não vou entrar nessa seara. Evidentemente, é importante que o governo melhore as condições de governabilidade, com uma estrutura de apoio no Parlamento. Mas, de novo, isso depende da formulação de uma política de prazo mais longo.
Ainda temos três anos de governo Dilma pela frente e até agora tudo que vimos é uma coleção de medidas de curto prazo para corrigir problemas conjunturais. São poucas medidas de prazo mais longo.
Qual é a gravidade da crise na indústria?
A queda prevista na produção industrial é de 7% neste ano. No ano passado, caiu 3,3%. De janeiro a agosto, a produção de bens de capital caiu 22%. O uso de capacidade instalada está em 77,9% — o mais baixo desde 2003, quando a série histórica começou. É o maior nível de ociosidade que temos notícia.
A situação é realmente muito difícil. Mas é verdade que o câmbio desvalorizado atenua o problema ao longo do tempo. Para progredir, a indústria precisa de câmbio e juros no lugar certo e produtividade. Nos últimos 20 anos, nunca tivemos esses três componentes juntos.
No primeiro mandato, o governo Dilma reduziu os juros na "marra" e não deu certo. O senhor ainda acha que é esse o problema?
Hoje o câmbio não é problema, apenas sua volatilidade. É preciso algum tipo de garantia que o câmbio vai se manter nesse patamar e isso é perfeitamente possível, mesmo num ambiente de câmbio flutuante.
O Brasil gasta 9% do PIB em juros. A Grécia, que tem uma dívida de 200% do PIB, gasta 5% com juros. Não sou economista nem pretendo fazer análise econômica. Mas o crescimento dos juros já não consegue mais afetar a inflação. Claramente os juros estão no lugar errado no Brasil.
Na sua opinião, quais são as causas da recessão no Brasil?
Os analistas de mercado indicam queda do PIB de 2,5% a 3% neste ano e mais um pouco no ano que vem. Existe hoje um certo desencantamento com o país, que decorre da postura do governo federal de que o ajuste é um fim em si mesmo.
A meta do governo não pode ser a estabilidade do Orçamento. A meta do governo tem que ser, necessariamente, crescimento. E o crescimento não vai ocorrer sem uma volta dos investimentos industriais.
Existem hoje iniciativas do governo para estimular os investimentos?
O governo tem diversas alavancas que gerar crescimento e está usando com muita parcimônia. Os processos de licitação de portos, aeroportos etc. estão prometidos há meses e não saem. Esses projetos são geradores potenciais de investimentos.
Outro exemplo é a exportação, que pode melhorar o ritmo da economia. Mas, daí, temos o exemplo infeliz do Reintegra [programa de devolução de impostos para os exportadores], que era parte central do Plano Nacional de Exportação e foi revertido.
Uma parte do rombo fiscal é resultado das desonerações tributárias favoráveis à indústria, que, mesmo assim, não conseguiu se recuperar. Qual é a responsabilidade da indústria na crise?
Cada setor industrial tem direito de pleitear ajuda, desonerações, subsídios, vantagens. Cabe ao governo agir com cautela, com moderação. Acredito que houve, sim, um certo exagero, por exemplo, na desoneração da folha de pagamento.
No início, a medida beneficiava um conjunto pequeno de setores, mas depois acabou enormemente ampliada e, portanto, inviabilizada. O governo tem dificuldade de, quando faz a coisa certa, fazer de maneira localizada.
O PSI (Programa de Sustentação do Investimento) do BNDES é outro exemplo. Surgiu no meio da crise global em 2009. O governo, corretamente, interveio e incentivou o investimento. Mas o programa durou tempo demais e, de novo, se inviabilizou.
Seu antecessor no Iedi, o empresário Pedro Passos, da Natura, defendeu a abertura da economia brasileira, com redução de tarifas de importação, e encontrou forte resistência na própria indústria. O senhor vai continuar com essa bandeira?
O Brasil é muito fechado, exporta o equivalente a 11,5% do PIB. A média mundial é 29,8% do PIB. Só existem cinco países que exportam menos que o Brasil como percentagem do PIB: Afeganistão, Burundi, Sudão, República Centro Africana e o Kiribati.
Vamos ter que abrir a economia e fazer mais acordos comerciais. O Pedro Passos está certíssimo. Mas é evidente que essa integração do Brasil no mundo tem que se dar ao mesmo tempo que as condições de competitividade da economia brasileira acontecerem.
Também não podemos nos esquecer da âncora do Mercosul. Está mais do que na hora do Brasil rever sua posição. O Mercosul é muito importante, mas não podemos nos limitar a ele. Ou precisamos conseguir a liberdade de cada país fazer seus acordos comerciais ou, no limite, transformar a união aduaneira numa zona de livre comércio. O Mercosul ficou pequeno para o tamanho e os interesses do Brasil.
RAIO-X
Pedro Wongtschowski
IDADE
>> 69 anos
FORMAÇÃO
>> Doutor em engenharia química pela Poli/USP
CARREIRA
>> Diretor-presidente da Oxiteno (1992 a 2006)
>> Presidente-executivo do Grupo Ultra (2007 a 2012)
>> Membro do conselho do Ultra
>> Presidente do Iedi