sexta-feira, 23 de setembro de 2022

'Eu sou você amanhã', por Gustavo Segré

 

Cristina Kirchner e Lula | Foto: Montagem Revista Oeste/Shutterstock/Divulgação


O risco de um governo socialista no Brasil


Em 1987, uma criativa publicidade de vodca fez famosa a frase “Eu sou você amanhã”. Tão famosa foi a publicidade que dela se originou a expressão “Efeito Orlof” (a marca da vodca da publicidade), para nomear o que poderia acontecer amanhã no futuro com determinado indicador (social, econômico, político).

Uma das características dos governos populistas de esquerda, que propõem modelos econômicos socialistas, é que são previsíveis. Por isso, é possível enxergar o resultado das desastrosas políticas na área social, econômica, educativa e de saúde. Um dos indicadores mais importantes para um país está identificado por três letras: PIB — ou Produto Interno Bruto — representa a soma, em valores monetários, de todos os bens e serviços finais produzidos numa determinada região, durante um determinado período. O socialismo mudou o significado para Pobres, Inflacionados e Burros

Existe uma fábula liberal que explica que o socialismo gosta tanto dos pobres que os multiplica. Mas na realidade a pobreza faz parte da estratégia de chantagem eleitoral, em que o governo socialista gera pobreza para ajudar a quem ele mesmo não permite evoluir economicamente (mantendo sempre viva a esperança do pobre de um futuro melhor).

A inflação é fundamental para a proposta socialista de esquerda, porque ela permite esconder as ineficiências na administração do recurso público. Especificamente porque a inflação é o pior tributo para justamente a parte mais débil da pirâmide econômica e social. É funcional ao socialismo, porque colabora de forma eficaz para a geração de pobres.

Finalmente, o socialismo propõe uma sociedade com a menor cultura possível, precisamente para que no futuro não haja possibilidade de se desenvolver acima do restante dos compatriotas (pobres e sem educação). Dessa forma, todos continuam a depender da ajuda do Estado.

Uma equação macabra

O projeto socialista é absurdamente previsível e perversamente difícil de resolver. A classe média e a alta da pirâmide econômica têm, em geral, tantos filhos quanto podem educar, dar saúde e manter (em geral, dois filhos por família) e começa a ter filhos, em média, a partir dos 24 anos de idade.

A classe baixa da pirâmide começa a ter filhos aos 16 anos e tem, em média, quatro filhos (que mal alimentados não conseguem desenvolvimento cognitivo e ficam reféns da ajuda do Estado). Sendo assim, a cada 48 anos, serão quatro filhos de duas gerações de classe média, contra 12 filhos em três gerações de classe baixa. Todos eles são eleitores.

Esta é a estratégia que o populismo de esquerda está usando para se perpetuar no poder. Gerar pobreza com pessoas mal alimentadas, mal-educadas e com uma economia com alta inflação. Por exemplo:

Havana, 1952 | Foto: Reprodução

Cuba

Antes do socialismo

Na década de 1960, Cuba tinha uma taxa de alfabetização de 76%, e o PBI per capita era de U$S 11.300 (valores atualizados), sendo maior que o de muitos países europeus (Itália, por exemplo). Os cubanos tinham, na época, o maior número de televisores, jornais e telefones que qualquer outro país da América Latina. Foi o segundo país no mundo fazer uma transmissão televisiva.

Cuba foi o primeiro país a ter ferrovias na América Latina e o terceiro no mundo (depois da Inglaterra e dos Estados Unidos). Em 1889, Cuba foi o primeiro país latino-americano a ter iluminação. Em 1900, Havana teve o primeiro bonde (elétrico) da América e foi o primeiro país da região a receber o automóvel. Em 1906, teve o primeiro sistema de telefone direto, sem telefonista. Em 1908, implementou a primeira máquina de raios X da América Latina. Em 1937, foi o primeiro país a decretar a jornada de trabalho de oito horas, o salário mínimo e a autonomia universitária.

Em 1951, o Hotel Riviera, em Havana, foi o primeiro no mundo a ter ar-acondicionado. Em 1958, foi o segundo país a transmitir TV em cores. Cerca de 90% das residências cubanas tinham rádio, em que era possível sintonizar 140 emissoras. Havana era a “Las Vegas” de hoje. El 1955, o canal americano NBC, transmitiu “Tropicana” — o principal Cabaré de Cuba —, apresentações de Carmem Miranda, Frank Sinatra e Nat King Cole (entre outros famosos).

Rua Obispo, Havana, março de 1952 | Foto: Reprodução

Em 1959, havia 600 salas de cinema em Havana (mais do que em Nova Iorque e Paris). Em 1958, Cuba tinha a maior quantidade de carros da América Latina: um carro para cada 38 habitantes. A ilha tinha também a maior taxa de telefones por cada cem habitantes (2,6) da América Latina. Havia 70 jornais de diversas ideologias circulando pela ilha. O salário industrial de Cuba era o oitavo maior do mundo (U$S 6 por hora), ficando acima do da Noruega e do da Dinamarca. A remuneração nas fazendas era a sétima maior do mundo: U$S 3 por hora. A produtividade na indústria da cana-de-açúcar era de 55 toneladas por hectare (o dobro da que tinha o Brasil na mesma época).

Havana, atualmente | Foto: Shutterstock

Hoje

Cerca de 70% das famílias cubanas vivem com menos de U$S 3,8 por dia (R$ 21). A inflação projetada para 2022 é de 32% ao ano. O salário mínimo mensal é de U$S 87 e máximo de U$S 386. Existem 38 carros para cada mil habitantes — os mesmos índices de Angola ou Tajiquistão. Mais de 50 anos após o início do regime socialista, a taxa de telefones para cada cem habitantes chegava a três (quase os mesmos parâmetros que 50 anos atras). A imprensa é controlada, e não é possível sair da ilha sem autorização do governo. O cubano comum consegue pagar com um salário mínimo quatro horas de internet numa lan house.

Aproximadamente 80% dos alimentos consumidos são importados, porque a indústria está sucateada, e a ilha sobrevive com exportação de cana-de-açúcar e turismo. Os cortes de energia são constantes, em função da falta de investimentos nos últimos muitos anos. Enquanto a maioria da população é pobre, os dirigentes do regime são milionários. A produtividade da indústria da cana-de-açúcar é de 30 toneladas por hectare. A renda per capita de Cuba só fica acima da que existe hoje no Haiti.

Campo de petróleo em Lagunillas, Venezuela | Foto: Shutterstock

Venezuela  

Antes do socialismo

Era chamada Venezuela Saudita, por ter a maior reserva de petróleo do mundo. Os venezuelanos eram considerados os maiores consumidores de uísque do mundo. Entre 1959 e 1983, o desemprego no país era um dos mais baixos da região. No mesmo período, o crescimento médio do país foi superior ao 4% ao ano, e a inflação era menor do que a registrada nos países vizinhos. A estabilidade da moeda local, o bolívar, permitia que muitos venezuelanos conseguissem sair do país para temporadas de férias, principalmente com destino a Miami, nos Estados Unidos, vista como um paraíso do consumo. Nos anos 1970, a população tinha o maior poder de compra entre os países da América Latina — quase três vezes maior que o dos brasileiros —, segundo um índice da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

Devido à crise econômica e à hiperinflação, na Venezuela há uma grande escassez de alimentos e remédios | Foto: Shutterstock

Hoje

A população abaixo da linha da pobreza é de 94,5%. A inflação em 2020 foi de quase 3.000% e a de 2021, de pouco menos de 700%. A inflação projetada para 2022 é de 114% ao ano. O salário mínimo é de U$S 39 (incluindo U$S 10 de ajuda-alimentação). Há desabastecimento nos supermercados, e as principais empresas multinacionais do mundo abandonaram o território, pela insegurança jurídica e social. Muitos dos ativos das referidas companhias foram estatizados pelo regime de Hugo Chávez.

No ano passado, os venezuelanos perderam em média 10 quilos do seu peso em função da fome — há testemunhos de cidadãos que comeram animais dos zoológicos e cachorros das ruas. O regime de Nicolás Maduro é considerado uma ditadura, salvo por países como Argentina, Nicarágua, Irã, Cuba e Rússia.

Venezuela é a Cuba de amanhã.

Argentina

Antes do peronismo

No fim do século 19, a Argentina era o país mais rico do planeta. Em 1895, tinha o maior PIB do mundo, acima do de Estados Unidos e Bélgica. Reza a lenda que, entre o fim do século 19 e começo do século 20, a expressão “tão rico quanto um argentino” era comum e frequentemente utilizada por aristocratas britânicos que tentavam casar suas filhas com argentinos ricos.

Durante as três primeiras décadas do século 20, a Argentina ultrapassou o Canadá em renda total e per capita

Entre 1860 e 1930, o país enriqueceu acentuadamente, em decorrência, entre outras coisas, da exploração das férteis terras dos pampas. Os investimentos estrangeiros eram livres e diversificados, oriundos da França, da Alemanha, da Bélgica e, majoritariamente, da Grã-Bretanha. Indústrias e ferrovias foram construídas com capital estrangeiro. Os altos salários atraíram vários imigrantes, principalmente italianos, espanhóis, alemães e franceses. Em 1899, o país retornou ao padrão ouro e, durante 14 anos, cresceu a uma taxa anual de 7,7%.

Durante as três primeiras décadas do século 20, a Argentina ultrapassou o Canadá e a Austrália não somente em termos de população, mas também em renda total e per capita. Nesta época, a famosa loja de departamentos Harrods, de Londres, abriu uma filial em Buenos Aires — a única em todo o mundo.

A Argentina inaugurou o primeiro metrô de América Latina, em 1913 (55 anos antes que o de São Paulo). Um argentino era, em média, 29% mais rico que um francês, 14% mais rico que um alemão, três vezes mais rico que um japonês e cinco vezes mais rico que um brasileiro. Em 1946, a Argentina tinha o oitavo PIB per capita do mundo e o maior da América Latina. Era duas vezes mais alto que o do México. O mesmo acontecia quando comparado com países europeus, como Espanha e Portugal. A inflação era de 1,5% ao ano.

Juan Péron, ex-presidente argentino | Foto: Wikimedia Commons

Hoje

Depois de muitos anos de peronismo, ditaduras e, sobretudo, dos últimos anos do kirchnerismo, o país entrou em queda dramática. A pobreza chegou a 50% da população. Quase 70% das crianças menores de 13 anos são pobres e têm comprometido o desenvolvimento cognitivo. A projeção de inflação para 2022 supera 100%.

Simon Kuznets, prêmio Nobel em Economia, afirmou que existem quatro tipos de países no mundo — os desenvolvidos, os subdesenvolvidos, o Japão e a Argentina. Após a crise de 2001, em que Argentina teve cinco presidentes em apenas uma semana e decretou a moratória da dívida (novamente), a situação econômica se agravou e o equilíbrio entre os que produzem e os que se aproveitam dos que produzem ficou cada vez pior.

Em 2001, o país tinha 2,5 milhões de pessoas trabalhando para o Estado (nos Três Poderes e nas três esferas). Dois milhões de pessoas recebiam ajuda social, e o país tinha 6 milhões de trabalhadores com registro em carteira. Pouco mais de 20 anos depois, os números só pioraram: 4,5 milhões de pessoas trabalham para o Estado, 22 milhões recebem alguma ajuda social e apenas 5,8 milhões trabalham com registro em carteira.

A conta não fecha: o salário mínimo é de U$S 191 (AR$ 51.200, em setembro de 2022) e, para uma família não estar abaixo da linha de pobreza, ela precisa de pelo menos AR$ 100.000 (equivalente a U$S 374). Em outras palavras, é necessário ter dois salários mínimos (pelo menos) por família para não ser pobre.

Em função da ajuda social absurda e impossível de financiar — dependendo do programa, pode beneficiar uma família com mais de um salário mínimo —, o governo populista criou duas gerações de pessoas que não têm motivação nenhuma para a atividade econômica, já que ganham mais sem fazer nada.

Desvalorização do peso argentino | Foto: Shutterstock

Argentina é a Venezuela de amanhã!

Como política econômica comum, os governos de Cuba, da Venezuela e da Argentina defendem a ideia de que não é importante a busca do superavit fiscal, que o Estado tem de tirar de quem tem para dar a quem não tem, controle de câmbio, regulamentações e burocracias absurdas que a única coisa que geram são altíssimos índices de inflação, redução do investimento e perda do emprego privado.

Em função do controle de câmbios, existem nos três países um mercado oficial de câmbios (com valores impeditivos para a população comprar dólares, mas que os exportadores devem considerar para suas exportações) e um mercado paralelo, em que a economia deve rodar com todos os problemas que isso significa em termos de custos e baixas rentabilidades. Os três países têm controle de preços, desabastecimento e empresas estatais com perdas milionárias.

É digno de estudos sociológicos explicar por que aqueles que historicamente têm pobreza, falta de educação e péssimo atendimento de saúde por pura responsabilidade de governos populistas de esquerda continuam votando neles. Vemos isto na Venezuela, na Nicarágua, em vários Estados provinciais da Argentina e no Nordeste do Brasil.

Nas próximas eleições presidenciais brasileiras, uma má escolha política pode fazer com que o Brasil seja… Argentina, Venezuela e Cuba… amanhã.

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Revista Oeste