quinta-feira, 19 de julho de 2018

Incertezas em ano eleitoral fazem mais empresas correrem contra alta do dólar


Demanda de proteção ao dólar cresce com cenário eleitoral e guerra comercial - Pixabay


Roberta Scrivano e João Sorima Neto, O Globo 


A incerteza em relação à eleição presidencial, além do cenário externo turbulento com China e Estados Unidos travando uma guerra comercial, tem levado empresas brasileiras a buscarem proteção contra as oscilações bruscas do dólar, o chamado hedge cambial. De janeiro até agora, a moeda americana subiu de R$ 3,26 para R$ 3,84, um salto de 17,8%. 

No mesmo período, a procura pelos chamados contratos de swap cambial, um instrumento do mercado futuro que protege as companhias que têm dívidas em dólar, quase triplicou. O saldo desses contratos passou de US$ 23,8 bilhões, em dezembro passado, para US$ 67,4 bilhões, atualmente. O cenário cambial é tão incerto que até bancos e consultorias estão produzindo estimativas muito díspares para a divisa americana até o fim deste ano, que variam de R$ 3,40 a R$ 5,50.

- Aumentou a procura por proteção porque o mercado está desorientado. Os indicadores econômicos se deterioraram, com ajuda da greve dos caminhoneiros, e a disputa comercial entre EUA e China, além da alta dos juros americanos, trouxeram mais imprevisibilidade no cenário externo — avaliou Cleber Alessie, especialista em câmbio da corretora H. Commcor.

Os contratos de swap são vendidos ao mercado pelo Banco Central e oferecidos pelos bancos às empresas. Na prática, eles evitam que as companhias paguem mais por suas dívidas em moeda americana se o dólar subir muito. No Itaú BBA, por exemplo, a demanda por esse tipo de hedge aumentou 60% de janeiro a julho na comparação anual. Uma boa parte dos clientes, cerca de 300, não faziam esse tipo de operação desde 2015.

Bancos trabalham com dois cenários eleitorais

Os dados do Banco Central (BC), até o primeiro trimestre, mostram que a dívida em dólar das empresas e dos bancos brasileiros era de US$ 471,2 bilhões. A estratégia de proteção varia de acordo com a atividade das companhias. Empresas de energia, por exemplo, que têm a receita em real, mas dívida em dólar, costumam usar esse tipo de proteção. A Neoenergia, dona de várias distribuidoras de eletricidade como Elektro, Celpe e Cosern, usa os swaps cambiais para converter seus compromissos em moeda estrangeira para real. Segundo a empresa, a estratégia usada é a de full hedge, ou seja proteção total para sua dívida em dólar.

Já a Petrobras tem proteção natural contra a flutuação cambial pois a cotação do petróleo é em dólar. Da dívida total da companhia, 70% são na moeda americana. A empresa realizou pela primeira vez, entre fevereiro e março, uma estratégia de proteção para parte de sua produção de petróleo prevista para este ano, equivalente a 128 milhões de barris.

A dificuldade de traçar cenários para as cotações da divisa americana é tanta que alguns bancos estão trabalhando com dois cenários eleitorais. Em um, seria eleito um presidente que dê continuidade às reformas da Previdência, fiscal e política, e, nesse caso, o dólar ficaria num patamar até mais baixo que o atual. No segundo cenário, a vitória seria de um candidato menos alinhado às ideias do mercado financeiro, o que faria a moeda americana subir para até R$ 5,50 no fim deste ano e início de 2019.

A questão eleitoral é, na visão dos economistas do banco chinês Haitong, o principal fator de pressão sobre o dólar neste momento. Para o banco, a eleição de um candidato reformista conduziria a cotação para baixo, a R$ 3,40.

- O nome não importa, desde que o mercado tenha a percepção de que as reformas vão ser retomadas - explicou Flávio Serrano, economista sênior do Haitong, que eleva para R$ 4 a previsão caso ocorra a vitória de um presidente de perfil não alinhado ao mercado financeiro. - A guerra comercial cria ruído, mas, hoje, é a incerteza eleitoral que está impulsionando a moeda.

O Bank of America Merrill Lynch também tem dois cenários para o dólar no início de 2019. No primeiro, a divisa americana subiria até R$ 5,50, com a vitória de um candidato contrário ao mercado e com problemas de governabilidade, causando a deterioração das condições econômicas. No cenário mais otimista, a vitória seria de um candidato reformista, com foco na reestruturação da Previdência, e o dólar cairia a R$ 3,65.

Segundo Lucas Vilela, economista do Credit Suisse, a magnitude da depreciação do real neste ano é uma das mais altas já observada em anos eleitorais, perdendo apenas para 2002, e os modelos estatísticos rodados pelo banco mostram que metade deste movimento se deve a fatores internos.

- A provável continuação de um cenário eleitoral incerto sugere que o real permanecerá sob pressão - afirmou Vilela.

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