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O juiz federal Sergio Moro, responsável pela condução dos processos na Operação Lava Jato |
MARIO CESAR CARVALHO - Folha de São Paulo
Na manifestação mais contundente sobre os riscos que a Operação Lava Jato corre, o juiz federal Sergio Moro disse em debate nesta quinta-feira (24) em São Paulo que processos abertos após as investigações podem prescrever se o sistema da Justiça criminal não mudar.
"Há um risco, sim, de que esses processos caiam no esquecimento", afirmou o juiz num almoço e debate organizado pelo Lide - Grupo de Líderes Empresariais, entidade dirigida por João Doria, pré-candidato do PSDB à Prefeitura de São Paulo.
A declaração foi feita um dia depois de o Supremo ter decidido fatiar algumas investigações que começaram com a Lava Jato. O juiz, no entanto, se recusou a comentar a decisão do Supremo.
Moro falou dos riscos quando fazia paralelos entre a Lava Jato e a Operação Mãos Limpas, investigação que ocorreu na Itália entre 1992 e 1994, sobretudo, e revelou um cenário de corrupção que envolvia o pagamento de propina para fechar contratos com o governo e a distribuição do suborno para dois partidos (o Socialista e a Democracia Cristã). A Mãos Limpas investigou 4.520 suspeitos, dos quais cerca de 800 foram presos.
Parece ótimo, mas "muitos dos ganhos da Operação Mãos Limpas foram perdidos com o tempo", como afirmou Moro, por causa da lentidão do sistema judicial italiano, uma das matrizes da Justiça brasileira.
Segundo o juiz, 40% dos investigados pela operação italiana foram anistiados ou escaparam de punição porque seus crimes prescreveram.
Moro defende mudanças na Justiça junto com os procuradores da Lava Jato, como a redução das chances de um crime prescrever e a aplicação de pena de prisão a partir de decisões da segunda instância na Justiça (hoje são necessárias mais duas instâncias).
O juiz afirmou que os empresários, que compunham a plateia, têm uma função essencial no combate à corrupção. "A iniciativa privada tem um papel importante em dizer não ao pagamento de propina".
Citando processos da Lava Jato que já julgou, Moro disse que os empresários já condenados endossavam a prática de pagamento de suborno. "Não houve nenhuma extorsão, o que é assustador", disse, mencionando a Camargo Corrêa e a OAS como exemplos de empresas que pagavam suborno.
Moro citou o caso de um empresário de Palermo, na Sicília, que ele considera um verdadeiro herói: Libero Grassi (1924-1991), dona de uma fábrica de roupas que se recusou a pagar propina para a máfia e conclamou os empresários a segui-lo. Grassi foi assassinado pela máfia, mas sua recusa em pagar suborno acabou gerando um movimento que provocou mudanças na Itália, na visão do juiz.
"A corrupção não é um problema só do poder público", afirmou o juiz. "O agente público corrupto não age sozinho: há sempre alguém disposto a fazer pagamento de propina".
O almoço do Lide com Moro bateu recorde de público: compareceram 586 empresários e executivos.