O que o governo deixou de registrar como gastos em dezembro, para apresentar
em 2013 resultados menos comprometedores para a qualidade de sua política fiscal
cada vez mais desacreditada, acabou tendo de lançar em janeiro - e a
consequência não poderia ser diferente daquela exposta nos números divulgados
pelo Banco Central e pelo Tesouro Nacional.
Os resultados são frustrantes.
Embora utilizem critérios de aferição diferentes, com abrangência igualmente
diferente, o que obviamente produz resultados não coincidentes, as duas
instituições oficiais deixam claro que o governo ainda tem muito a fazer para
convencer os analistas privados e os contribuintes em geral de que, como
prometeu há pouco, mesmo sendo ano eleitoral, 2014 será marcado por maior
controle de suas despesas.
Para a política fiscal, o ano começou mal. Em janeiro, o superávit primário
do setor público - isto é, a economia necessária para o pagamento dos juros da
dívida pública - foi de R$ 19,9 bilhões. O resultado, que inclui o governo
central, os governos regionais (Estados e municípios) e as empresas estatais dos
três níveis de governo, foi 23,4% menor do que o de janeiro de 2013 (R$ 26,0
bilhões).
Como aumentou seus gastos, o governo central registrou superávit
primário de R$ 12,5 bilhões, 38% menor do que o de janeiro de 2013 (R$ 20,2
bilhões), e foi o grande responsável pela piora do resultado consolidado - que
só não foi pior por causa do aumento de 38,3% do saldo dos governos regionais,
de R$ 7,2 bilhões.
No acumulado de 12 meses, o superávit primário atingiu R$ 81 bilhões, o
equivalente a 1,67% do PIB, resultado pior do que o acumulado até dezembro, de
R$ 91,3 bilhões, ou 1,9% do PIB. Alguns resultados são historicamente ruins. O
superávit de janeiro é o pior desde 2011 e o déficit nominal do setor público é
o maior do mês de janeiro desde 2006.
Já na contabilidade do Tesouro, o que se constata é que, embora sazonalmente
em janeiro as contas do governo central apresentem os melhores resultados do
ano, no primeiro mês de 2014 o superávit primário ficou em R$ 12,95 bilhões,
menos da metade do resultado de janeiro de 2013 (R$ 26,28 bilhões) e abaixo da
expectativa dos analistas do mercado financeiro. É o pior resultado em janeiro
desde 2009, ano em que o governo abriu os cofres para tentar conter o impacto da
crise internacional iniciada com a quebra do banco de investimentos Lehman
Brothers, em setembro do ano anterior.
O secretário do Tesouro, Arno Augustin, negou com veemência que, em dezembro,
o governo tenha postergado despesas, com o objetivo de melhorar os resultados
das contas públicas em 2013, e as transferido para o início de 2014. No entanto,
variações não usuais nas despesas sugerem que, de fato, em dezembro houve uma
compressão de gastos que teve de ser aliviada em janeiro.
As despesas do governo federal no primeiro mês deste ano - incluindo os
gastos com pessoal, com programas sociais, transferências, custeio
administrativo e investimentos - aumentaram 19,5% em relação às de janeiro do
ano passado, enquanto as receitas cresceram apenas 6,6%. Considerados apenas os
gastos com custeio e investimentos, o crescimento foi 32,9%, uma variação tão
grande que não pode ter decorrido simplesmente de mais compras ou de contratação
de pessoal, novas obras ou serviços, e sim de quitação de débitos que estavam
represados.
Muito ruim para os resultados de janeiro, essa prática deverá ter influência
apenas residual nos próximos meses, o que não significa, porém, que a situação
da política fiscal seja tranquila. Há pouco mais de uma semana, ao anunciar os
novos parâmetros para a política fiscal em 2014, o que inclui a redução de R$ 44
bilhões no orçamento deste ano, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse que
o objetivo é alcançar, neste ano, um superávit primário de R$ 99 bilhões,
equivalente a 1,9% do PIB, mesmo porcentual registrado em 2013. Desse valor, o
governo federal deverá obter R$ 80,8 bilhões, ou 1,55% do PIB. Por enquanto,
essas metas não são mais do que declarações de intenções.