terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

Governo Dilma criou confusão nas elétricas ao renovar concessões, diz especialista

Pedro Soares - Folha de São Paulo


O governo federal criou "confusão" no setor elétrico ao mexer na renovação das concessões de hidrelétricas, que deixou a Eletrobras "mal das pernas", "depauperou as geradoras" e reduziu sua capacidade de investimento –inclusive em obras conjuntas para mitigar problemas de abastecimento de água.

O diagnóstico foi traçado pelo geógrafo e doutor em economia ambiental Marcos Freitas, professor do Programa de Planejamento Energético da Coppe/UFRJ e coordenador-executivo do Instituto Virtual de Mudanças Globais, também da Coppe.

Abaixo, trechos da entrevista com o ex-superintendente da Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) e ex-diretor da ANA (Agência Nacional de Águas).
*
Folha - Desde 2012, o país convive com pouca chuva e reservatórios mais vazios. O que fazer para melhor planejar a disponibilidade de água?
Marcos Freitas - Temos de trabalhar com medidas de adaptação para momentos de crise. Crises, como em 2001, são oportunidades para identificar os pontos de estrangulamento do sistema e corrigi-los. Desde 2001, entraram muitas [usinas] térmicas, o que melhorou um pouco a questão de a geração não ser tão dependente da hidroeletricidade. Mas o sistema [elétrico] é dinâmico e, da forma como ele é conduzido, pode ficar mais ou menos vulnerável.
Caninde Soares/Folhapress
Marcos Freitas, geógrafo e professor da Coppe/UFRJ
Marcos Freitas, geógrafo e professor da Coppe/UFRJ

Essa vulnerabilidade foi provocada por ação do governo federal?
Tivemos problemas na transmissão, que avançou em velocidade lenta até por questões de licenciamento ambiental. Mas o governo deu uma série de sinalizações de instabilidade ao setor que começou a criar um certo conflito. Um exemplo é a Eletrobras, que está muito mal das pernas. O governo criou confusão quando resolveu mexer na renovação das concessões das hidrelétricas [em 2012]. O valor [das tarifas de geração] deveria baixar. Já eram hidrelétricas construídas, que pagaram parte do investimento e não precisavam da mesma tarifa de usinas novas. Mas essas empresas têm custos fixos. Houve um certo desequilíbrio econômico-financeiro.

A questão financeira afetou investimentos?
Na crise de 2001 [racionamento], as geradoras ajudaram em obras emergenciais, como 'esticar' canos para pegar água em lugares mais distantes à medida que os lagos das usinas estavam mais vazios. Hoje, a situação é mais delicada porque essas empresas não têm caixa.

O que pode ser feito para aumentar a oferta de energia?
A única fonte que entra rápido é a solar, mas ela não é para suportar grandes sistemas. De eólica, entrou alguma coisa, mas precisa avançar na interligação [por meio de linhas de transmissão] com sistema [elétrico nacional]. Por isso, não é ainda energia firme, como a de térmicas e hidrelétricas. Precisamos voltar a discutir hidrelétricas com reservatórios. Não precisam ser tão grandes, mas um pouco maiores que os atuais, para armazenar mais água para gerar energia em períodos secos.

Quais saídas para a crise de suprimento de água?
A primeira coisa é tratar a poluição. A segunda é reduzir perdas no sistema de distribuição, que é de 30% a 40%. Depois, reduzir perdas do consumidor. Muitos condomínios não têm medidores individualizados. Isso é um indutor de ineficiência porque o cliente não sabe seu gasto. Outro problema é o forte aumento da produção agrícola com a irrigação