Eduardo Bresciani e Francisco Leali - O Globo
Construtora Rigidez não tem funcionário algum, mas estava cheia de clientes
Grandes empreiteiras brasileiras contrataram os serviços de uma construtora de fachada controlada pelo esquema do doleiro Alberto Youssef para supostamente fiscalizar, fazer medições e outras ações em contratos com a Petrobras. Documentos apreendidos pela Polícia Federal no escritório da contadora Meire Poza mostram que a Empreiteira Rigidez, de Youssef, foi contratada mesmo sem ter know how para o serviço. Dados do Ministério do Trabalho atestam que a empresa nem sequer possui funcionários.
Deflagrada em março, a Operação Lava-Jato já tinha identificado o trânsito de recursos das empreiteiras e outros fornecedores da Petrobras por contas da MO Consultoria e da GFD Investimentos, também de Youssef. Somente em 30 de julho deste ano, porém, a PF recolheu no escritório da contadora provas de que mais empresas atuavam sob controle do doleiro, como a Rigidez. Consórcios liderados por Queiroz Galvão e Engevix; Coesa, subsidiária da OAS; e Sanko Sider, subcontratada pela Camargo Corrêa para obras da refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, fizeram negócios com a construtora de fachada.
As obras da estatal passaram a ser alvo dos investigadores com a constatação da relação entre Youssef e o ex-diretor de Abastecimento Paulo Roberto Costa, que está preso no Paraná e em processo de delação premiada no qual já citou políticos e grandes empresas como integrantes do esquema de desvios de recursos.
No caso do Consórcio URC, liderado pela Engevix com a Niplan e NM, a vinculação com a Petrobras é direta. A empreiteira ligada a Youssef foi supostamente contratada para dar apoio ao grupo e coordenar a análise de documentações relativas ao contrato feito com a estatal para modernização da refinaria de Presidente Bernardes, em Cubatão (SO). A Rigidez recebeu R$ 4,8 milhões, o equivalente a 1% do contrato feito pela estatal com o consórcio das empreiteiras.
O Consórcio Ipojuca, formado por Queiroz Galvão e Iesa Oléo e Gás, tem um contrato de R$ 2,7 bilhões para obras da refinaria Abreu e Lima. O consórcio é um dos "clientes" da Rigidez. Notas fiscais encontradas no escritório da contadora mostram que o grupo repassou ao menos R$ 1,3 milhão para a Rigidez entre os meses de dezembro de 2010 e novembro de 2011 a título de "prestação de serviços de consultoria".
A PF encontrou, ainda, um termo de distrato entre as duas empresas que menciona o encerramento de um acordo fixando um valor para pagamento de R$ 321 mil em dezembro de 2010. Esse termo diz que o acordo com a Rigidez se referia a um contrato do consórcio Ipojuca com a Petrobras.
A correlação de repasses de recursos para a Rigidez com obras da Petrobras acontece também no caso da Sanko-Sider, construtora subcontratada pelo Consórcio CNCC (Camargo Corrêa e Cnec). A Sanko-Sider contratou a Rigidez em julho de 2011, por R$ 2,3 milhões, para "serviços específicos de consultoria técnica, visando a elaboração de pleito e reestudos e adequação do cronograma de entrega do contrato assinado com Consórcio Camargo Corrêa-CNEC (CNCC)". O consórcio foi formado para realizar obras da refinaria Abreu e Lima e tem um contrato de R$ 3,4 bilhões com a Petrobras, que, com aditivos, já chegou a R$ 3,8 bilhões. Nos documentos apreendidos pela PF, há uma nota fiscal emitida pela Rigidez que indica outro repasse de R$ 935 mil pela Sanko-Sider a título de consultoria.
A Coesa, do grupo OAS Empreendimentos, também repassou recursos para a Rigidez. Pagou R$ 650 mil para receber da construtora que não tem funcionários "consultoria técnica para obras do setor civil", e projetos para viabilizar a implantação de projetos no interior paulista. O Consórcio Viário São Bernardo, composto por Coesa e Concremat, pagou R$ 1 milhão para a mesma Rigidez por serviço de consultoria.
A Sanko Sider afirmou que a lisura de sua atividade será comprovada no processo. "A Sanko-Sider atua com reconhecida responsabilidade e ética há 18 anos nesse mercado e repudia veementemente qualquer afirmação, seja de quem for, que tente associá-la a atos e atividades com as quais não tem nenhuma relação". A Engevix não quis se manifestar. O consórcio Ipojuca e o grupo OAS não responderam aos questionamentos.
EMPRESA FORMADA POR LARANJAS
A Empreiteira Rigidez é uma empresa formada por laranjas. Andrea dos Anjos Bastião, de 40 anos, é uma das sócias. Moradora do bairro do Jaçanã, na zona norte de São Paulo, ela estudou até o segundo grau e teria recebido de Waldomiro de Oliveira a oferta de assinar como sócia da empresa. Recebia mesada em troca e os pagamentos teriam sido feitos até o começo desde ano, antes da Operação Lava Jato.
No endereço, um homem que se apresentou como marido dela afirmou que os pagamentos não passavam de mil reais por mês e que sua mulher só aceitou a proposta porque o barraco onde moravam ameaçava ser soterrado por um deslizamento de terra. Hoje, a casa de três pavimentos, inacabada, é de alvenaria. O endereço apontado como sendo a residência de outra sócia, Soraia Lima da Silva, inexiste.
No endereço da empreiteira, na Rua Dr.Rafael de Barros, o porteiro informa que Waldomiro Oliveira e Denisvaldo de Almeida mudaram-se do local há cerca de três anos. Em fevereiro passado, o oficial de Justiça que tentou citar os representantes da empresa voltou de mãos vazias. O endereço que aparece como residência de Almeida é uma sala num antigo prédio comercial no centro de São Paulo, que permanece fechada.
Waldomiro de Oliveira era um intermediário na contratação de laranjas para emprestar seus nomes a empresas de fachada do doleiro Alberto Youssef. Foi ele, por exemplo, que aproximou do doleiro dos irmãos Leonardo Meirelles e Leandro Meirelles, que se apresentam como donos da Labogen, a empresa do setor farmacêutico usada para fazer remessas ilegais para o exterior. Enquanto a Labogen era usada para enviar dinheiro para ilegalmente para fora, a Empreiteira Rigidez servia também para fazer pagamentos em dinheiro vivo no Brasil. A Rigidez apresenta em sua movimentação financeira diversos saques em espécie.
Empreiteiras citadas
- Mendes Júnior
- Grupo OAS
- Consórcio Ipojuca (Queiroz Galvão/Iesa)
- Consórcio URC (Engevix/Niplan/NM)
- Sanko Sider
Empresas controladas por Youssef
- MO Consultoria
- GFD Investimentos
- RCI Software
- Empreiteira Rigidez
- Marsans
Crimes sob investigação
Lavagem de dinheiro, crimes contra o sistema financeiro, organização criminosa, formação de quadrilha, evasão de divisas e ocultação de provas
Petrobras
Paulo Roberto Costa, ex-diretor da estatal, tinha "negócios" com Alberto Youssef.