Enquanto grande parte da população está aflita com o temor provocado pelo coronavírus, os privilégios no Judiciário continuam consumindo dinheiro que poderia estar, literalmente, salvando vidas.
Levantamento inédito feito pelo MS em Brasília nos 27 tribunais de Justiça revela que, em abril, em plena pandemia do coronavírus, 97,5% dos 1.383 desembargadores receberam entre R$ 40 mil e R$ 106 mil (brutos, sem descontos da Previdência e do Imposto de Renda), valores acima do teto constitucional, de R$ 39.293,32.
Os tribunais de Minas Gerais e de Santa Catarina, com 138 e 92 desembargadores, respectivamente, foram os únicos que ainda não divulgaram a remuneração detalhada, referente a abril, conforme determina a legislação. Com esses dois Estados, o número de desembargadores alcança 1.613.
Segundo a reportagem, houve muitas dificuldades para fazer a apuração porque a maioria dos sites dos tribunais é inacessível ao cidadão comum. É preciso tempo, paciência e habilidade para extrair informações sobre o salário dos magistrados.
Os melhores sites, pela ordem, são os dos TJs de São Paulo, Piauí e Rondônia; os piores do Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Amapá, Espírito Santo e Mato Grosso do Sul.
Salário: R$ 106 mil
Em abril, 15 Estados pagaram remuneração acima do teto a todos os desembargadores. São eles: Acre, Alagoas, Amazonas, Amapá, Bahia, Ceará, Distrito Federal, Espírito Santo, Goiás, Mato Grosso do Sul, Paraná, Pernambuco, Piauí, Rondônia e Sergipe.
Rio Grande do Sul, Pará e Goiás foram os tribunais que apresentaram menos distorções, embora a maioria dos desembargadores tenha recebido rendimentos superiores a R$ 39.293,32.
Ao analisar a folha de pagamento de centenas de desembargadores, é possível identificar que a maioria vem ganhando, em plena pandemia, R$ 60 mil, R$ 70 mil, R$ 80 mil, R$ 90 mil e até R$ 106 mil, o que foi o caso de Oudivanil de Marins, do TJ de Rondônia (foto abaixo). Metade dos seus 21 colegas recebeu acima de R$ 70 mil em abril, cinco deles na faixa de R$ 90 mil.
Todos os desembargadores recebem esse “incentivo” mês sim, mês não. E o melhor: sem desconto do Imposto de Renda, revelando o caráter acintoso e ilegal desse “jeitinho” dos tribunais de distribuir recursos provenientes dos surrados cofres dos Estados.
Pobre, mas bondoso
O levantamento mostra ainda que os Tribunais de Justiça dos Estados mais pobres e com os menores Índice de Desenvolvimento Humano são responsáveis pelos contracheques mais gordos entre os desembargadores de todo o país.
É o caso do TJ do Piauí, um dos menores Produto Interno Bruto por habitante do Brasil. Em abril, o salário dos 20 desembargadores girou em torno de R$ 66 mil a R$ 79 mil.
Os dos tribunais baiano e alagoano também não têm do que reclamar. A maioria dos 60 e 15 membros do judiciário estadual, respectivamente, teve em abril remuneração acima de R$ 50 mil, graças às “vantagens eventuais”.
O Tribunal de Justiça do Amazonas, outro Estado com alto índice de pobreza, depositou bolada na conta de cada um dos 26 desembargadores, cujos valores variaram de R$ 65 mil a R$ 80 mil.
Maranhão, outro entre as federações mais pobres, retribui bem pelo trabalho dos seus desembargadores. A remuneração dos 30 magistrados do Tribunal de Justiça em abril atingiu a R$ 85 mil.
Tribunais superiores
O Supremo Tribunal Federal, cuja remuneração dos seus membros serve de parâmetro para definir o salário do funcionalismo público, teve oito dos seus 11 ministros recebendo acima de R$ 39.293,32 em abril.
Mantiveram remuneração até o limite os ministros Alexandre de Moraes Edson Fachin e Dias Toffoli. Os demais receberam, em média, R$ 45 mil, valor relativamente “baixo” na comparação com os ganhos de desembargadores.
No Superior Tribunal de Justiça, o teto constitucional só foi respeitado por quatro dos 34 ministros. O salário médio girou em torno de R$ 44 mil, também inferior às remunerações dos magistrados dos tribunais estaduais. (MS em Brasília)
Com informações de Cláudio Humberto, Diário do Poder